18 Abril 2020
As medidas de distanciamento social impostas à maioria da população mundial durante a pandemia do coronavírus não apenas impediram os católicos de irem pessoalmente celebrar a missa, mas também de recorrer amplamente à prática da confissão.
A reportagem é de Joshua J. McElwee, publicada em National Catholic Reporter, 17-04-2020. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Essa nova realidade, especialmente grave para aqueles que sofrem com o vírus ou estão chegando ao fim das suas vidas, reavivou o debate em torno de uma pergunta básica: por que não podemos fazer isso pelo telefone?
Vários teólogos consultados sobre esse assunto pelo NCR apontaram preocupações sobre a possível vigilância dos dispositivos eletrônicos, o que poderia resultar em uma violação do sigilo do confessionário virtual. Mas eles também enfatizaram que a Igreja não quer que as pessoas duvidem da disponibilidade da misericórdia de Deus e ainda precisa considerar plenamente a questão da vigilância.
O Mons. Liam Bergin, um teólogo irlandês do Boston College, observou que alguns governos europeus têm realizado reuniões de gabinete via webcam.
“Se é seguro ter uma discussão de gabinete pelo Zoom, ou em alguma outra plataforma... muitas dessas preocupações podem não ser mais necessárias”, disse ele.
“Eu acho que é realmente importante ampliar a tela”, disse Bergin, que também é ex-reitor do Pontifício Colégio Irlandês. “Também é importante lembrar que o poder salvífico de Deus é comunicado a nós de várias maneiras.”
George Worgul Jr., teólogo da Duquesne University, em Pittsburgh, disse que achava que a proibição das confissões a distância pode ser uma simples questão de a Igreja ainda não ter atualizado os seus cânones para refletir os desenvolvimentos modernos.
“Existem regras criadas antes da tecnologia, e a Igreja simplesmente não está tão sintonizada com a mudança desses regulamentos devido ao uso das tecnologias emergentes”, disse ele.
“Eu realmente não acho que seja uma questão teológica, porque isso desvia o foco”, disse Worgul, que concentrou seu trabalho em estudos rituais e teologia sacramental. “Não é a confissão dos pecados que é a questão crucial. A questão crucial é a misericórdia de Deus e o perdão de Deus.”
A irmã feliciana franciscana Judith Kubicki, teóloga da Fordham University, concorda. Ela observou que a Igreja nunca antes havia se confrontado com uma pandemia global na era digital.
“Acho que ninguém já abordou seriamente a questão o suficiente para dar uma resposta oficial” sobre a confissão por telefone, disse Kubicki, ex-presidente da Academia Norte-Americana de Liturgia. “Não vimos isso. Não tivemos essa experiência.”
A questão da possibilidade de confissão por telefone tornou-se particularmente aguda nos hospitais, onde os pacientes com coronavírus são mantidos em isolamento para impedir a transmissão do vírus e, às vezes, não podem receber visitas, inclusive de padres.
A Conferência dos Bispos dos EUA aconselhou os prelados estadunidenses a não permitir a confissão por telefone em um memorando do dia 27 de março, citando preocupações sobre a proteção do sigilo do confessionário.
O Vaticano havia abordado anteriormente a dificuldade de realizar confissões durante este período em um decreto do dia 20 de março, deixando claro que é aceitável que os bispos ofereçam a absolvição geral a grupos de pessoas conforme necessário.
O decreto, emitido pela Penitenciaria Apostólica, deu o exemplo de um bispo ou padre que pode ficar na entrada de um hospital e usar o sistema de som local para oferecer a absolvição às pessoas que estão no prédio.
Bergin, Worgul e Kubicki enfatizaram a natureza abundante da misericórdia de Deus e os ensinamentos da Igreja de que uma pessoa que é incapaz de se confessar ainda pode conversar com Deus diretamente e pedir perdão. O Papa Francisco mencionou essa possibilidade em sua homilia da missa transmitida ao vivo na Domus Santa Marta, no dia 20 de março.
Bergin disse que, neste tempo, os padres “deveriam tranquilizar as pessoas sobre a graça e a misericórdia de Deus, em vez de brincar com os seus medos”.
“Este é um momento precário, e não devemos duvidar da misericórdia de Deus e da graça de Deus que se estende a nós”, disse ele.
O padre irlandês chegou a dizer que havia falado com um bispo, que lhe disse: “Se alguém estivesse em circunstâncias extremas e me telefonasse para confessar seus pecados e receber a absolvição, eu o faria”.
Ao deixar claro que ele não é bispo nem padre, Worgul disse que daria o seguinte conselho a uma pessoa em uma emergência que procura se confessar por telefone: “Se alguém realmente quer confessar seus pecados e experimentar a misericórdia de Deus, e o melhor caminho para fazer isso é uma ligação telefônica ou uma videoconferência, que o faça”.
“Depois que a crise acabar, se você sentir que tem a obrigação de ir à confissão, então o faça”, sugeriu o teólogo.
“Ir pelo outro caminho, falar sobre se essa conversa telefônica é válida ou se os pecados realmente são perdoados, é realmente perder o foco na misericórdia e no amor de Deus”, disse ele.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Confissão pelo Zoom? Pandemia reaviva debate sobre reconciliação a distância - Instituto Humanitas Unisinos - IHU