04 Agosto 2023
Hoje, em El Salvador são poucos os que negam a efetividade das políticas de segurança contra as gangues; entretanto, são muitos também os que falam sobre os custos destas.
A reportagem é de Luis Beatón, publicada por Prensa Latina, 03-08-2023.
O tema não desaparece da realidade que os salvadorenhos enfrentam no cotidiano e na sua interação obrigatória com a política local, a economia e, mais recentemente, com o castigo aos infratores que transformaram o crime em um negócio.
Nos últimos dias, tanto o arcebispo de San Salvador, dom José Escobar Alas, quanto o cardeal Gregorio Rosa Chávez, emitiram comentários que convidam à reflexão em um país onde a Igreja sempre teve um papel importante na vida da população.
Rosa Chávez abordou aspectos fundamentais da situação, previamente mencionados por Escobar Alas, o que representa uma coincidência nos pronunciamentos que se aproximam de um chamado à reflexão.
Durante suas declarações à imprensa, o único cardeal salvadorenho foi incisivo ao afirmar que "existe uma forte crise de liderança no país" e "um clima de terror e medo que impede que pessoas valiosas contribuam". Segundo ele, "é necessário vencer o medo, acreditar no ser humano, que é capaz do melhor".
O líder católico abordou a situação dos três poderes no país (Executivo, Legislativo e Judiciário) e afirmou que não há um contrapeso entre eles. "Quem controla quem?", perguntou. "Ninguém. Isso é fundamental, extremamente grave", afirmou, em resposta a uma pergunta sobre a habilitação da reeleição presidencial imediata.
Nessa linha de análise, um dia antes, Escobar, citado pelo jornal El Mundo, qualificou pela primeira vez como "evidente" que seis artigos da Constituição da República proíbem de maneira absoluta a reeleição presidencial imediata e que a Sala Constitucional se pronunciou a favor, interpretando o artigo 152 da Carta Magna.
O cardeal abordou um assunto que gerou polêmica em círculos políticos e críticos ao governo: os decretos aprovados pela Assembleia Legislativa para processar as pessoas detidas sob o regime de exceção instaurado em El Salvador desde 27-03-2022.
Segundo sua opinião, a norma não permite um devido processo legal nem "a presunção de inocência, dois pilares da democracia", a que respondeu à pergunta sobre se os decretos adotados garantirão justiça.
Diante do aprovado para processar os cerca de 72 mil supostos membros de gangues e colaboradores capturados, o prelado concordou com o arcebispo Escobar, que exigiu a pronta liberdade para os inocentes e "um tratamento digno" para os culpados, a quem considera que devem cumprir a lei.
Ao analisar as reformas, o líder religioso concordou com os juristas e apontou que "esta lei não permite um devido processo legal", que é um direito de cada salvadorenho.
Esse assunto é o centro do debate em meios nacionais e internacionais. Assim, o jornal La Prensa Gráfica publicou opiniões do Escritório em Washington para Assuntos Latino-americanos (Wola), que considera que os julgamentos coletivos colocam em dúvida a capacidade do governo de punir crimes e refletem a insustentabilidade do regime de exceção.
A organização, com sede nos Estados Unidos e reconhecida como líder em pesquisa e incidência na promoção dos direitos humanos nas Américas a partir de uma perspectiva objetiva para alguns, estima que as reformas aprovadas ameaçam o direito à justiça, à defesa e ao devido processo legal adequado.
As novidades indicam que os supostos membros de gangues detidos sob o regime serão processados em grupos, e não de forma individual, o que gera perguntas sobre quantos inocentes cumprirão penas na prisão por crimes que não cometeram.
Alguns especialistas e observadores opinam que isso mostra os caminhos tortuosos que a justiça enfrenta em El Salvador, onde a falta de equilíbrio e contrapeso entre os poderes do Estado avança em direção a uma crise perigosa.
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El Salvador e a aplicação da justiça - Instituto Humanitas Unisinos - IHU