26 Novembro 2025
Foi um triunfo do multilateralismo e da determinação política, mas os resultados na abordagem da complexa agenda climática e econômica foram praticamente inexistentes.
O artigo é de Susana Ruíz, publicado por El Salto, 24-11-2025.
Eis o artigo.
Nem comigo, nem sem mim. Trump se recusou a participar da cúpula e tentou sabotar as negociações para impedir uma declaração de consenso, chegando a ameaçar vetar a participação da África do Sul na próxima cúpula, que será — ironicamente — sob a presidência dos Estados Unidos.
A África do Sul queria uma declaração consensual, endossada por todos os chefes de governo presentes, e conseguiu. Com uma mensagem poderosa: “A África do Sul não se curva e não se deixará ameaçar”, declarou o presidente Ramaphosa durante a Cúpula Social do G20, onde as vozes das organizações da sociedade civil são ouvidas. As negociações foram intermináveis porque, essencialmente, esta iniciativa foi uma luta pelo poder político. Mas o objetivo foi alcançado.
A África do Sul também desejava que esta cúpula fosse um evento vazio, sem um legado duradouro que refletisse seu compromisso com o continente africano e sua dedicação à redução da desigualdade. Sem dúvida, foi por isso que o próprio presidente Ramaphosa liderou a criação, há alguns meses, de um Comitê Especial sobre Desigualdade Global, presidido pelo ganhador do Prêmio Nobel Joseph Stiglitz, cujas recomendações foram apresentadas na cúpula. Países como Espanha e Brasil, bem como a União Africana e a União Europeia, manifestaram seu apoio, comprometendo-se a garantir o progresso contínuo por meio da criação de um Painel Internacional Independente de Especialistas contra a Desigualdade. Inspirado em órgãos semelhantes focados em mudanças climáticas e inteligência artificial, seu objetivo é fornecer uma base científica para ações políticas.
Em muitos aspectos, foi um triunfo para o multilateralismo e a vontade política. Mas o custo foi alto. No G20, as decisões são tomadas por consenso. Basta um único país se opor a uma resolução para bloquear o progresso. E embora os desafios fossem enormes — na agenda climática, na busca por uma saída para a crise da dívida e no renovado compromisso com um sistema tributário mais justo — os resultados foram praticamente inexistentes.
Mais de 3,4 bilhões de pessoas vivem em países que destinam mais recursos ao pagamento de juros da dívida do que ao investimento em educação ou saúde. Nos últimos 25 anos, 41% da riqueza criada foi para o 1% mais rico do planeta, enquanto os 50% mais pobres receberam apenas 1% dessa riqueza. De fato, uma pessoa entre os 0,1% mais ricos polui mais em um único dia do que alguém entre os 50% mais pobres em um ano inteiro.
Em particular, a principal agenda de reformas do sistema tributário internacional, que visa tributar adequadamente as grandes corporações e os super-ricos, permanece incerta. Após a liderança histórica do Brasil durante sua presidência do G20 no ano passado, quando se chegou a um consenso para promover a tributação dos ultrarricos, a Declaração de Joanesburgo agora se encontra em situação precária: busca projetar continuidade, mas sem apresentar qualquer progresso real.
Que futuro aguarda o G20?
Atualmente, talvez aproveitando-se da vaga deixada pelos Estados Unidos, muitas discussões têm se concentrado em como reconstruir as estruturas de governança e as regras do jogo dentro do próprio G20. Afinal, ninguém ignora que a recém-iniciada presidência americana pode se tornar um verdadeiro tsunami político, pronto para arrastar o resto do mundo numa tentativa de fazer com que Trump "exporte" suas políticas destrutivas.
Martin Wolf, editor de economia do Financial Times, disse há alguns anos, em meio à crise econômica de 2013: "Se o G20 não existisse, teria que ser inventado". Talvez tenha chegado a hora não só de defendê-lo, mas de reinventá-lo.
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