21 Outubro 2021
“Nossa pesquisa revelou que, como grupo, os bispos católicos dos EUA foram silenciosos, negacionistas e tendenciosos sobre a mudança climática em suas publicações diocesanas oficiais em torno da Laudato Si'. Concluímos que são assim especialmente os que se correlacionam com a identidade política conservadora”, escrevem Daniel DiLeo, Sabrina Danielsen e Emily E. Burke, em artigo publicado por EarthBeat, caderno de ecologia do National Catholic Reporter, 19-10-2021. A tradução é de Wagner Fernandes de Azevedo.
Daniel R. DiLeo é professor associado e diretor dos Programas de Justiça e Paz na Creighton University.
Sabrina Danielsen é professora assistente de sociologia na Creighton University.
Emily E. Burke é doutoranda do Programa de Sociologia e Comunidade na Universidade de Wisconsin-Madison.
Neste final de semana o Papa Francisco publicou uma série de tuítes que ligam as crises social e ambiental. Essa conexão incorpora a “ecologia integral” que é um refrão da sua encíclica Laudato Si': sobre o cuidado da Casa Comum, de 2015.
A publicação da Laudato Si' foi um marco na luta contra a mudança climática. Ambientalistas seculares foram encorajados aos verem um proeminente líder global religioso usar uma das suas mais poderosas ferramentas para a causa. Muitos católicos estadunidenses esperavam que a encíclica inspirasse seus bispos para fazer da mudança climática um assunto prioritário.
Logo que o documento foi publicado, no entanto, os bispos dos EUA mostraram sinais de que amplamente ignorariam a exortação do papa nos seus ensinos e ação.
Em 2019, nós começamos a pesquisar nos documentos e textos dos bispos estadunidenses direcionados a seus fiéis para ver o que disseram sobre a mudança climática e a Laudato Si' nos cinco anos anteriores. Nós perguntamos: Os bispos estadunidenses fielmente comunicaram os ensinamentos da Igreja sobre a mudança climática antes e depois da Laudato Si'?
Nossa pesquisa mostra claramente que as comunicações dos bispos estadunidenses coletivamente diminuíram o impacto da encíclica sobre a mudança climática.
Nosso estudo focado sobre os bispos ordenados: aqueles que lideram um segmento geográfico da Igreja Católica conhecido como diocese. Nós compilamos 12.077 artigos de colunas publicadas pelos bispos em publicações oficiais de 171 das 178 dioceses católicas nos EUA desde junho de 2014 – um ano antes da Laudato Si' – até junho de 2019.
Conferência com o economista francês Gaël Giraud (Georgetown University, EUA), no ciclo "Renda Básica Universal: para além da justiça universal", promovido pelo IHU.
Os artigos dos bispos não são somente uma matéria de ponto de vista pessoal. Os bispos têm o dever de compartilhar a totalidade da fé, incluindo o ensino da Igreja sobre a mudança climática, com a suas dioceses. Eles também supervisionam construções e terrenos, currículo escolar, investimentos e advocacy que poderiam ser usados para ajudar a mitigar a crise climática.
Em geral, os bispos católicos estadunidenses têm sido absurdamente silenciosos sobre a mudança climática.
Das 12.077 colunas que nós estudamos, apenas 93 (ou 0,8%) mencionam mudança climática, aquecimento global ou seus equivalentes. Essas 93 colunas se dividem em 53 autores, de 201 bispos que tínhamos no arquivo. Os outros 148 (74%) nunca mencionou a mudança climática em seus artigos.
Em segundo lugar, quando os bispos mencionaram as mudanças climáticas, eles se distanciaram do ensino da Igreja sobre o assunto: 44 das 93 colunas (47%) que mencionam as mudanças climáticas não se referem ao ensino da Igreja sobre o assunto.
Das 49 colunas que o fazem, muitas falham em comunicar substancialmente o conteúdo do ensino da Igreja sobre a catástrofe climática. Em seis artigos, os bispos minimizaram a autoridade do Papa para ensinar sobre a mudança climática. Em nove, o bispo minimizou o foco na mudança climática dentro dos ensinamentos ecológicos mais amplos da Igreja.
Além disso, 29 colunas não transmitem claramente a opinião pessoal do bispo sobre o ensino. Uma vez que o silêncio pode ser uma forma de negação da mudança climática, os leitores podem interpretar o silêncio de seu bispo como discordância – e licença para discordar.
Quando os bispos mencionaram as mudanças climáticas, eles minimizaram as partes da Laudato Si' que conflituam com uma identidade ou ideologia política conservadora.
Como os conservadores dos EUA têm um histórico de negar, ignorar e semear dúvidas sobre a mudança climática, é razoável supor que muitos bispos – que são reconhecidos como se tornando cada vez mais alinhados politicamente com o Partido Republicano – podem ter experimentado tensão entre sua ideologia política e seu dever para comunicar o ensino da Igreja sobre mudança climática.
Afinal, os bispos se enquadram em outros dados demográficos, além de serem líderes religiosos: eles são, em geral, católicos brancos mais velhos. Em 2016, 47% dos bispos dos EUA que responderam a uma pesquisa disseram que o conservador Fox News Channel era sua principal fonte de notícias na televisão.
De acordo com um recente estudo acadêmico, os conservadores católicos dos EUA “desvalorizaram a credibilidade do Papa na mudança climática” depois da Laudato Si' e pareciam mais orientados sobre o assunto pela ideologia política do que pelos ensinamentos do Papa. Essa ideologia política sustenta que as mudanças climáticas não estão realmente acontecendo, que não são causadas por humanos ou não são urgentes.
Por outro lado, na Laudato Si', Francisco reiterou 25 anos de ensino papal de João Paulo II e de Bento XVI de que a mudança climática causada pelo homem é real e urgente. No entanto, apenas 56 das 12.077 colunas dos bispos (0,46%) descrevem as mudanças climáticas como reais ou acontecendo. Apenas 14 colunas (0,12%) afirmam o consenso científico sobre as mudanças climáticas. Apenas 29 colunas (0,24%) descrevem a mudança climática como urgente.
Na Laudato Si', Francisco citou com aprovação a análise acadêmica de que o capitalismo desregulamentado e baseado no crescimento é a causa predominante das mudanças climáticas. Os bispos estadunidenses, no entanto, ficaram quase silenciosos sobre as causas econômicas da mudança climática. Cinquenta e quatro das 56 colunas (96%) que discutem as mudanças climáticas como reais ou acontecendo não descrevem suas raízes econômicas – um fenômeno conhecido como “negação ideológica”.
Os bispos que fizeram menção às mudanças climáticas também se desviaram de Francisco sobre o que fazer a respeito. A Igreja ensina que as ações internas e externas são complementares e que a justiça social é essencial para o amor cristão. Na Laudato Si', Francisco pede ação interna (por exemplo, oração e educação) e ação externa, incluindo justiça social.
No entanto, os bispos dos EUA que discutiram as mudanças climáticas enfatizaram a ação interna sobre a externa e ignoraram amplamente as políticas públicas. Das 93 colunas que se referem às mudanças climáticas, 73 (78%) mencionam ações internas. Apenas 36 colunas (39%) mencionam alguma ação ambiental externa. Apenas nove colunas (9,7%) nomeiam uma política de mudança climática específica, como o Acordo de Paris.
O relativo silêncio dos bispos sobre a política ambiental é especialmente notável, uma vez que eles não se calaram em suas colunas sobre a política em torno de outras questões sociais, como o aborto, que raramente aparecem na Laudato Si'. Embora Francisco tenha mencionado a mudança climática 24 vezes e o aborto apenas uma vez, os bispos mencionaram ambos os problemas com igual frequência ao discutir a encíclica.
Nossas descobertas não mostram definitivamente que o conservadorismo dos bispos católicos dos EUA foi a principal causa de seu silêncio sobre a mudança climática ou ensinamentos distorcidos em torno da Laudato Si'. Além disso, os bispos individualmente podem ter abordado a mudança climática em suas dioceses de outras maneiras que não escrevendo colunas.
No entanto, nossa pesquisa revelou que, como grupo, os bispos católicos dos EUA foram silenciosos, negacionistas e tendenciosos sobre a mudança climática em suas publicações diocesanas oficiais em torno da Laudato Si'. Concluímos que são assim especialmente os que se correlacionam com a identidade política conservadora.
Nossas descobertas levantam questões sobre se os bispos católicos dos EUA vão adotar a nova Plataforma de Ação Laudato Si' do Vaticano. Nossas descobertas também sugerem que os bispos dos EUA estão desperdiçando oportunidades de se conectar com jovens que, como grupo demográfico, priorizam as mudanças climáticas e estão cada vez menos ligados à religião, incluindo o catolicismo.
O silêncio dos bispos sobre a política climática levanta sérias questões sobre quantos bispos dos EUA apoiarão a defesa do Vaticano por um acordo climático internacional na Conferência da ONU sobre Mudança Climática de 2021, que começa em 31 de outubro.
A Igreja Católica dos EUA tem uma capacidade sem precedentes de ajudar a evitar a catástrofe climática. Ela também tem a responsabilidade de declarar a emergência climática como uma parte essencial de sua missão. Para realizar esse potencial e essa fidelidade, no entanto, os bispos estadunidenses individualmente devem preencher seus deveres para ensinar a integralidade da fé que inclui o ensino da Igreja sobre a mudança climática.
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EUA. Maioria dos bispos católicos se silencia sobre a mobilização do Papa Francisco contra a catástrofe climática - Instituto Humanitas Unisinos - IHU