18 Dezembro 2025
Os agrotóxicos são pensados e elaborados para exterminar vida, aniquilando insetos, plantas nativas, pássaros, fauna edáfica e, com selvageria e sem a mínima inteligência, as abelhas! Ou seja, a pergunta correta não é se “os agrotóxicos matam”, mas “quais seres eles não exterminam?”
O artigo é de Althen Teixeira Filho, professor do Instituto de Biologia da Universidade Federal de Pelotas (UFPEL), publicado por Sul21, 15-12-2025.
Eis o artigo.
Parcela do mundo científico e do agrocolonialismo, mas não os ambientalistas, surpreenderam-se com a importante notícia (05/12/2025), de que o periódico “Regulatory Toxicology and Pharmacology”, revista científica de destaque internacional, retirou (“despublicou”/ “Retracted”) um artigo basilar para a indústria química dos venenos agrícolas, o qual afirmava que o glifosato não seria cancerígeno.
Esta revista informa que foi uma decisão cuidadosa, baseada em critérios éticos, investigação minuciosa de autoria e conteúdo, manifestando-se nos seguintes termos desabonatórios ao artigo:
- As conclusões sobre carcinogenicidade do glifosato basearam-se exclusivamente em artigos não publicados da Monsanto, desconsiderando várias outras publicações com afirmações contrárias.
- Funcionários da Monsanto participaram secretamente da publicação, mostrando falta de ética, independência e responsabilidade acadêmica.
- Os autores teriam recebido “contribuições financeiras” da Monsanto pela publicação.
- Assim, este “marco” sobre a não carcinogenicidade do glifosato, e usado em decisões regulatórias, está desqualificado como publicação científica.
Por décadas, vive-se um debate desnecessário sobre a elevada letalidade e poder de contaminação, além dos óbvios danos que os venenos agrícolas ocasionam em tudo e em todos.
Milhares de publicações científicas comprovam que, não só na espécie humana, provocam cânceres, más-formações, depressões, Alzheimer, Parkinson, cegueiras, mortes com sofrimentos atrozes, autismo, entre outras tantas. Ou seja, a pergunta correta não é “se os agrotóxicos ocasionam doenças”, mas sim “quais as doenças que os agrotóxicos não ocasionam”?
Os agrotóxicos são pensados e elaborados para exterminar vida, aniquilando insetos, plantas nativas, pássaros, fauna edáfica e, com selvageria e sem a mínima inteligência, as abelhas! Ou seja, a pergunta correta não é se “os agrotóxicos matam”, mas “quais seres eles não exterminam?”
Na natureza em geral, sabe-se que não existe local sem agrotóxicos, envenenando o subsolo desde o Aquífero Guarani, até a superfície onde são despejados em milhões de toneladas. Há muito estão presentes nos oceanos, nas nuvens, nas chuvas, indo intoxicar desde ursos polares até o leite materno, com mães amamentando seus rebentos com veneno no leite. Ou seja, a pergunta não é “se vamos nos envenenar”, mas sim “quantos já morreram no mundo envenenados, o quanto estamos todos envenenados, adoentados, já sentenciados e morrendo?”
A luta desigual entre, de um lado, a obviedade científica (venenos matam), associada às milhares de publicações (declarando que o glifosato é cancerígeno), e, de outro, as polpudas verbas de propaganda, a bancada do agronegócio, o lobby das empresas, os administradores políticos desqualificados (quando não corruptos), ou as empresas de vigilância irresponsáveis, favorece a indústria química dos venenos agrícolas.
A indústria química ainda conta com o apoio pago ou de bajulações de vários “cientistas”, tendo a ousadia de elaborar uma lista de nomes de “confiança” no Brasil. Tais pessoas transitam na Unicamp, na USP, na Unesp e até mesmo já houve quem foi presidente da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), mostrando a isenção com que esse grupo atua.
Fica aqui a recomendação da leitura da excelente reportagem “Mensagens revelam quem são os cientistas de confiança da Bayer no Brasil”, da agência Repórter Brasil.
Agora os holofotes estão na Anvisa, CTNBio e de outras agências, cujos pareceres favorecem a indústria química. Entretanto, estas entidades viram as costas para a saúde da população, desconsideram instituições respeitadíssimas como o Instituto Nacional do Câncer (INCA), a Agência Internacional de Pesquisa sobre o Câncer (IARC), além dos vários e qualificados dossiês da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), entre tantas outras.
Por exemplo, a manifestação da Anvisa sobre o agrotóxico 2,4-D, outro potente veneno que causa volumosos prejuízos para várias atividades agrícolas, quando comparada com a bula da fabricante do veneno, a Nortox, oferece resultados interessantes, para dizer o mínimo.
A Anvisa informa que:
- O veneno 2,4-D surge na sua página como “Medicamento”.
- O produto não é tóxico para a reprodução, nem teratogênico (más-formações fetais).
- Não é tóxico para o sistema endócrino.
- Não é mutagênico ou causador de câncer.
- Com relação aos “resíduos de 2,4-D encontrados em alimentos e na água, o risco para a população é bem reduzido”.
Cientificamente, e de modo especial, esta última afirmação é absolutamente vexatória, tola e irresponsável, na qual transparecem três fatos. Primeiro, o 2,4-D já contamina de forma intensa, alcançando alimentos e mananciais hídricos. Segundo, “parcela reduzida da população” já sofre contaminações e consequências do veneno. Então, pergunta-se, num país com 210 milhões de habitantes, quanto brasileiros comporiam esta “parcela reduzida” da população? Terceiro, esta frase parece ser mais uma contribuição escrita da indústria química.
Por outro lado, a bula da fabricante Nortox informa:
- O 2,4-D é perigoso ao meio ambiente
- Nos testículos, provocam decréscimo de peso, atrofia, aspermatogenia (ausência completa da formação de espermatozoides) e degeneração; nos ovários, também é observado decréscimo de peso.
- Na tiroide, ocasiona aumento de peso, decréscimo de T4, hiperplasia e hipertrofia.
- Nos olhos, ocorrem opacidade, catarata, degradação da retina; incidência aumentada de degeneração retinal bilateral (é o que se chama de “cegueira” – nota do autor).
- Também gera neurotoxicidade e decréscimo do peso de cérebro (fêmeas de cães).
- Foi verificada a incidência aumentada de lesões nos rins.
- Intoxicações geram descoordenação, anormalidades no andar e decréscimo na atividade motora.
Depois dessas comparações, cabe ao leitor elaborar suas conclusões sobre a isenção da Anvisa! Entretanto, como se trata da Monsanto, a notícia sobre a “despublicação” traz mais dúvidas do que certezas!
A consulta à retratação original da revista mostra data de publicação em abril do ano 2000, ou seja, como e por que os jornais do mundo inteiro mostram este fato somente agora, 25 anos depois da publicação?
Como opinião pessoal, imagina-se que Anvisa, CTNbio e outras lançarão, no máximo, uma nota com explicações, justificativas, tergiversações, algo do tipo, “estamos atentos”, “vamos acompanhar o desenrolar dos fatos”, “seguiremos com nossos critérios rígidos de controle”, “sempre procuramos a salvaguarda das pessoas”, “bla, bla, bla”.
E mais nada!
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