09 Janeiro 2024
O arcebispo pediu uma “discussão séria” sobre a regra secular do celibato. Dom Charles Scicluna declarou ao Times of Malta que a Igreja deveria rever as suas regras para permitir aos padres católicos se casarem.
A reportagem é de Mark Laurence Zammit, publicada por Times of Malta, 07-04-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.
Amadureceram os tempos para “discutir seriamente a questão” e “tomar decisões a esse respeito”, disse, acrescentando que já falou abertamente sobre isso no Vaticano, mas reconhecendo que, em última análise, não cabe a ele decidir.
“É provavelmente a primeira vez que falo isso publicamente e pode parecer herético a alguns”, disse o arcebispo, que é também um respeitado funcionário do Vaticano. “Por que deveríamos perder um jovem que teria sido um ótimo padre só porque queria se casar? E efetivamente perdemos bons padres só porque eles escolheram o casamento”. A regra secular do celibato sacerdotal foi discutida publicamente por décadas, mas até agora as autoridades eclesiásticas locais sempre a defenderam, insistindo que a vida de padre deve ser dedicada exclusivamente à Igreja e à sua comunidade.
Em entrevista concedida ao Times of Malta esta semana, Scicluna reconheceu que o celibato tem e continuará a ter um lugar na Igreja, mas disse que aprendeu com a experiência que também aos padres deveria ser dada a oportunidade de se casar, tal como nas Igrejas Católicas de rito oriental. “Foi facultativo durante o primeiro milênio de existência da Igreja e deveria voltar a sê-lo", disse ele.
“Um homem pode amadurecer, ter relacionamentos, amar uma mulher. Na situação atual, tem que escolher entre ela e o presbiterado, e alguns padres resolvem isso envolvendo-se sigilosamente em relacionamentos sentimentais". Ele afirma isso ao responder perguntas sobre padres católicos que vivem secretamente um relacionamento sentimental enquanto continuam a exercer publicamente as suas funções como padres.
Alguns deles tiveram um relacionamento romântico por anos e outros até tiveram secretamente filhos desses relacionamentos. “Essa é uma realidade global, não acontece apenas em Malta. Sabemos que existem padres em todo o mundo que têm filhos e penso que existam alguns também em Malta”, disse ele.
O arcebispo e advogado de 64 anos não é um prelado comum. Além de liderar a Igreja de Malta, também ocupa um dos cargos mais influentes no Vaticano, o de secretário adjunto de Dicastério para a Doutrina da Fé.
A Igreja Católica Apostólica Romana, no seu rito latino, é a única confissão cristã que exige que todos os seus padres sejam celibatários, isto é, que se abstenham do casamento e das relações sexuais. Mas nem sempre foi assim.
Durante o primeiro milênio após a morte de Jesus, os padres geralmente podiam se casar e ter filhos. Foi no século XII que a Igreja introduziu definitivamente a regra. Mas é apenas uma regra, não um dogma da Igreja, e, portanto, pode ser alterada pelo Papa Francisco, mesmo que o pontífice de 87 anos ainda não pareça convencido.
O Vaticano esteve muito perto de mudar a regra em 2019, quando o Sínodo dos Bispos votou esmagadoramente para permitir que homens casados na região amazônica se tornassem padres para atender às necessidades da Igreja naquela região.
Mas apesar de se assemelhar a um parlamento de bispos, o Sínodo não é uma autoridade decisória e a palavra final sobre as mudanças das regras na Igreja está nas mãos de Francisco, que não levou adiante a mudança.
O arcebispo disse, no entanto, que o Papa tem razão ao insistir no fato de que tal mudança não serviria para mitigar a crise vocacional. A vocação tem a ver com fé e relacionamento de uma pessoa com Deus, e as regras não deveriam ser mudadas apenas para atrair mais homens para o presbiterado ou para preencher lacunas.
Conhecido nos ambientes eclesiásticos como o mais respeitado especialista em crimes sexuais do Vaticano, Scicluna desfruta de uma reputação respeitável entre a cúpula da Santa Sé e é frequentemente chamado pelo Papa Francisco para iniciar investigações sobre alguns dos casos de abuso de maior visibilidade internacional na Igreja.
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Os padres deveriam ter a oportunidade de se casar, opina Dom Charles Scicluna - Instituto Humanitas Unisinos - IHU