As mulheres em meio à ebulição global. Artigo de de Ana Beatriz Prudente Alckmin e Marina Ganzarolli

Foto: Canan YAŞAR | Pexels

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10 Setembro 2025

Crise climática não atinge a todos da mesma forma: em regiões onde a água é escassa, a sobrecarga recai sobre elas, impactando a rotina e a dignidade.

O artigo é de Ana Beatriz Prudente Alckmin e Marina Ganzarolli, publicado por Folha de S. Paulo, 07-09-2025.

Ana Beatriz Prudente Alckmin é pedagoga e benfeitora social, é embaixadora climática da ONG Me Too Brasil e líder do projeto educacional Zerah Platform.

Marina Ganzarolli é advogada, empreendedora social e CEO da MG Consulting, além de fundadora da ONG Me Too Brasil e membro do Pacto Global da ONU.

Eis o artigo.

Em 2024, a crise climática deu um salto alarmante: pela primeira vez, a temperatura média global ultrapassou 1,5°C em relação aos níveis pré-industriais. Todos os continentes (exceto Oceania e Antártida) bateram recordes de calor.

Populações latino-americanas, como no México e Chile, estão entre as mais preocupadas com os impactos das mudanças climáticas. O aumento de gases do efeito estufa, como Co2 e metano, intensificado desde a Revolução Industrial, provoca extremos climáticos como enchentes, incêndios e degelos. A Groenlândia, por exemplo, já registra degelos acelerados, expondo reservas antes inacessíveis.

O termo "ebulição global", usado por António Guterres em 2023, indica uma nova fronteira crítica. Em setembro, a temperatura média mundial chegou a 16,38°C, superando em 0,5°C o recorde anterior. Calor extremo, secas, chuvas intensas e tempestades se intensificam. Algumas regiões esfriam, outras enfrentam seca. A exposição prolongada ao sol pode ser fatal, exigindo hidratação e proteção, sobretudo para idosos, crianças e enfermos. Apesar das mudanças irreversíveis, ainda é possível reduzir danos. "Acabaram-se as desculpas", alertou o secretário-geral da ONU.

A crise climática não atinge a todos da mesma forma. As mulheres, tradicionalmente responsáveis pelo cuidado em contextos patriarcais, são profundamente afetadas. O cuidado exige água: para cozinhar, dar banho, alimentar, limpar, higienizar durante a menstruação. Em regiões onde a água é escassa, a sobrecarga recai sobre elas. A escassez hídrica impacta diretamente suas rotinas e sua dignidade, evidenciando que o colapso ambiental também é uma questão de justiça de gênero.

Em 2015, a ONU lançou a Agenda 2030 com 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, incluindo igualdade de gênero, acesso à educação e ação climática. O desenvolvimento sustentável, fortalecido no pós-guerra com a criação das Nações Unidas, passou a ser medido pelo IDH, que considera renda, saúde e educação, indo além do PIB.

A desigualdade de gênero está presente também na governança climática. Em 2019, só 30% dos líderes em negociações climáticas globais eram mulheres, e 67% dos cargos de decisão estavam nas mãos de homens.

A falta de água potável afeta desproporcionalmente mulheres e meninas. Em 80% dos lares sem acesso à água, são elas que buscam o recurso, somando 16 milhões de horas por dia em 25 países da África Subsaariana.

Durante desastres, mulheres e crianças enfrentam riscos agravados, como violência sexual, abandono e insegurança. Crianças se perdem dos pais, mulheres ficam sozinhas e desprotegidas. A resposta estatal foca no resgate, mas ignora vulnerabilidades que emergem. É urgente pensar estratégias que protejam os mais expostos.

Organizações da sociedade civil vêm suprindo lacunas. A Casa Violeta, criada pelo Me Too Brasil em parceria com o Instituto Survivor, oferece acolhimento, proteção e apoio psicossocial gratuito a mulheres e crianças afetadas por desastres. Surgiu para acolher quem enfrentava assédio nos abrigos convencionais, garantindo um espaço seguro e digno.

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