29 Mai 2024
O artigo é de Giorgio Romano, publicado por Religión Digital, 27-05-2024.
Os anos passam, a cultura muda, a teologia se desenvolve e, no entanto, nada disso parece influenciar a celebração da eucaristia, tornando-a cada vez mais um ritual incapaz de atualizar uma experiência de fé no povo cristão. A missa se tornou uma cerimônia gelada. Até para os mais velhos se tornou algo anacrônico, muito entediante. Para os mais jovens, é incompreensível.
A imensa maioria do clero é indiferente a esse problema. Segue como se nada estivesse acontecendo. Não me refiro especificamente aos antigos sacerdotes. Falo dos presbíteros comuns. Até mesmo os padres têm dificuldade em comemorar o mistério pascal, mas superam e celebram a missa.
Falta uma revolução litúrgica, correndo o risco de perder o povo católico o sacramento que recria a Igreja. Se continuar assim, perderemos a Igreja. Ela se tornará uma grande seita de pessoas iniciadas em uma crença esotérica. As orações não são compreendidas! As leituras do Antigo Testamento são aterrorizantes! Os presbíteros comentam os evangelhos como se estes não fossem realmente uma boa notícia para eles!
Proponho uma missa "ao contrário". Ao contrário do modo de celebrar que predomina em todos os lugares, modo impessoal, estático, mecânico.
Acredito que é mais necessário do que nunca ser fiel aos mandamentos-chave do Concílio Vaticano II. Resumo: interação na Eucaristia entre os batizados, a serviço dos quais o presbítero deve estar (Lumen gentium); centralidade da Palavra vivificante de Deus (Dei Verbum); abertura pastoral para o mundo e as vidas das pessoas (Gaudium et spes); e participação protagonista de todo o povo celebrante (Sacrosanctum Concilium).
Uma revolução litúrgica requer uma maneira diferente de exercer a presidência no culto. Os padres na liturgia deveriam ajudar os cristãos a reviver com fervor uma tradição de dois mil anos, consistente no testemunho vivo do que o Senhor ressuscitado tem feito de geração em geração. Se a liturgia não for um lugar onde as pessoas possam testemunhar umas às outras como o amor de Deus mudou suas vidas, deve ser considerada inútil; pode ser válida de acordo com as rubricas do missal romano, mas inválida e um obstáculo para a fé.
A razão de ser do ministério ordenado, de acordo com a mais autêntica tradição da Igreja, é a atualização do mistério pascal no presente. A Eucaristia é memorial. Deve vitalizar o Cristo tangível, audível e visível no mundo contemporâneo, e especialmente nas pessoas reais.
Assim, cada eucaristia pode e deve constituir um ato completamente original. Nunca deveria se repetir. Deus não se repete. Por que as orações coleta, o ofertório e a comunhão devem ser as mesmas em Moçambique, Santo Domingo, Munique, Bujumbura, Bruxelas ou na Antártida? Se devem ser, pelo menos poderiam ser elevadas ao Pai em uma linguagem inculturada. Cada cristão é único. A celebração eucarística deveria ajudar na realização do que o Criador pretendia ao nos criar. Se o rito não veicular a ação criativa do Espírito Santo, ele mata.
Quantos minutos deve durar uma missa? O padre deveria ser flexível com os horários. A elasticidade e a capacidade de improvisação do celebrante deveriam ser muito importantes. E se a missa estiver se estendendo? Diminuam os cânticos, reduzam as leituras, pulem o Glória ou o Credo. Não pode faltar, no entanto, a possibilidade de louvar o Senhor, de implorar, de experimentar seu amor e seu perdão e, é claro, a leitura da Palavra e a comunhão com seu corpo e sangue.
É a celebração da Eucaristia uma assembleia sem sacerdote? Certamente! Em muitos lugares, as religiosas, por exemplo, criaram comunidades e aos domingos elas mesmas proclamam o Evangelho. Elas não estão preocupadas em ser indispensáveis. Sua vida é um serviço. Elas entendem, como disse Paulo VI ao término do Concílio, que a Igreja é serva da humanidade. Elas estão atentas ao que as pessoas vivem. Elas se preocupam com suas necessidades. Elas ajudam as crianças a fazerem as tarefas, recolhem roupas para os mais pobres, criam cestas de alimentos para as famílias famintas, levam as pessoas idosas ao médico, marcham contra as empresas que poluem, levantam a voz pelos migrantes e acompanham as mulheres vítimas de tráfico humano. Isso lhes dá autoridade, elas não têm outra investidura senão viver o Evangelho.
Por outro lado, a ignorância dos padres sobre o que acontece com os outros fiéis durante a missa torna seus conselhos irrelevantes. Suas doutrinas não vêm ao caso. Não falemos de sua autossacralização. O clericalismo, a separação assimétrica que estabelecem com o restante do Povo de Deus, a incensação aos fiéis e a autoincensação, entorpece, infantiliza e desvia do essencial.
A prova de fogo de uma missa bem celebrada, em todo caso, será a participação das pessoas empobrecidas e pecadoras. Se elas ocuparem os bancos de trás, tal celebração não terá nada a ver com o Evangelho. Elas, que são as últimas, deveriam ser as primeiras. "Fazei isso em memória de mim", disse Jesus. Diria hoje: "pratiquem minha misericórdia".
Os celebrantes conhecem os nomes uns dos outros? Tendencialmente, deveriam conhecê-los. O padre os conhece? Se ele não se interessa em aprendê-los, seria melhor que "pendurasse a batina". Se nas missas as pessoas não são importantes, onde serão? Melhor seria que fossem para lugares onde são levadas em consideração. Não percam tempo em igrejas e capelas onde não passarão de espectadores e números que aumentam ou diminuem.
Não se trata de tornar as missas divertidas. Seria uma falta de respeito com as pessoas que perderam um filho ou uma filha, ou sofrem tristezas semelhantes. Mas isso deveria ser considerado essencial. A companhia no sofrimento e as alegrias compartilhadas, assumidas em um pão comido por todos, será a melhor prova da presença real do Senhor em sua Igreja.
A missa, nessas condições, pode cumprir uma função missionária. Para que cumpra efetivamente, faltaria uma condição: que nela todas e todos pudessem comungar, gente justa e pecadora, assim como Jesus gostava que fosse nas refeições para as quais ele era convidado. Os fariseus, que se consideravam bons e desprezavam os outros, comiam apenas entre eles. Jesus, ao contrário, foi criticado por comer com "publicanos e pecadores" (Mc 2, 15).
A missa "ao contrário" é a Eucaristia na qual a primeira e a última palavra são do Espírito Santo, que cria a comunhão porque regenera a originalidade espiritual das pessoas e das comunidades.
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A missa “ao contrário” do modo impessoal, estático e mecânico que predomina em todos os lugares - Instituto Humanitas Unisinos - IHU