A mentira e a desinformação continuam a dar o tom no Brasil “pós-corrupção”. O problema é que agora as posturas irresponsáveis e criminosas avançam do estágio de decidir eleições para o de matar as pessoas. É isso que pode ser resumido da postura do governo federal frente à pandemia do Coronavírus, segundo Ligia Bahia, médica e autora do livro "Saúde, desenvolvimento e inovação".
“Considero que é uma irresponsabilidade completa. Ou as autoridades governamentais não entendem a magnitude da tragédia ou realmente consideram que as vidas humanas não importam. Estão levando o país a assistir mortes que poderiam ser evitadas”, comentou a respeito do governo federal, que acaba de ter sua campanha “O Brasil não pode parar” suspensa pela justiça.
Na entrevista, Ligia Bahia, também professora da UFRJ, é enfática em afirmar a necessidade de se parar quase tudo e garantir equipamentos de segurança aos profissionais da saúde, cujo contágio também é frequente e por vezes esquecido. Diante da dissonância de postura entre as distintas esferas de governo, recomenda que as pessoas cuidem ao máximo de si e seus próximos.
“As pessoas devem permanecer em casa e permanecer ativas cuidando de si e dos que estão próximos, mas também mobilizadas em torno do apoio ao SUS e a políticas que assegurem a vida”, afirmou.
A entrevista é de Gabriel Brito, publicada por Correio da Cidadania, 28-03-2020.
Eis a entrevista.
Primeiramente, qual o grau de penetração você projeta que a pandemia do Coronavírus pode atingir no Brasil?
Vai atingir todas as cidades de médio porte. É possível que em locais distantes e de baixa densidade demográfica a pandemia não chegue. Mas mesmo assim a previsão é de alta taxa de disseminação.
É necessário parar tudo agora mesmo? Quais as medidas gerais mais urgentes?
Sim. Na realidade deveríamos ter parado mais, a exemplo de aeroportos. Deixar funcionando apenas serviços essenciais e o comércio de alimentos e medicamentos. A estratégia de distanciamento social tem sido a mais efetiva em todos os países do mundo.
O que pensa das respostas do governo ao longo dos dias, agora incentivando abertamente a retomada da rotina normal?
Considero que é uma irresponsabilidade completa. Ou as autoridades governamentais não entendem a magnitude da tragédia ou realmente consideram que as vidas humanas não importam. Estão levando o país a assistir mortes que poderiam ser evitadas.
Os sistemas público e privado de saúde podem dar conta do que vier a ocorrer até que nível de abrangência da pandemia?
Não. O volume de atendimentos é imenso e nenhum sistema está preparado. O que está acontecendo em Nova York evidencia que nem onde tem uma enorme concentração de recursos hospitalares é possível. No Brasil o SUS, como todos sabem, já tinha problemas de filas e os leitos de CTI são insuficientes para dar conta dos casos cotidianos.
O setor privado também terá desafios porque nem todos os estabelecimentos de saúde são qualificados e seguros. Ou seja, está se tentando ampliar a oferta de serviços de saúde, mas até agora vimos mais anúncios do que medidas concretas. É preciso cobrar!
Como ficam os trabalhadores do sistema de saúde, que serão expostos diariamente ao risco?
Esse é um problema muito sério. Já tem profissionais de saúde diagnosticados como positivos para o coronavírus. É imprescindível proteger os trabalhadores da saúde. Equipamentos de proteção individual para todos os que atendem pacientes são recursos estratégicos para enfrentar a pandemia.
Parece visível que governos estaduais trabalham de forma autônoma em relação ao federal. O que você pensa disso? Haverá uma inevitável confusão para a população?
Sim, muita confusão, mensagens desencontradas. Não há uma comunicação clara das políticas de apoio para que as pessoas fiquem em casa. O presidente debocha do vírus, o considera fraco para causar danos a um povo, segundo ele, forte.
Infelizmente, a autoridade máxima do país está equivocada. Os fatos evidenciam que a doença não respeita a crença na superioridade de nenhuma nacionalidade. Governadores que seguem as orientações da OMS estão ganhando apoio popular.
Como vê o Brasil em comparação à maioria dos países no combate à pandemia, a começar pelos países vizinhos?
A Argentina adotou medidas radicais e o México demorou para reconhecer a necessidade de quarentena. O Brasil acenou com políticas acertadas, mas mudou de rumo, exatamente no início da curva de crescimento dos casos. Uma medida indubitavelmente homicida.
Como vê a discussão sobre a derrubada do teto de gastos, dentre outras políticas públicas, a partir deste evento excepcional?
Diversos países decidiram recuar, recusar limites impostos pelos cânones da austeridade fiscal. Ficou claro que a vida vem em primeiro lugar. No Brasil tornou-se consenso o apoio ao SUS. Esse novo ordenamento de prioridades pode ser importante para a efetivação do direito à saúde.
O que as pessoas devem fazer do ponto de vista individual?
Devem permanecer em casa e permanecer ativas cuidando de si e dos que estão próximos, mas também mobilizadas em torno do apoio ao SUS e a políticas que assegurem a vida.
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“Brasil toma medidas homicidas ao mudar de rumo na hora que a curva de casos aumenta”. Entrevista com Ligia Bahia - Instituto Humanitas Unisinos - IHU