“Escutar os jovens e não lhes impor as nossas inquietações”. Irmão Alois, ex-prior de Taizé

Foto: Reprodução | Facebook de Taizé

06 Dezembro 2023

“É preocupante que os jovens tenham dificuldades de encontrar espaços de busca de verdade e de sentido para a vida nas comunidades e nas igrejas locais, que sejam também espaços de amizade entre eles”, disse este sábado, em resposta a uma pergunta do 7MARGENS, o irmão Aloïs, ex-prior de Taizé, horas antes de passar o cargo ao seu sucessor, o irmão Matthew, de confissão anglicana e nacionalidade inglesa.

A reportagem é de Manuel Pinto, publicada por 7MARGENS, 02-12-2023. 

Numa conferência de imprensa internacional feita, sobretudo, na base de perguntas dos jornalistas, o novo prior acrescentou, sobre o mesmo assunto, ser necessário “escutar as questões dos jovens de hoje e não impor-lhes as nossas inquietações” e, por essa via, criar “dinâmicas de pertença”. A pergunta fundamental, acrescentou o irmão Matthew, é: “que fazemos para dar aos jovens um lugar em que possam colocar as suas questões”.

Neste sábado à noite, véspera do início do Advento, a celebração em que Aloïs transmitiu o ministério a Matthew começou na igreja da aldeia próxima de Taizé, na região da Borgonha, França, com a participação especial de cinco representantes de diferentes confissões religiosas. Envolveu uma caminhada até à igreja da reconciliação, o local onde se situa a comunidade: aqui, todos os monges abençoaram o novo prior.

Aloïs estava à frente de Taizé desde 2005, tendo sucedido ao irmão Roger, o fundador da comunidade, morto a golpes de faca durante a oração da noite, por uma jovem com problemas mentais. Vai para dois anos escolheu para lhe suceder um irmão que integrava a comunidade desde 1986, mas fê-lo depois de confrontar a comunidade com a oportunidade e necessidade de mudar a liderança e iniciar “uma nova etapa”. Todos os monges foram consultados e cada qual pôde indicar dois nomes para a sucessão. Foi assim que surgiu a escolha do irmão Matthew, que se disse surpreendido pela preferência.

A comunidade decidiu, entretanto, definir melhor o modo como deve fazer-se este tipo de consulta, com vista a uma próxima transferência de ministério, uma vez que a regra diz apenas que o prior designará quem lhe vai suceder. “Nos tempos que correm, o mais adequado é possibilitar ampla participação no processo de discernimento e não se limitar a seguir o que decide o prior”, fez notar o irmão Matthew.

E quem é, afinal, o novo prior de Taizé?

Ainda que toda a sua família resida atualmente na Austrália, ele nasceu no norte de Inglaterra, numa família anglicana praticante. Um tempo marcante no seu itinerário espiritual ocorreu quando estudava na Universidade de Sheffield, ao encontrar vários colegas de confissões diferentes, que, como ele, andavam à procura de Jesus e do que ele lhes pedia. Uma ida em conjunto a Taizé levou-os a criar uma pequena comunidade, depois do regresso.

Acabaria por voltar a Taizé, como voluntario, durante um ano, e, algum tempo depois, pediu para ser recebido como irmão. A receptividade e a escuta do fundador, o irmão Roger, foi tocante, para ele. “A vida em comunidade, com a diversidade de culturas e de confissões cristãs, nem sempre é fácil e é necessário dar tempo a compreender o outro”, reconhece.

A “nova etapa” da comunidade de Taizé, que a mudança de prior também simboliza, parte da continuidade do percurso feito até agora, e de abertura aos dinamismos do presente e do futuro. “Não tenho projetos específicos; procuraremos estar presentes e ativos no nosso tempo”, diz o irmão Matthew. Depois da pandemia, os jovens voltaram em força, trazendo muito do “sofrimento do mundo” e a inquietação com o futuro; as guerras e conflitualidades em diferentes partes são um desafio à esperança de que “a violência e o ódio não terão a última palavra”.

Percebe-se, pelo que diz quer o anterior quer o atual prior, no entanto, que a Comunidade de Taizé viveu um abanão muito forte com os casos de abuso sexual que foram denunciados em anos recentes. Foi um choque, o encontro com quem teve a coragem de denunciar e com os traumas causados; e foi um profundo processo de aprendizagem o face-a-face com “os sobreviventes”, desabafou Aloïs.

Concretizando, e em resposta a uma jornalista, este sábado, Matthew exemplificou as aprendizagens feitas com a prova dos abusos: a comunidade teve de aprender a falar de questões difíceis; a lidar em novas dimensões com a autoridade; a desenvolver dinâmicas de pequenos grupos; a incorporar pessoas externas que, em alguns casos, acompanham espiritualmente membros da comunidade…

Enquanto o novo prior se manifesta aberto à possibilidade de a comunidade vir a ponderar a integração de mulheres, uma questão que tem vindo a ser posta desde há vários anos, o que acaba de deixar funções anunciou a intenção de ir viver pelo menos dois anos com a pequena comunidade de Taizé que existe há sete anos em Cuba. Pelo meio terá pelo menos uma prolongada estadia em Roma, em outubro de 2024, para participar na segunda sessão do sínodo sobre a sinodalidade, que integra a convite do Papa Francisco.

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