15 Abril 2025
Entrevista com a mãe de Refaat Radwan, o jovem de 23 anos que documentou o ataque israelense ao comboio do Crescente Vermelho em seu telefone. Antes de morrer, ele pediu perdão à mulher. “Claro que o perdoo, mas queria que ele estivesse aqui”.
"Mãe, me perdoa, pois estão me matando". No último minuto de sua vida, o jovem paramédico Refaat Radwan confiou sua alma a Deus, mas pediu perdão à sua mãe Zahra. Ele pediu desculpas a ela por ter pecado. De altruísmo. “Mãe, me perdoe, este é o caminho que escolhi, ajudar os outros…”, disse o jovem de 23 anos, enquanto soldados israelenses crivavam de balas a ambulância do Crescente Vermelho em que ele viajava.
Foi Refaat Radwan quem teve o instinto, a força e a coragem de filmar com seu celular um ataque injustificado que tem todas as características de um crime de guerra (15 voluntários palestinos mortos enquanto estavam a caminho para prestar socorro), que ocorreu na madrugada de 23 de março em uma estrada nos arredores de Rafah. As ambulâncias estavam com as luzes piscantes acesas e eram reconhecíveis, como visto no vídeo. Então a escuridão e os sons terríveis, a chuva de ferro na chapa de metal, as orações de Refaat, as balas como um rosário final. “Claro que o perdoo, mas queria que ele estivesse aqui comigo…”, diz Zahra Radwan, 55, ainda chocada. “As palavras dele estão na minha cabeça, continuo ouvindo-as a cada momento do dia”. A mulher fala ao La Repubblica do sul da Faixa de Gaza. E o telefone que ele usa é o do Refaat.
A entrevista com Zahra Radwan, é de Fabio Tonacci, publicada por La Repubblica, 12-04-2025.
Quem era seu filho?
Um menino pacífico que gostava de ver as pessoas felizes. E se as pessoas não estivessem felizes, ele tentava aliviar a dor delas. Uma vocação que era clara desde que ele terminou o ensino médio, então ele tinha em mente ser um voluntário do Crescente Vermelho. E eu o encorajei porque sabia que ele estava seguindo sua natureza. Mas então a guerra começou e tudo se tornou muito perigoso, até mesmo salvar a vida de outras pessoas.
Tras video testimonial Israel rectifica su versión sobre la muerte de 15 paramédicos en Gaza
— DW Español (@dw_espanol) April 6, 2025
El ejército israelí admitió que su versión anterior, en la que aseguraba que las ambulancias se habían acercado sin las luces encendidas, era inexacta y atribuyó ese reporte a los… pic.twitter.com/hbmVTejDWr
Você tentou dissuadi-lo?
Fiquei muito preocupado com o que ele estava fazendo, disse para ele tomar cuidado. Devo ter parecido cautelosa para ele. Mas eu sabia que trabalhar no Crescente Vermelho era o sonho dele e não o atrapalhei.
Viu o vídeo?
Não tudo, eu não consigo. Paro no meio do caminho. Como uma mãe pode assistir a um filme sobre o assassinato a sangue frio do próprio filho?
Ele lhe pediu perdão.
Quando o ouvi pedir perdão, uma mão invisível tomou meu coração e o carregou para longe, para muito longe, para um lugar que não sei como alcançar. É claro que eu o perdoo, meu amor Refaat...
O que sabe sobre 23 de março?
Nada demais, eu não queria saber os detalhes. É tudo muito doloroso. Eu sei que quando Refaat saiu com a ambulância, ele estava uniformizado, com seus documentos de identidade, e os veículos avançavam no escuro, com as luzes acesas. Eram apenas ambulâncias e paramédicos que foram salvar os necessitados.
Durante sete dias, de 23 a 30 de março, não se ouviu nada sobre o ocorrido. O que ele fez?
Foram sete dias de orações e esperanças vãs. Perdemos o contato e eu rezei para que Refaat tivesse sido preso ou que a bateria do seu celular tivesse acabado. Quando me disseram que tinham encontrado o corpo dele na vala comum, a vida parou.
"Me perdoe, mãe... eu escolhi esse caminho para salvar pessoas... Os israelenses estão aqui"
— FEPAL - Federação Árabe Palestina do Brasil (@FepalB) April 6, 2025
Essas são as últimas palavras do paramédico palestino Refaat Radwan, executado por "israel" junto com outros 14 profissionais de saúde palestinos em massacre em Gaza.
A gravação é… pic.twitter.com/s8iwfcOAl6
Seu filho conseguiu fazer aquele filme que mostrou a todos a verdade sobre o massacre. O que ele pensou?
Tenho orgulho dele. O mundo precisa ver que pessoas estão sendo mortas sem motivo em Gaza, o eco desse crime precisa ressoar por todo o planeta. Espero que isso sirva para acabar com a guerra. Mas onde está o mundo? Por que ele não faz nada?
O telefone para o qual ligamos é do Refaat?
Sim. Estou usando o telefone e o número dele. Estou fingindo receber uma ligação dele. Mas ele não me liga mais.