Trump está usando a Copa do Mundo como arma política contra seus adversários

Foto: Emilio Garcia/Unsplash

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02 Dezembro 2025

O presidente dos EUA ameaça retirar jogos da Copa do Mundo de cidades com tendência democrata. O sorteio abre caminho para o primeiro encontro pessoal do presidente com a prefeita do México, Claudia Sheinbaum.

A reportagem é de Nicholas Dale Leal, publicada por El País, 30-11-2025.

No universo de Donald Trump, tudo pode se tornar moeda de troca em negociações ou arma política. E a pouco mais de seis meses do início da maior Copa do Mundo da história, da qual os Estados Unidos são o principal país anfitrião entre os três, trata-se também do evento esportivo mais importante do planeta. Dentro de suas fronteiras, o presidente republicano ameaça confiscar partidas programadas em algumas cidades de tendência democrata.

Internacionalmente, a organização do torneio, que divide com o México e o Canadá, promete inaugurar um novo capítulo de tensão em uma relação turbulenta com seus vizinhos — uma relação tão próxima e vital para suas economias quanto arraigada e cada vez mais frágil. Tanto que o sorteio do torneio, que será realizado em Washington nesta sexta-feira, pode muito bem ser o primeiro encontro entre a presidente mexicana, Claudia Sheinbaum, e Trump.

Há alguns dias, no Salão Oval, quando Trump e o presidente da Fifa, Gianni Infantino, anunciavam juntos — na mais recente demonstração de sua estreita relação — que os Estados Unidos ofereceriam agendamentos prioritários de vistos para pessoas com ingressos para a Copa do Mundo, o presidente americano alfinetou a progressista Seattle, que recentemente elegeu um prefeito que se identifica como socialista. "Se acharmos que haverá algum problema, eu pediria a Gianni para transferir a Copa para outra cidade. Há muitas cidades que ficariam felizes em sediá-la e o fariam com muita segurança", afirmou Trump.

Esta não foi a primeira vez que o presidente sugeriu a retirada de jogos de cidades governadas por democratas devido a supostas preocupações com a segurança. Ele já havia feito isso com Boston, Los Angeles e São Francisco. Todas essas cidades sediarão entre seis e oito jogos, para os quais os ingressos já estão à venda. Com o torneio tão próximo, mudar a cidade-sede é praticamente impossível, devido a todas as complicações que isso acarretaria, mas até que a Fifa descarte explicitamente essa possibilidade, a ameaça é uma arma que Trump está claramente preparado para usar sem hesitar.

Para manter o status quo e evitar rejeitar a proposta de Trump, Infantino esquivou-se da pergunta que o presidente lhe fez. “As pessoas sabem que virão a uma Copa do Mundo segura. Esta é claramente uma responsabilidade do governo e, obviamente, discutiremos o assunto; estamos trabalhando juntos”, disse o presidente da Fifa. Dada a estreita relação entre Infantino e Trump, o fato de qualquer mudança de sede ser logisticamente muito difícil não é, contudo, uma impossibilidade absoluta.

Nova York, sob a gestão do prefeito eleito Zohran Mamdani, um declarado fã de futebol, também se configura como uma possível candidata em uma futura batalha política relacionada à Copa do Mundo. O democrata anunciou que buscará mudanças no modelo de venda de ingressos da Fifa, no qual, pela primeira vez, os preços são determinados automaticamente pela demanda, e que uma porcentagem dos ingressos será reservada para as partidas disputadas no estádio da cidade, para que os nova-iorquinos possam adquiri-los a preços acessíveis. Nesse caso, porém, após a recente e inesperada reaproximação entre Mamdani e Trump, não está claro qual lado o presidente acabará por apoiar.

No cenário internacional, as relações com o México e o Canadá, marcadas este ano por flutuações tarifárias e pela renegociação pendente do Tratado Norte-Americano de Livre Comércio (Nafta), bem como por questões migratórias e o combate ao narcotráfico, serão testadas nos próximos meses, à medida que a organização e o planejamento entram em suas fases finais. Tanto o México quanto o Canadá sediarão apenas 13 jogos cada, enquanto os Estados Unidos receberão 78, e Trump em nenhum momento ameaçou retirar os jogos de seus vizinhos. No entanto, a indicação de Claudia Sheinbaum de que poderá comparecer ao sorteio em Washington, DC, no dia 5 de dezembro, onde poderá ocorrer o primeiro encontro bilateral entre ela e Trump, ressalta a importância do evento.

Resta saber se e como o presidente dos EUA poderá usar a Copa do Mundo a seu favor, seja contra o México ou o Canadá. Mas, por exemplo, dado o nível de influência de Trump sobre a Fifa, é quase certo entre os torcedores mexicanos que o Irã, país incluído na lista de restrições de viagem dos EUA, acabará no Grupo A, que será liderado pela seleção mexicana, evitando assim que eles tenham que viajar para os Estados Unidos.

Globalmente, os vistos sempre foram uma questão espinhosa para a Fifa. Em torneios anteriores, no Catar e na Rússia, a entidade conseguiu garantir o direito de entrada para cidadãos desses países. Os Estados Unidos jamais aceitariam isso, argumentando que, diferentemente de seus antecessores, o país é de fato um destino desejável para a imigração, onde as pessoas poderiam entrar com uma autorização temporária e permanecer no país.

A notícia de que os vistos para quem possui ingressos serão priorizados é um acordo que parece ter satisfeito todas as partes: os torcedores poderão evitar filas de até 11 meses em algumas embaixadas, como no caso da Colômbia. Os Estados Unidos manterão o alto nível de fiscalização, que foi reforçado nos últimos meses devido à retórica anti-imigração do governo Trump.

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