20 Janeiro 2023
Jornalista polonês explica o que está por trás do descontentamento com a Igreja na outrora ferozmente católica pátria de São João Paulo II.
A entrevista é de Simon Avon, publicada por La Croix International, 18-01-2023.
A Polônia costumava ser considerada o país católico mais convicto da Europa. Mas nos últimos dois anos perdeu quase 10% de seus membros. Marcin Przeciszewski, editor-chefe da agência de notícias KAI, de propriedade dos bispos poloneses, diz que o declínio na participação da Igreja se deve principalmente à pandemia de coronavírus. Mas ele admite que o escândalo de abuso sexual do clero, que atingiu duramente a terra natal de São João Paulo II nos últimos anos, também acelerou o descontentamento com a Igreja Católica.
Enquanto o Instituto de Estatísticas da Igreja Católica na Polônia registrou um declínio relativamente constante na prática religiosa dos católicos nos últimos 20 anos, estes últimos dois anos foram marcados por uma queda muito mais brutal, segundo as últimas estudo divulgado em 13 de janeiro. Como você explica isso?
De referir desde já que este estudo foi realizado em setembro de 2021. Nessa altura, as igrejas ainda estavam sujeitas a constrangimento legal uma vez que só podiam estar meio cheias, como todos os outros locais públicos. Então, esse é o principal motivo, na minha opinião. No auge da pandemia, as igrejas ficaram fechadas por seis meses. Assim, muitos poloneses compareceram aos cultos à distância ou não compareceram. Perderam o hábito de ir à missa. O alto nível da prática religiosa na Polônia antes da pandemia se devia a um catolicismo que não era uma escolha pessoal, mas sim uma herança cultural. Então a pandemia, de certa forma, tirou essas pessoas do catolicismo, e só ficaram aqueles que fizeram disso uma escolha pessoal. Nesse sentido, nos encontramos em um momento histórico para o catolicismo na Polônia.
A proximidade da Igreja Católica com o governo conservador também influenciou nessa desafeição?
A população polonesa é geralmente dividida em duas. Metade se identifica com o governo conservador. E a outra metade está na oposição e em uma linha muito mais liberal. Existe um estereótipo na Polônia, amplamente divulgado na mídia, de que a Igreja polonesa é afiliada a esse poder político – o que não é necessariamente verdade. Mas por causa disso, as pessoas que se opõem ao poder político tendem a rejeitar a Igreja Católica, a se distanciar dela. Este estereótipo é, portanto, muito destrutivo para a fé dos poloneses, que basicamente se perguntam: "Posso pertencer a uma Igreja que não corresponde às minhas ideias políticas?"
Até que ponto o crédito moral dado à Igreja polonesa, graças à sua luta contra o comunismo até a queda do bloco oriental, foi corroído, especialmente com os recentes casos de abuso sexual?
Esse certamente é o terceiro fator que explica a queda na prática, junto com a pandemia e a questão política. Desde o século 19, a Igreja Católica na Polônia tem autoridade moral em toda a sociedade, tanto aos olhos dos crentes mais fervorosos quanto aos ateus. Mas na última década, essa autoridade foi questionada. Em primeiro lugar, há as mudanças sociais globais e o processo de secularização ocidental no qual a Polônia também está envolvida. Esse fenômeno, embora não seja tão forte quanto em seus vizinhos europeus, tem se acelerado nos últimos tempos. E especialmente com os casos de abuso e o fato de alguns bispos terem escondido esses casos. Por causa disso, a Igreja não tem mais a autoridade que já teve na Polônia, mesmo que ainda a tenha para uma parte da população.
Diante desse desafeto, qual é a reação da Igreja polonesa hoje?
A Igreja polonesa não empreendeu uma resposta abrangente. São principalmente programas e iniciativas provenientes da base, para quem a nova evangelização parece ser de primeira importância. É o caso, por exemplo, da comunidade Chemin-Neuf, que é muito ativa. Mas esse tipo de iniciativa ainda é muito pequeno. É necessária uma reflexão muito mais ampla a nível da conferência episcopal. Deve refletir sobre o que deve ser mudado, como reformar a Igreja na Polônia.