03 Dezembro 2025
- “Apesar do que digam as carpideiras de sempre, a discrição é o distintivo deste enviado pessoal. É difícil seguir seu rastro em suas contínuas idas e vindas à América, seja para dar conferências, seja para realizar investigações.”
- “Um cardeal americano nos confirmou que Bertomeu se encontrou com quase todas as conferências episcopais da Hispanoamérica a portas fechadas, para ajudá-las a tratar, sem pressão midiática, dos abusos e de sua prevenção.”
- “A supressão do Sodalício não foi obra apenas de Bertomeu, nem de Scicluna, nem de Simona Brambilla ou de Braz de Aviz, nem de Prevost ou Francisco. Foi um trabalho minucioso feito a várias mãos.”
- “Nas últimas semanas, o Papa vem sendo alvo de ataques sistemáticos por parte de supostos ‘católicos’ totalmente irresponsáveis, que lançam sobre ele suspeitas maliciosas.”
A reportagem é de José Manuel Vidal, publicada por Religión Digital, 02-12-2025.
Um enviado muito especial
Jordi Bertomeu, muito próximo de Francisco e agora também de Leão XIV como seu escudeiro para assuntos extremamente delicados, não é desconhecido dos nossos leitores. Tudo começou na “missão especial ao Chile”, junto a D. Scicluna, em 2018. Era o golpe de timão de Francisco contra o encobrimento dos abusos.
Nos meses seguintes viriam Vos Estis Lux Mundi, a reforma de SST e do Livro VI do Código de Direito Canônico, além do Vademécum. Enquanto isso, no Chile, vieram à tona mais de 160 casos de clérigos abusadores e outros tantos de encobridores: um terremoto para igrejas pouco habituadas à transparência e à prestação de contas.
Após a Covid-19, vimos Bertomeu em outras missões especiais no México e no Paraguai (desta vez com o cardeal Tempesta). Também na Bolívia (no seminário misto “Cristo Pastor”, em El Alto) e no Peru (nesta última missão ao Sodalício de Vida Cristã, novamente com Mons. Scicluna). Todas essas missões de que temos notícia — porque possivelmente houve outras mantidas em sigilo.
Apesar do que digam as carpideiras de sempre, a discrição é a marca desse “enviado pessoal”. É difícil seguir seu rastro em suas idas e vindas à América, seja dando conferências, seja fazendo investigações. Mas um cardeal americano nos confirmou que Bertomeu se reuniu com quase todas as conferências episcopais da Hispanoamérica a portas fechadas, para ajudá-las a tratar dos abusos e de sua prevenção, sem pressão midiática.
Também sabemos que ele não deixa de se encontrar com vítimas de abusos, seja em sua residência em Roma, seja nos países que visita. E, evidentemente, manteve com o Papa Francisco — e mantém com Leão XIV — uma relação fluida, sem deixar muito rastro no serviço fotográfico do Osservatore Romano.
Conhecemos Bertomeu por seus artigos de divulgação e científicos, imprescindíveis para entender os avanços legislativos em matéria de abusos, a posição de Francisco diante da crise que eles provocaram, o problema dos falsos carismas eclesiais ou os critérios para uma obediência saudável, para citar apenas alguns temas. Nas poucas entrevistas que concedeu, coincidindo com a morte do Papa Francisco e a eleição de Leão XIV, Bertomeu transmitiu sempre uma mensagem de esperança e de compromisso com a verdade e a justiça.
Um bispo espanhol que o conhece bem o descreve como “muito reservado em relação às informações que maneja, lúcido e perspicaz, tenaz e, sobretudo, eficaz; um ativo para a Igreja da Espanha”.
Bertomeu na Complutense
Em sua última conferência na Universidade Complutense, no encerramento da II Jornada “Pro + Tecendo”, esteve brilhante — como destaquei em artigo anterior: muito técnico, divertido e empático ao mesmo tempo, com ótimo domínio comunicativo.
Por sua vez, vítimas de abusos de realidades eclesiais de todo tipo não param de insistir na necessidade de mais “missões especiais Scicluna-Bertomeu”.
Bertomeu nunca propôs encobrir o Sodalício: os áudios
Os esforços das máquinas de propaganda do Sodalício para desprestigiar Bertomeu não surpreendem ninguém. Dias atrás, ele sofreu mais um ataque ignominioso num artigo anônimo da Infovaticana intitulado “O Vaticano pediu dinheiro em troca de encobrir o Sodalício em uma investigação do FBI por lavagem de ativos”.
Desde o título, trata-se de um exemplo de jornalismo católico pouco respeitoso com a verdade e com a deontologia profissional: não se pode retirar frases do contexto para insinuar conspirações e encobrimentos, nem apresentar como fatos afirmações que o áudio simplesmente não contém.
Se examinados com atenção, os dois áudios manipulados e obtidos sem o consentimento de Bertomeu revelam apenas uma atitude de cooperação do Vaticano com as autoridades norte-americanas: há um processo institucional em curso e, surpreendentemente, as vítimas foram colocadas no centro. Pela primeira vez, a gestão institucional dos abusos vem acompanhada de uma tentativa de reparação interna.
Nada nos áudios sugere encobrimento de supostas irregularidades financeiras, destruição de provas ou obstrução de investigações: Bertomeu deixa claro que o Vaticano nunca será cúmplice, em hipótese alguma, de crimes eventualmente cometidos pelo Sodalício. Dizer o contrário é mentir.
Religión Digital pediu a especialistas em direito penal que comentassem o caso: “A partir de áudios que violam qualquer padrão sério de verificação, não se pode deduzir encobrimento, obstrução ou chantagem. Muito pelo contrário: quem afirmar e difundir como fato algo que os áudios não contêm arrisca-se a uma ação por difamação”.
Madri, epicentro dos ataques contra Bertomeu e contra o Papa
“Atacar o enviado pessoal do Papa é atacar o Papa. Atacar o Comissário Pontifício é atacar o Pontífice. E ainda mais quando se faz isso de forma tão grosseira”, diz uma vítima do Sodalício.
Boatos para boicotar a eleição de Leão XIV
Bertomeu foi apenas o investigador que acompanhou Scicluna. As decisões necessárias nos decretos conclusivos foram tomadas por outros: a Secretaria de Estado, o Dicastério para a Vida Consagrada, o de Bispos, o de Leigos e a Doutrina da Fé.
Foram outros também que comunicaram as decisões ao grande público — tanto a Conferência Episcopal Peruana quanto a Nunciatura em Lima. Por isso, a supressão do Sodalício não foi obra apenas de Bertomeu, nem de Scicluna, nem de Simona Brambilla, Braz de Aviz, Prevost ou Francisco. Foi um trabalho minucioso feito a várias mãos — e impecável — graças, em grande parte, ao tandem Scicluna-Bertomeu.
Outros, sim, vazaram informações e perseguiram judicial e midiaticamente Bertomeu, Francisco, jornalistas, qualquer um que cruzasse seu caminho e agora, naturalmente, Prevost. Outros, com a ajuda de seus lobbies vaticanos e especialmente de alguns cardeais, tentaram — sem êxito — questionar o processo canônico que levou à supressão do Sodalício. Outros, não satisfeitos com isso, recorreram à difamação e à manipulação da opinião pública: talvez tenham enganado algum incauto, mas acabaram revelando sua verdadeira identidade, coerente com sua mais do que questionável trajetória política.
Primeiro atacaram Francisco. Sua “lua de mel” terminou no outono de 2013, quando publicou Evangelii Gaudium. Como demonstramos aqui em cinco artigos, alguns think tanks norte-americanos (e seus financiadores) iniciaram então uma campanha de desprestígio, acusando-o de comunista e relativista por se colocar ao lado dos pobres. O que eram propostas magisteriais, a serem analisadas pela teologia, foram rejeitadas pela ideologia mais fanática. O resto é história.
Infovaticana contra o Papa
Leão XIV está apenas começando seu pontificado. Em sua “lua de mel”, goza de uma popularidade indiscutível nos Estados Unidos e no resto do mundo: estamos vendo isso na Turquia e no Líbano. O povo de Deus o ama.
No entanto, nas últimas semanas, o Papa tem sido alvo de ataques sistemáticos por parte de supostos “católicos” absolutamente irresponsáveis, que lançam contra ele suspeitas maliciosas. O castelo de cartas se chama “encobrimento em Chiclayo”, uma construção jurídica e midiática artificial iniciada em maio de 2024, poucos dias depois de o então cardeal Prevost provocar a renúncia do arcebispo sodalite Eguren Anselmi.
Hoje, surpreendentemente, o epicentro dessa campanha contra Leão XIV é Madri. Assim como o ataque a Bertomeu, leva a “marca da casa”. Cui prodest? — diria Sêneca. A quem beneficia esse ataque a Bertomeu e, no fundo, ao Papa? O que pretendem ao sujar a justiça eclesiástica quando ela funciona? Quem move os fios? Quem financia essa nova “movida madrilenha”? — perguntas que alguns terão de responder algum dia.
Em 5 de maio de 2025, às portas do Conclave, Religión Digital publicou o artigo “No final do pré-conclave, Prevost está em alta”. Visto o que aconteceu, não estávamos tão errados. Hoje podemos afirmar igualmente que “a reputação de Bertomeu está em alta”.
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