Ucrânia/Pandemia. Paixão e morte da realidade e da verdade? Curso ministrado pelo Prof. Dr. Rafael Bayce, da Universidad de la República, Uruguai

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Por: Rafael Bayce e Lucas Henrique da Luz | 19 Mai 2023

Tanto a pandemia de Covid-19 quanto a guerra na Ucrânia desafiam a sustentabilidade das vidas na Terra e os fundamentos do nosso ser em comum. As diferentes formas de repercussão e produção de verdades que emergem desses dois acontecimentos históricos complexificam ainda mais este cenário. Ou seja, em sendo, talvez, os dois assuntos mundiais mais atrativos e interessantes dos últimos três anos, a pandemia de Covid 19 e o conflito bélico na Ucrânia sofrem as mais diferentes abordagens, inclusive na linha da espetacularização.

Portanto, como "espetaculares fatos jornalísticos", eles deveriam ser melhor apreendidos como fenômenos historicamente profundos e ancorados em abordagens multidisciplinares. Uma perspectiva especialmente ilustrativa seria a de interpretar as coberturas jornalísticas desses eventos como momentos de aceleração no processo contemporâneo de "paixão e morte da realidade e da verdade", de acordo com as ideias de "realidade" e de "verdade" consideradas válidas pela opinião pública e o senso comum, que podem ser filosoficamente discutíveis.

No processo comunicacional entre sujeitos emissores jornalísticos e receptores comuns, acontece uma transformação das ocorrências da realidade, através do registro de fatos, da seleção dos noticiáveis, da edição, da eleição de um modo sintático e pragmático de narração, e da instalação de um discurso semântico (moral-político) sobre a narração.

Nesse decurso, a progressiva voracidade comercial da mídia e a sua cooptação político-ideológica pelas elites econômicas acaba por corroer séria e crescentemente a informação sobre a realidade e o fornecimento de ideias variadas para que o público forme suas próprias decisões, forjando as suas "verdades". Nada mais falso e desorientador a respeito do mundo que as frases que a mídia reitera hipnoticamente: "Nós só comunicamos os fatos, tais como eles são (narração-realidade), para que você possa fazer as suas próprias decisões (discurso-verdade)".

É dentro deste contexto que os Programas de Pós-Graduação em Educação e em Ciências Sociais da Unisinos, em parceria com o Instituto Humanitas Unisinos – IHU, promovem o curso Ucrânia/Pandemia. Paixão e morte da realidade e da verdade?

Ucrânia/Pandemia. Paixão e morte da realidade e da verdade?

O curso abordará como, nas diversas fases desse processo comunicacional, vão sendo perseguidas, torturadas e conduzidas a morte da realidade e da verdade, supostamente desejadas pelos receptores. Discutir-se-á essa suposição, especialmente, no caso dos millenials. Isso será realizado a partir de ilustrações das versões construídas pela mídia acerca dos mencionados fenômenos contemporâneos.

Buscar-se-á uma nova leitura interdisciplinar de ambos: a sua contribuição ao fim da realidade e da verdade na comunicação de massa. Desde 1895, Gustave Le Bon dizia que "as alucinações coletivas" são parte fundamental nas crenças de massa. Jean Baudrillard, cem anos depois, em 1995, afirmava que se tinha cometido "o crime perfeito": "o assassinato da realidade". Neste sentido, o curso busca compreender como se conformam relatos e discursos que mudam a ordem natural da construção da informação, e como fabrica-se a sua lucrativa desmesura. Além disso, tratar-se-á como esses melodramas contam hoje os relatos formativos da massa (David Riesman, J. Martín-Barbero) e por que se torna cada vez mais difícil fugir dessas ficções, mais do que reais, ‘hiper-reais’ (Jean Baudrillard). Ficções que alteram a "nossa pele social" (Elisabeth Noelle-Neumann) e que quase não podemos rejeitar sem sofrer incomodas dissonâncias cognitiva e emocional (Leon Festinger).

Programação

O curso Ucrânia/Pandemia. Paixão e morte da realidade e da verdade?, ministrado pelo Prof. Dr. Rafael Bayce, da Universidad de la República, Uruguai, será realizado entre 29-05-2023 e 02-06-2023, presencialmente na Sala Ignácio Ellacuría e Companheiros, no Instituto Humanitas Unisinos – IHU.

As aulas serão transmitidas on-line através da página eletrônica do IHU, do Canal do IHU no YouTube, pelas redes sociais e pela Plataforma Teams, das 14h às 16h.

Prof. Dr. Rafael Bayce

O curso está organizado em cinco módulos e pode ser cursado integralmente ou em partes, e também é oferecido como atividade de extensão via IHU, gratuitamente. As inscrições podem ser feitas aqui. A programação está disponível abaixo.

Programa

Módulo 1. Uma história do processo comunicacional midiático:
A. Papel e funções sociais clássicas da imprensa.
B. A direção da idealidade do processo comunicacional clássico: realidade, fatos, notícias, narrativa, discurso.
C. A perversão comercial e política desse processo.
D. A reversão da direção prioritária e da idealidade no processo comunicacional clássico: discurso, narrativa, notícias, fatos, realidade.
E. Paixão e morte das idealidades e prioridades clássicas de realidade e verdade nessa perversa reversão.
F. A ascendência da imprensa na informação e formação das opiniões públicas.
G. Jornalistas: de informadores a vendedores e operadores políticos.
H. A complementariedade da hegemonia comunicacional e da dominação bélica.
I. Uma alternativa até complementar: as "dita-duras" e as "dita-macías" ou "dita-brandas".
J. A pandemia de Covid-19 e o conflito na Ucrânia como exemplos e aceleradores desses processos.

Módulo 2. Paixão e morte aceleradas: a pandemia hiper-real:
A. Uma pandemia político-comunicacionalmente instalada com escusa sanitária e fins econômico-políticos.
B. A construção social da desmesura e do medo.
C. O caso mais estudado: a paranoia da insegurança.
D. O caso mais recente: a hipocondria da saúde (Covid-19).
E. A hiper-realidade converte-se em mais acreditada do que a realidade fatual.
F. A retórica da construção pandémica: magnificação quantitativa + dramatização qualitativa + saturação sensorial + obturação de alternativas + corte arbitrário da narrativa.

Módulo 3. Paixão e morte aceleradas: a novela ucraniana:
A. A retórica narrativa: melodrama de aventuras serial, adrenalínico, lacrimogénico, dramatúrgico, taumatúrgico.
B. Mais retórica: reiteração acumulativa + redundância convergente + recorte narrativo que oculta e retrodiz.
C. A necessidade social de identificação e projeção vicárias.
D. Mudança na ênfase da retórica comunicacional: da persuasão cognitiva à sedução emocional.
E. Medos e más notícias: a funcionalidade político-econômico-cultural e a cumulatividade da paranoia da insegurança e da hipocondria da saúde.

Módulo 4. Crenças pararreligiosas civis com álibi científico:
A. A fraqueza da ciência politicamente seguida nos diagnósticos e terapias.
B. A mínima interdisciplina utilizada neles.
C. Porém, a sofisticação da retórica na manipulação comunicacional das massas.
D. A retórica pararreligiosa imposta, dogmática e inquisitorial, anticientífica.
E. Fake News, pós-verdade, plataformas, redes sociais e legislação.

Módulo 5. O futuro da realidade e da verdade sociomidiáticas:
A. Será a mesma a desejabilidade dessa realidade e verdade para os millenials?
B. Medos, instantaneidade e irreversibilidade progressivas da opinião pública global atual.
C. Como identificar, hoje, o real e as fontes de construção de opiniões e verdades autonomamente conformáveis, se ainda fossem alvos desejáveis?
D. Geopolítica, pandemias e catástrofes no futuro humano: o medo paranoico e hipocondríaco como instrumento econômico, político e cultural comunicacionalmente construído.
E. Um excurses a respeito da medicina na história e o seu impacto no cotidiano cultural e civilizatório.

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