16 Novembro 2024
"Eles agem de má fé, não são ignorantes: predadores gananciosos de futuro que enganam uma maioria das pessoas amedrontadas pela crise econômica, apontando os carros elétricos e as turbinas eólicas como inimigos, não a gasolina e o carvão".
O artigo é de Mario Tozzi, geólogo italiano e divulgador científico, em artigo publicado por La Stampa, 13-11-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.
Comprovando a total confiabilidade de todos os modelos climáticos dos últimos 30 anos, produzidos por todos os especialistas de todas as partes do globo, a Organização Meteorológica Mundial (OMM) certifica, já em novembro, que 2024 será o ano mais quente desde que começaram a ser medidas as temperaturas atmosféricas e oceânicas, o primeiro em que o limite crítico de +1,5°C será ultrapassado. Em meio a uma crise climática sem precedentes em sua globalidade, anomalias e aceleração, assolada por eventos climáticos violentos que estão marcando em particular a bacia do Mediterrâneo, da Andaluzia à Emilia-Romagna, do Magrebe à Península Arábica, não haveria ocasião mais oportuna para realizar uma das Conferências das Partes da ONU para verificar os acordos internacionais feitos em Paris em 2015. Em vez disso, é fácil prever que essa será mais uma oportunidade perdida, que nenhuma ação concreta incisiva será tomada e que, no máximo, alguma emergência será reconhecida para os países mais atingidos, adiando mais uma vez a imposição de regras e parâmetros que permitam a desaceleração do aquecimento global.
Nada de “melhorar a ambição” e “viabilização a ação” (palavras de ordem da COP29): aqui as ambições são constantemente niveladas por baixo e as ações, sugeridas por toda a comunidade científica, simplesmente não são consideradas. De acordo com os especialistas, para se manter dentro do aumento das temperaturas de 1,5°C, 90% (noventa por cento) do carvão e 60% (sessenta por cento) do gás e do petróleo teriam que ser deixados no subsolo: alguém tem notícia de que a extração de combustíveis fósseis no planeta Terra esteja diminuindo drasticamente?
E não só: os subsídios, ainda que disfarçados, às empresas de petróleo e gás chegam a cerca de sete trilhões de dólares por ano (FMI), para os quais a Itália contribui generosamente, e nenhuma política faz o que deveria, obrigando as companhias a dedicar uma porcentagem de seus lucros desmedidos à reconversão em fontes renováveis, pagando o chamado Scc, o custo social do carbono. E 5% seriam suficientes para traçar uma rota de saída dos combustíveis fósseis que fosse paga pelos verdadeiros culpados e não pelos aposentados com o Panda Euro1.
Também em Baku 2024, os organizadores repetem como um mantra que ir além de +1,5°C hoje, o limite definido como intransponível em Paris em 2015, não significa não ter atingido o objetivo, porque é preciso calcular a média em um período mais longo e, neste ano, ainda há El Niño, no próximo, La Niña e, depois, os deuses verão e providenciarão. Essas são evidentes brechas teóricas, porque, na verdade, existe o que é chamado de “Lacuna de Produção”, ou seja, a diferença entre o quanto as empresas de petróleo e gás deveriam extrair, refletido nos investimentos registrados nas instituições de crédito, e o quanto, na realidade, já estão investindo agora, enquanto a Cop29 de confirmação da intransponibilidade do limite de +1,5°C está aberta. A partir de hoje, o cenário mais realista, com base na “lacuna de produção” registrada, chega a +2,7°C, bem acima de Paris e dos acordos internacionais. Eles mentem sabendo que estão mentindo.
Para que os acordos climáticos funcionem, eles deveriam:
1) ser obrigatórios, com proibições de emissões que alteram o clima, talvez explicitados país por país e dentro de prazos bem curtos;
2) prever compensações para aqueles que estão entrando agora no desenvolvimento econômico e que, com razão, veem como absurdo que os países mais desenvolvidos não redistribuam riquezas em troca de empenhos para parar de usar carvão e petróleo;
3) prever órgãos de controle de terceiros, porque o acordo de Paris não os prevê;
4) evitar qualquer nova perfuração;
5) interromper qualquer subsídio público para os combustíveis fósseis. Mas isso significaria limites e regulamentações ao livre mercado, por ser causa última reconhecida da atual crise climática: exatamente o que nenhum sapiens quer no planeta Terra.
É por isso se nega o papel fundamental das atividades humanas na mudança climática atual: temos vergonha de reconhecer que os cientistas estão certos há 30 anos e ignoramos os avisos, então apelamos para o fantasmático estudo do cientista isolado, talvez Prêmio Nobel de física teórica, ou à ideia de que tudo depende do Sol. Ou ao fato de que a Europa polui pouco hoje em dia, e a Itália ainda menos, esquecendo que o dióxido de carbono persiste por décadas na atmosfera e que os europeus estão atrás apenas dos estadunidenses em termos de emissões, se partirmos de onde se deve partir, ou seja, do início do desenvolvimento industrial. Ou, ainda, que os indianos são os que mais poluem, ignorando o fato de que cada indiano emite duas toneladas de CO2 por ano e um estadunidense 14, e adivinhem quem teria que mudar seu estilo de vida. Essas são as verdadeiras mentiras, não a mudança climática, como afirma o reeleito Donald Trump, um dos artífices futuros do fracasso de qualquer política para conter a crise climática, aquele do “continuem perfurando”, para que os Estados Unidos sejam grandes novamente.
Eles não têm a coragem civil de defender que sim, os cientistas até podem estar certos, mas quem se importa, o lucro vem em primeiro lugar, uma posição que pelo menos não seria hipócrita. Eles agem de má fé, não são ignorantes: predadores gananciosos de futuro que enganam uma maioria das pessoas amedrontadas pela crise econômica, apontando os carros elétricos e as turbinas eólicas como inimigos, não a gasolina e o carvão.
E eles se reúnem nas COPs, das quais os lobbies do petróleo e do gás deveriam ser mantidos rigorosamente de fora, para ir levando por mais algum tempo, esperando constatar, com o lucro garantido, que sim, talvez os cientistas estivessem certos, mas agora é tarde demais.
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Os líderes mundiais são predadores em série. Ninguém nos salvará da crise climática. Artigo de Mario Tozzi - Instituto Humanitas Unisinos - IHU