16 Setembro 2025
A primeira mulher a ascender ao poder na história do país celebra a comemoração da Independência do México em uma cerimônia carregada de simbolismo: "Vida longa às nossas heroínas anônimas!"
A informação é de David Marcial Pérez, publicada por El País, 16-09-2025.
O Zócalo recebeu com júbilo a primeira mulher presidente da história do México para comemorar o início da independência do país. No coração da capital, Claudia Sheinbaum celebrou o Grito (o "Grito") na noite de segunda-feira, diante de uma praça lotada com quase 140 mil participantes. Os "vivas" (viva) retornaram a um evento breve e formal, com pouco espaço para improvisação. Mas sempre havia espaço para uma mensagem com a assinatura da presidente, agora a atual presidente. Este ano, Sheinbaum encontrou seu nicho com um programa que incluiu feminismo, direitos dos migrantes e até mesmo uma mensagem para Donald Trump: "Viva um México independente e soberano!"
MÉXICO | Así fue el primer Grito de Independencia de CLAUDIA SHEINBAUM |... https://t.co/yuD46bM4wk via @YouTube
— IHU (@_ihu) September 16, 2025
Da sacada do Palácio Nacional, acompanhada do marido, o discurso da presidente foi carregado de gestos simbólicos. A começar pelo roxo feminista da saia do vestido. A parada no caminho para a sacada, diante de um retrato de Leona Vicario, uma das poucas heroínas nacionais. Ou a apresentação da bandeira pelas mãos de oito cadetes militares. Até mesmo o breve e tradicional discurso, que foi quase uma extensão dos destaques de seu ano no cargo. Saudações a Hidalgo, Morelos, Josefa Ortiz (a quem ela se referia pelo nome de solteira) e à própria Leona Vicario se misturaram com "as heroínas anônimas da pátria", "nossos irmãos e irmãs migrantes" e a coda final à soberania nacional, um mantra de qualquer político mexicano, mas ainda mais para Morena na época de Trump.
O discurso presidencial, que durou apenas um minuto, concluiu-se com o toque do Sino de Dolores, instalado sobre a sacada presidencial. Foi uma recriação do discurso original do Padre Miguel Hidalgo, proferido em 16-09-1810, em Guanajuato, um episódio histórico e mito fundador da Independência Mexicana. Em seguida, vieram o hino nacional, fogos de artifício.
Com este evento comemorativo, tremendamente popular no México, Sheinbaum continua, após quase um ano no cargo, a pavimentar o seu próprio caminho. Não apenas como a primeira mulher presidente mexicana em mais de dois séculos, mas também como sucessora de Andrés Manuel López Obrador. Fundador do Morena, o partido governista e faz-tudo da esquerda mexicana, que se retirou voluntariamente da vida pública após a transferência presidencial, Sheinbaum estabeleceu um estilo de política centrado em gestos e símbolos. Sua rejeição à ostentação do poder, seu tom pé no chão e suas constantes piscadelas para a base foram algumas das chaves para seu sucesso esmagador nas urnas em 2018.
Seis anos depois, Sheinbaum venceu com ainda mais votos, um recorde histórico, e encerra seu primeiro mandato político com uma popularidade altíssima de 79%, segundo pesquisa da Enkoll para o EL PAÍS. Esse apoio é ainda maior do que o obtido por López Obrador ao final de seu primeiro ano (que chegou a 73%). Tudo isso em um ano em que o presidente enfrentou a polêmica sobre a reforma do Judiciário (um legado do governo López Obrador, que a manteve em vigor), as negociações intermináveis diante das ameaças de Trump e a guerra criminosa interna em Sinaloa. A violência na região levou até mesmo ao cancelamento das comemorações do Dia da Independência nas ruas.
Com um estilo mais sóbrio, técnico e analítico do que o de seu antecessor, que alguns analistas apelidaram de "esquerda excel", a presidente também o combina com sucesso com simbolismo. Durante a semana que antecedeu a comemoração, ela já dava pistas sobre qual seria seu estilo característico. Anunciou que a cerimônia seria "muito austera", acompanhada apenas por seu gabinete, assim como o jantar subsequente. Contaria apenas com esse pequeno grupo, sem a presença de embaixadores ou convidados internacionais, como tem sido costume em governos anteriores, incluindo o de López Obrador.
Ela também publicou um vídeo do bordado na faixa presidencial que usou na ocasião. As imagens mostram quatro militares da Direção-Geral de Fábricas de Vestuário e Equipamentos do Ministério da Defesa Nacional (Sedena) bordando à mão o dourado da águia e o verde da cobra e do cacto, as cores e símbolos do emblema nacional.
Outro sinal positivo foi o anúncio, nesta sexta-feira, da inclusão de figuras históricas femininas no calendário de festividades, mulheres que nunca haviam sido incluídas nos aniversários do México. "Hoje reconhecemos, já está na lei, como o Dia das Heroínas Anônimas da Nação, muitas mulheres ao longo da história do México que deram e continuam dando suas vidas por este país maravilhoso", anunciou ele esta manhã.
Desde o início de sua campanha eleitoral, a plataforma da atual presidente se destacou por sua forte ênfase nos direitos das mulheres. Em um país onde, em média, mais de 10 feminicídios são cometidos por dia, sua vitória foi interpretada tanto no México quanto no exterior como um impulso considerável à causa feminista. Uma de suas primeiras medidas após assumir o cargo em 1º de outubro foi apresentar uma série de decretos para proteger os direitos das mulheres. O mais simbólico, além da criação de uma Secretaria da Mulher, foi incluir na Constituição a igualdade substantiva entre homens e mulheres, a igualdade salarial e o direito de todas as pessoas a viver uma vida livre de violência.
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