12 Agosto 2025
Decreto assinado pelo governador Wilson Lima atende pedidos de produtores rurais de Apuí e será usado para regularizar áreas. Governo nega retrocesso
A reportagem é de Karina Pinheiro, publicada por ((o))eco, 11-08-2025.
Atendendo pedidos de produtores rurais de Apuí, o governador do Amazonas, Wilson Lima (União Brasil), decretou a redução de 80% para 50% a área de vegetação nativa que precisa ser mantida dentro de propriedade ou posse rural localizada na Amazônia. Além do governador, o decreto, publicado na última sexta-feira (6), foi assinado pelo Chefe da Casa Civil, Flávio Cordeiro Antony Filho, e pelo secretário de Meio Ambiente, Eduardo Costa Taveira. Para o governo do Amazonas, a medida facilitará a recomposição florestal em áreas privadas com passivos ambientais. Para os ambientalistas, ela é uma brecha para a realização de desmatamento de forma legal, isso em uma das regiões mais pressionadas do estado.
O Decreto nº 52.216/2025 permite a redução e regularização dos passivos ambientais no estado caso a propriedade esteja em município que possui mais de 50% de sua área total ocupada por unidades de conservação da natureza de domínio público e por terras indígenas homologadas, a propriedade esteja devidamente inscrito no Cadastro Ambiental Rural (CAR) e o proprietário tenha promovido ou se comprometa a promover a recomposição, regeneração natural ou compensação da área de reserva legal, até o limite de 50% (cinquenta por cento) da área do imóvel rural”. Segundo o governo, as três exigências estão de acordo com o Código Florestal e a Política Estadual de Regularização Ambiental.
Pelo decreto, outra possibilidade da redução da reserva legal ocorrer é pelo uso do Zoneamento Ecológico-Econômico-ZEE. Isto é, imóveis que estejam localizados dentro do ZEE estão autorizados a redução do percentual mínimo de 80% para até 50%, desde que o Estado do Amazonas possua mais de 65% de seu território ocupado por unidades de conservação da natureza de domínio público, regularizadas, e por terras indígenas homologadas, além da aprovação do ato pelo Poder Executivo Estadual, a partir do Conselho Estadual do Meio Ambiente (Cemaam).
“O decreto amplia a possibilidade de recomposição florestal em áreas com passivo ambiental; e dá condições reais de legalização para produtores que estavam embargados”, discursou o governador Wilson Lima, durante assinatura do decreto. “Não fizemos isso de forma isolada. Construímos esse texto junto com nossa Secretaria de Meio Ambiente, com a Procuradoria Geral, ouvindo as lideranças do sul do Amazonas. E agora vamos dar sequência com o Zoneamento Econômico Ecológico, começando por Apuí”, finalizou.
“A regularização se baseia exclusivamente no Cadastro Ambiental Rural (CAR), um sistema autodeclaratório, sem verificação em campo, o que favorece diretamente a grilagem, ou seja, a ocupação e venda ilegal de terras públicas”, critica Lucas Ferrante, pesquisador da Universidade de São Paulo (USP) e Universidade Federal do Amazonas (UFAM),que afirma que o decreto “segue um padrão de atuação já documentado do governo do Amazonas para facilitar a grilagem e o avanço do desmatamento, especialmente em áreas estratégicas como a região da BR-319 e outras zonas do interflúvio dos rios Purus e Madeira”.
Ferrante afirma que a medida trata-se de uma forma de flexibilização disfarçada. Embora o governo afirme que o decreto não autoriza novos desmatamentos, ele “perdoa” áreas ilegalmente desmatadas, legalizando-as e enviando um sinal de impunidade.
Municípios como Tapauá, Humaitá, Apuí e Autazes, todos abrangidos pelo decreto, tiveram crescimento acelerado de pastagens nos últimos cinco anos (73,29%, 51,77%, 41,95% e 34,45%, respectivamente), em grande parte associado ao desmatamento ilegal ligado à pecuária. “Essa medida fortalece redes criminosas que atuam na grilagem e no desmatamento, favorecendo a conversão de áreas queimadas e desmatadas em pastagens. O risco é consolidar a destruição ambiental, ampliar a expansão agropecuária ilegal e enfraquecer a governança ambiental.”
Em nota, o governo do Amazonas negou que o decreto assinado representa qualquer flexibilização da legislação ambiental vigente. “A medida não autoriza novos desmatamentos nem reduz a exigência de 80% de Reserva Legal para imóveis rurais com cobertura florestal preservada”, diz a nota. “A medida se aplica apenas a imóveis rurais que já possuem passivo ambiental, ou seja, que foram desmatados acima do limite legal antes da regularização e que estejam situados em municípios que já possuam mais de 50% de sua área ocupada por Unidades de Conservação ou Terras Indígenas. Somado a isso, o imóvel deve estar inscrito e validado no Cadastro Ambiental Rural (CAR) e, após regularizado, não pode haver novos desmatamentos nas propriedades.”, disse a nota [leia a íntegra aqui].