19 Novembro 2025
Grupo destacou que potencial mobilizador das igrejas pode ser usado a favor das questões climáticas.
A informação é publicada por Brasil de Fato, 18-11-2025.
O Projeto Acácias, do Movimento Negro Evangélico, vem realizando há, aproximadamente, um ano a defesa do debate sobre racismo ambiental e as causas das mudanças climáticas dentro das igrejas. O projeto forma lideranças religiosas que atuam em territórios vulneráveis para lidar com desinformação climática e no apoio às comunidades mais afetadas.
O grupo participou de uma mesa de debates na 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança Climáticas (COP30) e mostrou a relevância das igrejas na difusão das discussões climáticas nas periferias.
“Muitos projetos partem de uma lógica de mudança externa, ignorando o que já existe e é construído localmente. O Acácias faz o movimento inverso: busca formar jovens lideranças negras evangélicas que já atuam em contextos vulneráveis e que já promovem algum tipo de mobilização em suas comunidades de fé”, explica José Victor, do Movimento Negro Evangélico.
O projeto já formou 15 jovens e elaborou dois documentos sobre questões climáticas. Victor apontou, no debate, que o foco é preparar lideranças comunitárias para emplacar resoluções concretas sobre o tema.
“Queremos transformar essa influência em articulação para políticas de adaptação climática. É um diálogo que parte da compreensão de que não podemos apenas “enxugar gelo”: acolher é um chamado espiritual, mas também temos um chamado profético para denunciar injustiças e dialogar com as instituições responsáveis por formular e implementar políticas públicas.”
A pesquisa Cristianismo e Narrativas Climáticas, do Instituto de Estudos da Religião (ISER), aponta que a maioria dos evangélicos atribui à ação humana os problemas ambientais e se preocupa com o tema. No entanto, o grupo vê pouco engajamento nas igrejas,
Para Meryne Warah, do Green Faith e uma das debatedores, é preciso se contrapor às narrativas falsas promovidas pelas principais indústrias poluidoras. No caso do país dela, o Quênia, o problema está na atuação das petroleiras.
“Um dos principais desafios é a quantidade de desinformação espalhada pela indústria fóssil — como a ideia de que os impactos da mudança climática são ‘atos de Deus’. Por isso, é nosso dever dizer às pessoas a verdade: o dinheiro é ganancioso, e a fé traz uma voz moral que protege as comunidades, a sacralidade da terra e a dignidade das pessoas que vivem nela”, disse.
Wara citou que, em diversos lugares, essa indústria poluidora atua de forma agressiva contra poderes executivos, legislativos, e que acababam por assegurar licenças para explorar econômicamente territórios.
“Quando isso acontece e nós não dizemos nada, somos responsáveis pela poluição e pela água contaminada que bebemos.”, disse, reconhecendo que é importante mobilizar as comunidades por meio da fé.
“Temos muitos líderes religiosos comprometidos nos lugares onde atuamos. O desafio está em mobilizar todos. Outro desafio é que, quando deixamos lacunas — quando falamos hoje, mas nos calamos amanhã — essas lacunas são preenchidas por corporações de petróleo.”
Warah também defendeu a unidade entre os diferentes tipos de igreja e afirmou que esta união fortalece a resistência contra grandes empresas, a desinformação climática e às mudanças do clima.
“Nunca encontrei uma tradição religiosa que seja a favor de destruir o planeta, expulsar pessoas ou desumanizar quem defende suas terras. Todas as religiões ensinam a proteger a Terra. Todas ensinam a falar por quem não tem voz — e não falo de alguém que nasceu mudo, mas de pessoas sem plataforma, sem espaço para denunciar impactos, marginalização e opressão”, concluiu.
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