10 Setembro 2017
O Papa Francisco alterou a normativa canônica sobre a tradução para as línguas vernáculas dos livros litúrgicos no Motu Proprio Magnum Principium, com data de 03 de setembro de 2017, publicado pelo Vaticano e que entrará em vigor no próximo dia 01 de outubro de 2017. Um procedimento em que Francisco, citando o Concílio Vaticano II, estabelece que a tradução, aprovada pelas Conferências Episcopais nacionais, não mais precisará ser submetida a uma revisão por parte da Sé Apostólica (“recognitio”), mas apenas a sua confirmação (“confirmatio”), que “não se configura, portanto – explicou Arthur Roche, arcebispo secretário da Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos –, como uma intervenção alternativa à tradução, mas como um ato que autoriza, mediante o qual o órgão competente ratifica a aprovação dos bispos”.
A reportagem é de Iacopo Scaramuzzi, publicada por Vatican Insider, 09-09-2017. A tradução é de André Langer.
O objetivo do novo Motu Proprio do Papa, pode-se ler no documento, é que a disciplina canônica atualmente em vigor no cânon em questão fique “mais clara” e “alguns princípios transmitidos desde a época do Concílio sejam reafirmados mais claramente e postos em prática”. O procedimento modifica os parágrafos 2 e 3 do cânon 838 do Código de Direito Canônico.
“O importante princípio, confirmado pelo Concílio Ecumênico Vaticano II, segundo o qual a oração litúrgica, adequada à compreensão do povo, possa ser compreendida, exigiu a grave tarefa, encomendada aos bispos, de introduzir a língua vernácula na liturgia e de preparar e aprovar as versões dos livros litúrgicos”, escreveu o Papa na introdução ao Motu Proprio.
A Igreja latina estava consciente do iminente sacrifício “da perda parcial da sua própria linguagem litúrgica, utilizada em todo o mundo durante séculos”. No entanto, abriu de bom grado “a porta para que as versões, assim como parte dos próprios ritos, se convertessem na voz da Igreja que celebra os divinos mistérios, junto com a língua latina. Ao mesmo tempo, especialmente depois das diferentes opiniões claramente expressadas pelos Padres Conciliares sobre o uso da língua vernácula na liturgia, a Igreja estava ciente das dificuldades que poderiam surgir nesta matéria”. Por isso, a necessidade de uma série de medidas emanadas durante as últimas décadas por parte da Sé Apostólica.
O Motu Proprio destaca a importância da fidelidade aos textos originais: “Será preciso comunicar fielmente a um determinado povo, através da sua própria língua, o que a Igreja quis comunicar a outros através da língua latina”. Com outras palavras: “Qualquer tradução dos textos litúrgicos deve estar em conformidade com a sã doutrina”.
Não devemos nos surpreender, esclareceu o Papa, com o fato de que “no decorrer deste longo processo de trabalho tenham surgido dificuldades entre as Conferências Episcopais e a Sé Apostólica. Para que as decisões do Concílio sobre o uso das línguas vernáculas na liturgia possam valer também em tempos futuros, é tanto mais necessária uma colaboração constante, cheia de confiança recíproca, atenta e criativa, entre as Conferências Episcopais e a Sé Apostólica, que tem a tarefa de promover a Sagrada Liturgia, isto é, a Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos. Por isso, para que a renovação de toda a vida litúrgica prossiga, pareceu oportuno que alguns princípios transmitidos desde a época do Concílio sejam reafirmados mais claramente e postos em prática”.
O procedimento papal, de quatro parágrafos, especifica que regulação da Sagrada Liturgia “compete propriamente à Sé Apostólica e, a norma de direito, ao Bispo diocesano” (1); que é “de competência da Sé Apostólica ordenar a Sagrada Liturgia da Igreja universal, publicar os livros litúrgicos, revisar as adaptações aprovadas à norma de direito pela Conferência Episcopal, além de zelar para que as normas litúrgicas sejam fielmente observadas em todos os lugares” (2); que “espera que as Conferências Episcopais preparem fielmente as versões dos livros litúrgicos nas línguas correntes, apropriadamente adaptadas dentro de limites definidos, aprová-las e publicar os livros litúrgicos, para as regiões pertinentes, após a confirmação da Sé Apostólica” (3); e, para confluir, que “o Bispo diocesano na Igreja a ele encomendada espera, dentro dos limites da sua competência, dar normas em matéria litúrgica, às quais todos devem aderir”.
O terceiro parágrafo, em particular, tem “consequências sobre o artigo 64 parágrafo 3 da Constituição Apostólica Pastor Bonum” (além de outras leis, em particular as contidas nos livros litúrgicos, em matéria de traduções e adaptações), que estabelecia que a Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos, atualmente dirigida pelo cardeal Robert Sarah, “revisa as tradições dos livros litúrgicos e suas adaptações, legitimamente preparadas pelas Conferências Episcopais”.
Na nova formulação do cânon, explica em uma nota dom Roche, estabelece-se uma distinção mais adequada “quanto ao papel da Sé Apostólica, entre o domínio próprio da ‘recognitio’ e o da ‘confirmatio’”, no que diz respeito à competência das Conferências Episcopais, levando em conta a sua responsabilidade pastoral e doutrinal e também seus limites de ação. A ‘recognitio’ “implica o processo de reconhecimento pela Sé Apostólica das legítimas adaptações litúrgicas, inclusive as adaptações ‘mais profundas’ que as Conferências Episcopais possam fazer e aprovar para seus territórios, nos limites permitidos. Neste terreno de encontro entre a liturgia e a cultura, a Sé Apostólica está chamada, portanto, a reconhecer, isto é, a revisar e avaliar tais adequações, em razão da salvaguarda da unidade substancial do rito romano”.
A ‘confirmatio’, por sua vez, tem a ver com “as traduções dos textos litúrgicos que, com base na Sacrossanctum Concilium (n. 36, parágrafo 4), compete às Conferências Episcopais preparar e aprovar; o & 3 do cânon 838 precisa que as versões devem ser feitas ‘fideliter’ de acordo com os textos originais, retomando assim a preocupação principal da Instrução Liturgiam Autenticam”. O Motu Proprio, citando o direito e o dever da tradução confiada às Conferências Episcopais, “recorda também que as próprias Conferências devem estabelecer que, tendo em conta a índole de cada uma das línguas, o sentido do texto original seja dado plena e fielmente”.
A ‘confirmatio’ da Sé Apostólica, explicou o arcebispo, não se configura, portanto, como uma intervenção alternativa de tradução, mas como um ato de autorização, mediante o qual o Dicastério competente ratifica a aprovação dos bispos. “Supondo, obviamente, uma avaliação positiva da fidelidade e da concordância dos textos produzidos com a edição típica sobre a qual se baseia a unidade do rito, e tendo em conta principalmente os textos de maior importância, especialmente as fórmulas sacramentais, as orações eucarísticas, as orações de ordenação, o rito da missa e assim por diante”.
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O Papa deixa a tradução dos textos litúrgicos para as Conferências Episcopais - Instituto Humanitas Unisinos - IHU