15 Março 2023
Mensagem do Papa aos participantes do II Congresso Latino-Americano sobre o tema "Cuidar, informar e comunicar: elementos-chave para uma gestão eficaz dos casos de abuso sexual", em curso em Assunção, Paraguai: as violências e seu acobertamento por bispos e superiores "deixaram uma ferida indelével" em muitas pessoas. Em breve um relatório da Pontifícia Comissão para a Proteção dos Menores: o presidente, cardeal O'Malley, abriu os trabalhos.
A reportagem é de Alessandro Di Bussolo, publicada por Vatican News, 14-03-2023. A tradução é de Luisa Rabolini.
Um congresso que é "mais uma expressão do desejo de mudança da nossa Igreja", no qual "o abuso sexual por parte do clero e o seu acobertamento por parte de bispos e superiores religiosos deixou uma ferida indelével" pelo "mal causado a tantas pessoas”. E um congresso que é também “uma expressão do processo sinodal de encontro, escuta, reflexão e ajuda recíproca para tentar concretizar e mensurar o nosso empenho de prevenir os abusos na nossa Igreja”. Assim o Papa Francisco define, na mensagem enviada aos participantes, o segundo Congresso Latino-Americano sobre a prevenção dos abusos, sobre o tema "Cuidar, informar e comunicar: elementos-chave para uma gestão eficaz dos casos de abuso sexual", em curso em Assunção, Paraguai, de 14 a 16 de março.
O Papa ressalta que "os líderes da Igreja têm feito muito para enfrentar este mal e para evitar que se repita" e encoraja a organização de outros eventos como esse congresso, mas, acrescenta, "devemos ter condições de ver os resultados, que os menores estão mais seguros em nossa Igreja”. Por isso, recorda ter pedido à Pontifícia Comissão para a Proteção dos Menores “monitorar e verificar a adequação das políticas e práticas adequadas em toda a Igreja e elaborar um Relatório indicando as melhorias ainda necessárias”.
Em seguida, Francisco felicitou pela inauguração em Assunção do novo Centro de Estudos sobre a Dignidade Humana e a Prevenção dos Abusos, "que será um ponto focal nacional dedicado a tal finalidade" e os "apóstolos da prevenção", reunidos nestes dias em torno do Cardeal Adalberto Martinez, arcebispo de Assunção, dos vários países da América Latina e da Europa, dizendo que “o vosso trabalho pela proteção dos mais vulneráveis é urgente e essencial”.
Em sua mensagem, o Pontífice destaca a importância dos avanços dessa obra de proteção no plano das Igrejas locais. O trabalho "de estabelecer procedimentos claros para a proteção de pessoas vulneráveis na Igreja deve tornar-se parte integrante do trabalho e uma prioridade em cada Igreja local", com o apoio da Cúria Romana. Ele recorda ter pedido à Pontifícia Comissão para a Proteção dos Menores que supervisionasse a correta aplicação do motu próprio Vos estis lux mundi, (com as normas procedurais de combate aos abusos sexuais na Igreja, publicadas em maio de 2019), “para que as pessoas abusadas tenham meios claros e acessíveis de buscar justiça”. Aquelas Igrejas locais “nas quais os esforços para promover medidas preventivas adequadas ainda estão nas fases iniciais devido à falta de recursos, precisam de uma atenção particular”. De fato, segundo o Papa Francisco, não se deve permitir que “as cruéis desigualdades que afetam as nossas sociedades também afetem a nossa Igreja”.
Finalmente, o Papa recorda a cúpula realizada há quatro anos, em fevereiro, no Vaticano, de bispos e superiores religiosos de todo o mundo com membros da Cúria Romana "para enfrentar o problema tangível da má gestão dos abusos sexuais de menores por parte da hierarquia da Igreja". E reitera que “quem minimiza o impacto dessa história ou minimiza o perigo atual desonra aqueles que tanto sofreram e engana aqueles a quem diz servir”. O abuso sexual por qualquer pessoa na Igreja, onde quer que tenha ocorrido, continua Francisco, “é um perigo claro e presente para o bem-estar do povo de Deus e sua má gestão continuará a degradar o Evangelho do Senhor aos olhos de todos”. E confia à intercessão de Nossa Senhora da Assunção, padroeira do Paraguai, os esforços de "todos aqueles que estão empenhados nesse trabalho necessário, mas doloroso, do ministério da Igreja".
Os trabalhos do congresso foram abertos com a palestra do cardeal Sean Patrick O'Malley, arcebispo de Boston e presidente da Pontifícia Comissão para a Proteção de Menores, sobre o tema "Resposta institucional da Igreja às vítimas de abuso". O cardeal destacou que “a luta contra os abusos na Igreja é um esforço progressivo que foi iniciado há quase quarenta anos”, um caminho de longo prazo que exige "uma compreensão cada vez mais profunda dessa dolorosa realidade". Mas não se podem entender “as ações decisivas empreendidas por Francisco sem conhecer o caminho percorrido por seus predecessores”.
Assim o Cardeal O'Malley relembrou o que os Papas fizeram desde agosto de 1993, quando João Paulo II falou publicamente, pela primeira vez, sobre a praga dos abusos sexuais sobre menores por sacerdotes em Denver, nos Estados Unidos, durante a Jornada Mundial da Juventude. Passando pela adoção do princípio da “tolerância zero” de Bento XVI para a aproximação e acolhimento das vítimas. Ele lembrou o reconhecimento de uma gestão negligente dos casos de abuso por parte da hierarquia, a definição de diretrizes nas dioceses para a ação contra os abusos e a prevenção e a progressiva prioridade para a atenção às vítimas em relação à defesa da reputação da Igreja.
Atos concretos e fortes durante o pontificado de Francisco foram a criação da Pontifícia Comissão para a Proteção dos Menores, em 2014, a cúpula no Vaticano para a proteção dos menores, em 2019, a abolição do segredo pontifício em casos de abuso de menores e, finalmente, em julho de 2020, o vade-mécum sobre alguns pontos de procedimento no tratamento de casos de abuso sexual de menores cometidos por clérigos, publicado pela Congregação para a Doutrina da Fé.
Na Igreja, esclareceu O'Malley, "há vítimas e agressores, encobrimentos e descobridores, traumas e curas". Há "sinais de pecado profundo, de crime e de culpa, de doenças que colocam em perigo a vida e de evidentes fracassos humanos e institucionais", mas ao mesmo tempo "há pessoas que reconhecem a culpa e trabalham por uma mudança fundamental”. Destacar apenas um desses dois polos, para o cardeal estadunidense, “é perigoso, pouco saudável e pouco objetivo”.
A prevenção dos abusos, também na Igreja na América Latina, prosseguiu o presidente da Pontifícia Comissão para a Proteção dos Menores, “deve ser incorporada à cultura mais ampla do cuidado e do bom tratamento, que deve desafiar a forma como nos relacionamos uns com os outros, como formamos a comunidade e como vivemos verdadeiramente a sinodalidade". Uma das principais prioridades da Comissão é, sem dúvida, a atenção às vítimas, "para a qual estamos desenvolvendo um programa a ser implementado em nível nacional, para ajudar as Igrejas locais no campo da formação, na criação de centros de escuta de vítimas e na formação de operadoras que oferecem seus serviços dentro das diversas dioceses do mundo”.
Sem dúvida, concluiu, no pontificado de Francisco, “a visibilidade do problema foi maior do que nunca e a Igreja está começando a atingir um ponto de consciência suficiente para agir com decisão contra esse crime”. Segundo O'Malley, o Papa tem demonstrado a sua vontade de combater essa praga, "abrindo processos mais humanos e justos e lutando contra todo tipo de obstáculo, incluindo os acobertamentos, que tornam a justiça inatingível para as vítimas". Da mesma forma, “Francisco está ciente de que ainda há muito a fazer, mas está disposto a colocar os recursos necessários para enfrentar esse crime”.
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Francisco pede que as vítimas tenham vias claras para buscar a justiça - Instituto Humanitas Unisinos - IHU