21 Março 2014
Parques tecnológicos promovem o desenvolvimento econômico e a universalização de programas básicos de cidadania por meio de uma estratégia de desenvolvimento territorial sustentável, avalia a pesquisadora.
Foto: Uol |
Como proposta para enfrentar os dilemas socioambientais da Amazônia, os Parques Tecnológicos presentes em algumas universidades, como o da Universidade Federal da Amazônia - UFAM, desenvolvem projetos com os povos tradicionais da região para promover a “inclusão social dos segmentos em situação de risco social e ambiental e de marginalização social, que antes tinham sua condição de cidadãos negada e que passam a obter o acesso a bens e serviços sociais”, diz a pesquisadora Maria do Perpétuo Socorro Rodrigues Chaves à IHU On-Line, em entrevista concedida por e-mail. Tais projetos, acentua, proporcionam a capacitação e formação dos trabalhadores “com uso de tecnologias e inovações que aumentam a produtividade e geram emprego e renda”.
De acordo com a pesquisadora, os problemas socioambientais da região estão relacionados “com os direcionamentos das políticas públicas que não atendem às necessidades regionais específicas; com a carência de políticas para o desenvolvimento de Ciência, Tecnologia e Inovação na região; e com a necessidade de valorização dos conhecimentos dos povos tradicionais (ribeirinhos, varjeiros, indígenas, quilombolas, pescadores e agricultores) em suas práticas de manejo sustentável dos recursos naturais locais”. Com o objetivo de romper com esse cenário, “os parques tecnológicos fornecem o ambiente para oportunizar a realização de negócios e sediar empreendimentos baseados em conhecimento, ao arregimentar e abrigar centros, núcleo e laboratórios para pesquisa, focados no desenvolvimento tecnológico, práticas de inovação e incubação, capacitação, prospecção, implantação de infraestrutura, bem como feiras, exposições e desenvolvimento mercadológico. A implantação dos parques na região atende a população de 45 municípios do estado e tem a “finalidade contribuir para o desenvolvimento econômico, cultural e político dos povos da Amazônia, sob bases sustentáveis”, conclui.
Maria do Perpétuo Socorro Rodrigues Chaves é graduada em Serviço Social pela Universidade Federal do Amazonas - UFMA, mestre em Sociologia Rural pela Universidade Federal da Paraíba – UFPb e doutora em Política Científica e Tecnológica pela Universidade Estadual de Campinas – Unicamp, e em 'Processus d`Inovation Changements Organisationnel' no Centre International de Recherche sur l`Environnement et le Devellopment, de Paris. É docente da Universidade Federal do Amazonas, coordenadora do Grupo Interdisciplinar de Estudos Socioambientais e de Desenvolvimento de Tecnologias Apropriadas na Amazônia.
Maria do Perpétuo Socorro Rodrigues Chaves participará do I Congresso de Direito, Biotecnologia e Sociedades Tradicionais, promovido pelo Programa de Pós-Graduação - PPG de Direito da Unisinos, nos dias 25 e 26 de março de 2014.
Foto: UFAM |
Confira a entrevista.
IHU On-Line - Quais são os principais dilemas socioambientais da Amazônia?
Maria do Perpétuo Socorro Rodrigues Chaves - Dentre os inúmeros dilemas socioambientais da Amazônia, destacam-se: a) os direcionamentos das políticas públicas que não atendem às necessidades regionais específicas; b) carência de políticas para o desenvolvimento de Ciência, Tecnologia e Inovação na região; e c) necessidade de valorização dos conhecimentos dos povos tradicionais (ribeirinhos, varjeiros, indígenas, quilombolas, pescadores e agricultores) em suas práticas de manejo sustentável dos recursos naturais locais.
IHU On-Line - Quais são as comunidades tradicionais envolvidas com projetos de inovação tecnológica na Amazônia?
Maria do Perpétuo Socorro Rodrigues Chaves - Na atualidade já há um número significativo de comunidades tradicionais envolvidas em projetos de inovação social na Amazônia, todavia, ainda é um número reduzido em relação ao contingente existente. Igualmente faltam estudos que contabilizem os totais destas participações.
IHU On-Line - Como se dá a interação entre as inovações tecnológicas e os saberes das comunidades tradicionais?
Maria do Perpétuo Socorro Rodrigues Chaves - As Instituições de Ciência e Tecnologia desenvolvem projetos de extensão e pesquisa com a participação das populações locais. Para implementar projetos desta natureza é necessário obter uma série de licenças prévias junto aos órgãos gestores das políticas de proteção destes segmentos populacionais.
IHU On-Line - Em que medida essa interação possibilita a inclusão social e a superação de problemas socioambientais?
Maria do Perpétuo Socorro Rodrigues Chaves - O nível de abrangência dos projetos é muito variado: alguns geram resultados que inclusive podem ser replicados para contextos similares, e uma grande maioria gera efeitos muito pequenos ou pouco visíveis para a sociedade do entorno.
IHU On-Line - Quais demandas sociais podem ser resolvidas a partir das Tecnologias Sociais?
Maria do Perpétuo Socorro Rodrigues Chaves - Esta modalidade de Tecnologia (produtos ou processos) pode ser caracterizada por pelo menos três formas de melhoria, de maneira isolada ou combinada, seguida de algumas formas de ação coletiva: 1) ajuda a promover a satisfação das necessidades humanas de populações em condições de exclusão social; 2) facilita o acesso aos direitos sociais nas áreas de educação, saúde, assistência técnica para produção, assistência social, comunicação, energia entre outras; 3) contribui para potencializar as capacidades humanas pelo fortalecimento e empoderamento de grupos sociais, crescimento do capital social.
IHU On-Line - Na prática, quais têm sido os resultados da relação entre tecnologias sociais e saberes tradicionais para as comunidades da Amazônia?
Maria do Perpétuo Socorro Rodrigues Chaves - Inúmeros resultados são relatados por estudos feitos na região, embora ainda sejam numericamente restritos em relação às demandas e necessidades existentes. Dentre eles estão: 1) a satisfação das necessidades humanas não satisfeitas pelo mercado, como acesso a processos e serviços inovadores, num novo padrão de compartilhamento de responsabilidades; 2) a promoção da inclusão social dos segmentos em situação de risco social e ambiental e de marginalização social que antes tinham sua condição de cidadãos negada e que passam a obter o acesso a bens e serviços sociais; 3) a realização de capacitação e formação para o trabalho com uso de tecnologias e inovações que aumentam a produtividade e geram emprego e renda.
IHU On-Line - Quais são as atividades e projetos de inovação tecnológicos desenvolvidos pelo Parque Científico e Tecnológico para Inclusão Social?
Maria do Perpétuo Socorro Rodrigues Chaves - A experiência desenvolvida pela Universidade Federal do Amazonas - UFAM, no Parque Científico e Tecnológico para Inclusão Social, representa uma resposta direta aos dilemas socioambientais mediante o desafio de inclusão social e sustentabilidade na Amazônia.
No Brasil, na última década, de acordo com a Associação Nacional de Entidades Promotoras de Empreendimentos Inovadores - ANPROTEC, a criação de Parques Tecnológicos - PqTs passou a constituir-se numa estratégia de promoção do desenvolvimento tecnológico, econômico e social. Os PqTs fornecem o ambiente para oportunizar a realização de negócios e sediar empreendimentos baseados em conhecimento, ao arregimentar e abrigar centros, núcleo e laboratórios para pesquisa, focados no desenvolvimento tecnológico, práticas de inovação e incubação, capacitação, prospecção, implantação de infraestrutura, bem como feiras, exposições e desenvolvimento mercadológico.
Parque da UFAM
Seguindo esta tendência, a UFAM estruturou o seu Parque Tecnológico sob o signo da Inovação e da Inclusão Social, o Parque Científico e Tecnológico para Inclusão Social – PCTIS, inaugurando uma importante iniciativa na região que conta com significativo número de parceiros estratégicos do poder público, de entidades da sociedade civil organizada, da iniciativa privada e de outras instituições de pesquisa do estado, da região, do país e do exterior. A criação do Parque possui extrema relevância tanto no âmbito institucional quanto no plano de desenvolvimento regional, em vista de sua consonância com a política de governo vigente, em todas as suas instâncias, além de representar a consolidação de um compromisso institucional.
A implantação do PCTIS tem como principal finalidade contribuir para o desenvolvimento econômico, cultural e político dos povos da Amazônia, sob bases sustentáveis. O PCTIS funciona a partir de uma Rede de Inovação e Extensão Tecnológica - RIExT voltada para inclusão social com sustentabilidade. O Parque opera sob a direção da Pró-Reitoria de Inovação Tecnológica - PROTEC, na condição de gestora e indutora de oportunidades para a rede de pesquisadores e instituições envolvidas. O conjunto de empreendimentos da RIExT, ações de extensão universitária, pesquisa e inovação, estão direcionados para promover a inclusão social dos segmentos que se encontram em situação de risco e vulnerabilidade social e ambiental, envolvidos direta e indiretamente na rede, criando oportunidades de acesso para o usufruto de bens e serviços sociais e para adoção de práticas sustentáveis de geração de renda com a formação de arranjos e sistemas produtivos e inovativos locais.
O PCTIS abrange ações de extensão que são constituídas por processos socioeducativos de construção de saberes, práticas e sinergia entre os diferentes agentes sociais envolvidos (pesquisadores, docentes, discentes, comunitários, empresas, entre outros) e caracterizam-se por procedimentos e técnicas de formação/instrumentalização dos atores, numa práxis dialética, dinâmica e democrática. Enquanto as ações de pesquisa, em que pese terem um amplo leque de áreas da ciência, são ajustadas num aporte teórico-metodológico de pesquisa participante abrangendo um conjunto de princípios ético-político, num efetivo esforço de manter a sinergia entre os atores no plano do território delimitado.
Territórios de Cidadania
A área de abrangência do PCTIS alcança a sede e o meio rural de 45 municípios no estado do Amazonas, atendendo mais de 800 comunidades. No meio rural e urbano, o público-alvo são povos tradicionais (indígenas, varzeiros, extrativistas, ribeirinhos, entre outros), as diferentes gerações (crianças, adolescentes, jovens, adultos, idosos), com base na matricialidade familiar, ONGs, empresas e empreendimentos econômicos solidários, artesãos, catadores de material reciclável, populações de rua. A estimativa de indivíduos envolvidos diretamente no projeto é de 250 mil pessoas e de 750 mil envolvidas indiretamente.
A referência territorial utilizada pelo PCTIS é a de Territórios de Cidadania que deriva do programa criado pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário, desde 2008, o qual objetiva promover o desenvolvimento econômico e universalizar programas básicos de cidadania por meio de uma estratégia de desenvolvimento territorial sustentável. Nesta direção, adota-se como estratégia a participação social e a integração entre as ações e as diversas instâncias do governo. Um Território representa uma unidade geográfica que possui características similares em termos de organização social, identidade cultural, econômica e ambiental. A busca por essa unidade visa tornar viável o planejamento de ações para o desenvolvimento com sustentabilidade dessas microrregiões.
A RIExT é composta por um conjunto de subprojetos cuja totalidade das ações propostas terá como resultado a produção de estudos/diagnósticos sobre a dinâmica sociocultural e política nas comunidades ribeirinhas e tradicionais, na produção e transferência de tecnologias sociais e tecnicamente apropriadas para empresas e empreendimentos econômicos solidários.
O PCTIS garante a associação entre a produção do conhecimento científico, pela pesquisa e inovação, com a extensão tecnológica, incorporando iniciativas de empreendimentos sociais e empresariais numa efetiva rede de desenvolvimento tecnológico consolidado em um sistema institucional; em que a totalidade dos estudos está direcionada para fornecer informações qualificadas para a geração de políticas públicas na área socioambiental, política, cultural, econômica e tecnológica, voltadas para a realidade amazônica, com ações afirmativas de inclusão social a partir de um processo socioeducativo e participativo.
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Parques tecnológicos na Amazônia e as experiências de desenvolvimento sustentável. Entrevista especial com Maria do Perpétuo Socorro Rodrigues Chaves - Instituto Humanitas Unisinos - IHU