19 Junho 2023
Segundo Elisabeth Grinberg, entre os motivos estão a falta de capacitação dos gestores municipais e recursos. Ela diz que problema está associado a lacunas na política de resíduos, consumo e a questões econômicas.
A reportagem foi publicada por Rede Brasil Atual, 18-06-2023.
Mais uma vez, o Brasil não vai conseguir cumprir sua meta de acabar com os lixões e aterros, agora prevista para o ano que vem. Ou seja, esses depósitos de lixo em todo o país, muitos ainda a céu aberto, continuarão recebendo resíduos e causando uma série de problemas ambientais e de saúde. O alerta foi feito pela socióloga Elisabeth Grinberg em entrevista a Silvio Caccia Bava, do Le Monde Diplomatique Brasil, em programa transmitido pela TVT nesta terça-feira (13).
Pela política nacional de resíduos sólidos, aprovada em 2010, no final do segundo governo do presidente Lula (PT), o prazo era até 2014. Mas sem conseguirem cumprir, os municípios tiveram prazo estendido, que acabou em 2022. E novamente foi ampliado para 2024.
Segundo a especialista com atuação no Instituto Polis e Aliança Resíduo Zero Brasil, são muitas as razões para uma nova protelação. Entre elas, a falta de capacitação dos gestores municipais e de recursos. Mas esse problema complexo, acredita, está associado também a lacunas na própria política de resíduos, a padrões de consumo e a questões econômicas que envolvem a indústria e seu compromisso unicamente com o lucro.
A indústria, seus lucros e os lixões
A logística reversa, por exemplo, só existe no papel. Criada pela política de resíduos sólidos, determina a responsabilidade das empresas pelas embalagens e resíduos sólidos que colocam no ambiente por meio de seus produtos. Mas ao mesmo tempo, define que deverá ser cumprida também por outros atores, como comerciantes, já que trata-se de uma política de responsabilidade compartilhada. “Mas há muita pressão das empresas. E os acordos setoriais são frouxos”, disse Elisabeth, referindo-se ao fato de existir tantos resíduos pelas ruas e praças, que poderiam ter sido recolhidos no âmbito dessa determinação.
Para ela, o próprio nome também já é um erro. “Na Europa isso se chama responsabilidade estendida do vendedor. Aliás, lá as empresas implementam políticas nesse sentido. E as mesmas, aqui, não adotam”. É o caso de empresas do ramo de bebidas, como a Coca Cola, e também de alimentos e embalagens, entre outras. “A preocupação aqui é só com o lucro, não com o ambiente”.
A especialista destacou ainda diversos mitos ambientais envolvendo a questão dos resíduos. A questão do plástico, por exemplo, embora haja avanços na legislação para reduzir. Ela lembrou que nem todo plástico que vai para a reciclagem é reciclado e acaba virando rejeito do processo de reciclagem. E mesmo que seja reciclado, não se trata de um problema resolvido.
Reciclagem gera muitos rejeitos. Melhor reutilizar
“A reciclagem envolve processo industrial, que requer uso de água e de matérias primas. É o caso também das latinhas de alumínio. Recicladas, precisam de mais matéria prima, água e energia para voltarem a ser usadas. Mesmo caso do vidro”, disse. Por isso, segundo ela, o reuso é um dos pilares da política de resíduos sólidos. “O vidro precisa ser reutilizado mais de 30 vezes”.
Para ela, a saída, nada fácil, está em legislações mais severas para as indústrias, e educação da sociedade para mudança de comportamento. Inclusive em relação aos fabricantes, boicotando produtos e marcas. “Precisamos engrossar as fileiras do resíduo zero”, destacou.
Eis a íntegra de entrevista.
Leia mais
- Dia Nacional de Luta dos Catadores de Materiais Recicláveis
- Geramos mais lixo e reciclamos menos porque os lixões são um grande negócio. Entrevista com Alex Cardoso
- A era do lixo. Revista IHU On-Line, N°. 410
- Catadores, uma profissão desvalorizada pela sociedade
- A construção da sustentabilidade ambiental. Catadores de materiais recicláveis como sujeitos de direitos
- Observatório da UnB elabora cartilha para catadores e catadoras
- Porto Alegre. ‘‘Essa lei é a lei da fome’’: catadores se mobilizam contra proibição de carrinhos
- Política Nacional de Resíduos Sólidos e a profissionalização dos catadores. Entrevista Especial com Antonio Cechin
- Reciclagem de resíduos sólidos: a propaganda é bonita, mas o processo explora os catadores. Entrevista especial com Alex Cardoso
- Lixões são mais uma fonte de perigo para os catadores durante a pandemia. Entrevista especial com Ednilson Viana
- Política Nacional de Resíduos Sólidos: “faltou cobrança rigorosa de cumprimento das regras”. Entrevista especial com Ednilson Viana
- As prefeituras precisam oferecer condições para os catadores trabalharem nas cooperativas. Entrevista especial com Alex Cardoso
- Ações para a gestão eficiente dos resíduos sólidos nos municípios
- Lei ameaça deixar 6 mil catadores de lixo reciclável sem trabalho em Porto Alegre
- Catadores de materiais recicláveis exigem ser ouvidos sobre lei que proíbe circulação de carrinhos
- Um círculo virtuoso: a integração de catadores na gestão de resíduos sólidos
- A ecologia política das/os catadoras/es de material
- "O resíduo se renova, enquanto o catador se desgasta". Cargas de trabalho e desgaste da saúde física e mental. Entrevista especial com Tanyse Galon
- Inclusão dos catadores na PNRS é dramática. Entrevista especial com Roque Spies
- Políticas públicas para cidadãos em situação de rua são um castelo de areia. Entrevista especial com Igor Rodrigues
- Uber, entregador, ambulante, diarista: nasce o Movimento dos Trabalhadores Sem Direitos
- Reciclagem: índice nacional é de apenas 3%; Estudo revela que mais de 3 mil cidades ainda destinam resíduos para lixões
- Brasil gera 79 milhões de toneladas de resíduos sólidos por ano
FECHAR
Comunicar erro.
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Brasil não vai cumprir meta de acabar com os lixões em 2024, alerta especialista - Instituto Humanitas Unisinos - IHU