16 Fevereiro 2024
O artigo é de José María Vigil, teólogo espanhol naturalizado nicaraguense, publicado por Religión Digital, 16-02-2024.
Ontem, dia 15 de fevereiro, foi inaugurado em Katmandu, capital do Nepal, o Fórum Social Mundial, FSM, e poucas horas antes terminou a sessão interna do Fórum Mundial de Teologia e Libertação - FMTL, no qual 26 teólogos, provenientes dos cinco continentes, partilharam estudos e análises sobre a situação social global, e partilharam os seus contributos teológicos, provenientes dos seus diferentes contextos e preocupações. Na ocasião também trocaram mutuamente as suas sugestões para melhorar as suas reflexões, preparando-se assim para participar, numa segunda fase do seu FMTL, num Fórum muito mais alargado do que o seu, no FSM, frequentado por milhares de pessoas que vêm em grupos e indivíduos que vêm quase sempre como delegações dos mais variados movimentos sociais, representando toda a gama de preocupações atuais das sociedades que habitam o globo.
O FSM começou em 2001, no Brasil, em Porto Alegre. Primeiro foi anual, depois bianual, tendo tido de se adaptar à pausa forçada da pandemia. Agora que esta "normalidade diferente" regressou, está de novo de pé para continuar a marcha. O FSM é explicitamente uma alternativa ao FEM, o Fórum Econômico Mundial, que se realiza suntuosamente em Davos (Suíça) como ponto de encontro do grande capital e das principais potências para definir uma agenda global de crescimento econômico... na perspectiva dos interesses do capitalismo internacional.
Por sua vez, o FMTL teve início em 2005, também em Porto Alegre, quando o FSM já estava em sua quinta edição. Já no primeiro FSM, os teólogos latino-americanos que participaram da primeira hora do FSM debateram a conveniência e a necessidade de realizar, simultaneamente, um encontro, também mundial, da teologia mundial, para acompanhar o grande Fórum em que se reuniram tantos movimentos sociais e militantes, para expressar e partilhar e discernir os interesses dos pobres do mundo. Algumas teologias poderiam preferir acompanhar Davos - e talvez, embora não explicitamente, há as que estão presentes lá; mas a teologia da libertação, a teologia que dizia, com Martí, "Com os pobres da Terra / Quero que se lance a minha sorte", não podia deixar de fazer um esforço para acompanhar este grande encontro dos movimentos sociais do mundo.
E em 2005, como já disse, começou a sua caminhada, sempre em torno do Fórum maior, o FSM, que define a sua própria agenda, as suas datas, os seus temas, o seu calendário e o seu local. Nunca em Davos, mas perto das periferias sociais, do terceiro mundo, dos povos pobres e oprimidos, para fazer teologia a partir da opção pelos pobres e das vítimas do sistema econômico mundial.
Depois da primeira parte, já concluída em Katmandu, na véspera do FSM, os teólogos inserem-se agora no FSM, entre os milhares de ativistas presentes, ouvem as apresentações vindas de todos os cantos do mundo, escutam em primeira mão as queixas, as lutas, os sonhos e as esperanças dos ativistas, e recarregam as baterias para que o carisma da sua teologia permaneça sempre libertador.
Quase ao acaso, abordamos um dos participantes do quinto continente, David Tutty, um australiano:
Sou um participante do Fórum Global de Teologia e Libertação 2024. Vivo na Austrália e trabalho como educador e defensor da justiça social na Diocese Católica de Toowoomba. Cheguei ao nosso fórum em Kathmandu com uma sensação de entusiasmo. Já tinha participado em dois fóruns anteriores, mas tinham sido há algum tempo. O meu entusiasmo deveu-se ao facto de a libertação e a teologia da libertação continuarem a oferecer caminhos cheios de esperança. Para mim, a teologia da libertação tem a ver com esperança baseada na realidade. Procura ser honesta em relação às nossas estruturas e organizações humanas e ao impacto que têm em toda a criação de Deus. O Papa Francisco fala de ouvir o grito da terra e o grito dos pobres. É aqui que começa a Teologia da Libertação. Esta forma de fazer teologia procura então compreender o contexto mais alargado destes 'gritos' à luz de aspectos chave da fé e da tradição. Fazemo-lo para podermos oferecer formas de concretizar a esperança em cada um dos diferentes contextos. Basicamente, esta forma de fazer teologia aborda questões e assuntos difíceis e desafiantes para o bem daqueles que lutam contra a injustiça e para o bem do próprio planeta Terra. E isto entusiasma-me. Trata-se de nos envolvermos com o que realmente importa na nossa vida partilhada neste planeta. Estou grata por ter podido ouvir as opiniões de outros participantes e por poder partilhar algumas das minhas. Regressarei a casa com energia e inspiração para continuar a minha própria viagem de reflexão e escrita.
Qualquer outra pessoa pode dar-nos um testemunho semelhante. Todos nós somos inspirados pela mesma vontade de servir a Causa da Humanização da Humanidade, no caminho bem trilhado por não poucas tradições religiosas.
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"Como repensar a teologia global a partir do Terceiro Mundo, a partir das vítimas". Artigo de José Maria Vigil - Instituto Humanitas Unisinos - IHU