31 Julho 2023
Nos últimos dias, passou quase despercebida a notícia de que o prior da comunidade monástica de Taizé, o católico alemão Alois Löser, vai deixar o cargo e que designou um anglicano como seu sucessor. Assim será o britânico Andrew Thorpe, que como monge assumiu o nome de Matthew, a partir do próximo dia 3 de dezembro (primeiro domingo do Advento e do ano litúrgico) a dirigir uma das realidades mais interessantes do cristianismo contemporâneo devido à sua característica ecumênica.
A reportagem é de Giovanni Maria Vian, publicada por Domani, 30-07-2023. A tradução é de Luisa Rabolini.
A regra de Taizé, pequena aldeia no sul da Borgonha, não prevê prazos para o cargo de prior, e o irmão Alois não apresentou motivos para sua renúncia. Depois de liderar a comunidade por 18 anos, escreveu que preparou essa passagem sem ser forçado por "uma situação de urgência", revelando que consultou todos os coirmãos durante dois anos para escolher quem iria substituí-lo.
Em 2019, um dos monges de Taizé foi preso por abusos. Ao jornal católico La Croix o prior declarou que sua renúncia não está ligada àquele episódio – que causou sensação pela estima internacional desfrutada pela comunidade – mas admitiu que ouvir “pessoas vítimas de agressões sexuais e abusos espirituais cometidos por alguns irmãos marcou, nos últimos anos”, a sua função de prior e impôs uma revisão do empenho comunitário. Acrescentando que também nessa frente o seu sucessor terá de continuar no caminho que vem sendo trilhado.
Agora com 69 anos, Löser – que entrou na comunidade aos vinte anos, em 1974 – havia sido escolhido pelo fundador Roger Schutz para sucedê-lo já em 1978, mas a decisão foi comunicada a poucos, muito mais tarde, em 1998.
E somente em 2005 assumiu o cargo de prior, quando o nonagenário irmão Roger foi assassinado em 16 de agosto durante a oração da noite por uma mulher enlouquecida: um episódio chocante, que recordou o "mistério da iniquidade" mencionado na segunda carta aos Tessalonicenses.
O futuro prior, 58 anos, está na comunidade desde os vinte e um, e a passagem do católico Löser ao anglicano Thorpe, de indiscutível significado ecumênico, confirma a especificidade de Taizé.
A comunidade monástica era, de fato, inicialmente composta apenas por protestantes, mas depois acolheu anglicanos e, a partir do final da década de 1960, especialmente católicos. Os irmãos, hoje perto de uma centena pertencentes a cerca de trinta nacionalidades, são na sua grande maioria precisamente católicos e três quartos residem em Taizé, enquanto os restantes vivem em sete pequenas "fraternidades" na Ásia, África e América.
A comunidade foi fundada na minúscula e quase desabitada aldeia a poucos quilômetros de Cluny – local símbolo do monasticismo reformador medieval – por Roger Schutz.
O pastor calvinista suíço tinha vinte e cinco anos quando, no verão de 1940, chegou pela primeira vez à colina de Taizé, na França recém dominada pela Alemanha nazista. Era 20 de agosto, festa de São Bernardo, muito amado pelas tradições monásticas que atraíam o jovem protestante, e a data lhe pareceu um presságio.
Schutz, que já havia desenvolvido em sua família uma sensibilidade para as diversas correntes cristãs, passou a acolher refugiados e judeus perseguidos em uma grande casa da aldeia.
O pastor protestante planejava uma vida em comum com alguns amigos, mas esta foi iniciada dois anos depois em Genebra, devido à impossibilidade de permanecer na França. De regresso a Taizé ainda antes do fim da guerra, o jovem suíço voltou a hospedar muitas pessoas, sobretudo prisioneiros alemães e crianças órfãs.
Precisamente a vocação monástica – constituída por uma vida comunitária pontuada pela oração, pelo trabalho e pelo acolhimento de cada hóspede, identificado com Cristo – estava na origem da escolha de Schutz e dos seus amigos, todos protestantes. Em 1949, eles decidiram empenhar-se em uma comunidade, cujas características foram posteriormente delineadas na Regra de Taizé, inspirada sobretudo naquela beneditina.
Difundido na ortodoxia e no catolicismo, mas quase ausente no mundo protestante, o monaquismo havia sido retomado desde o século XIX em algumas comunidades anglicanas e luteranas, mas a escolha dos irmãos de Taizé foi arrojada – e inicialmente malvista, especialmente no mundo protestante francês – por sua orientação fortemente ecumênica e cada vez mais próxima da Igreja Católica.
Já em 1949 o irmão Roger foi recebido por Pio XII com um dos primeiros companheiros, o teólogo Max Thurian, e desde 1958 os encontros do prior com os papas se tornaram pelo menos um costume anual.
Schutz e Thurian estavam entre os observadores não católicos do Concílio Vaticano II, e naqueles anos o apartamento alugado pela comunidade no centro de Roma tornou-se um dos lugares mais frequentados por muitos bispos.
Justamente então, em 1962, o prior e alguns irmãos começaram, no mais absoluto sigilo, a visitar os países comunistas da Europa Central e Oriental, enquanto um número crescente de jovens chegava a Taizé para participar do dia dos monges, marcado três vezes por dia pela oração.
Em agosto desse ano, em Taizé – onde já não bastava mais a pequeníssima igreja românica – foi inaugurada uma moderna e austera Église de la Reconciliation em cimento, alegrada pelas cores dos pequenos vitrais de um dos monges, Éric de Saussure, e logo ampliada com toldos.
Na abertura de um “concílio de jovens” em 1974, ainda em agosto, eram quarenta mil, alojados em uma cidade de tendas inundada por chuvas torrenciais onde circulava o cardeal Willebrands, enviado por Paulo VI.
Aquela espécie de Woodstock religiosa, depois os encontros europeus no final do ano e uma "peregrinação de confiança" em vários continentes inspirou as jornadas mundiais católica da juventude e, em 1986, o próprio João Paulo II visitou Taizé. Mas é a experiência da comunidade que constituiu um laboratório original, justamente enquanto o ecumenismo marca o passo.
Na época, primeiro do protesto, depois do afastamento da fé e das derivas sectárias, Taizé não quis, de fato, constituir um movimento, mas tentou levar muitos jovens à reconciliação, nas paróquias e nas várias igrejas cristãs.
“Em Taizé, vocês têm cantos e silêncios e com isso vão em direção ao essencial”, comentou Bento XVI ao seu compatriota Löser, que perguntou a Ratzinger naquela audiência: “O que é o essencial?”. E o Papa respondeu: “Um encontro pessoal com Deus, com Cristo”.
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Taizé terá em breve um novo prior, mas a Woodstock religiosa não mudará - Instituto Humanitas Unisinos - IHU