12 Janeiro 2023
"Censura-se a teologia arcaica e patriarcal que, a seu ver, sustenta a posição papal, o inaceitável arquétipo da Igreja-esposa e padre-esposo e a contradição com relação à vontade conciliar de remover toda discriminação face os direitos fundamentais de igualdade. Faltaria a Francisco a vontade de ler os sinais dos tempos", escreve Lorenzo Prezzi, teólogo italiano e padre dehoniano, em artigo publicado por Settimana News, 11-01-2023. A tradução é de Luisa Rabolini.
No dia 5 de janeiro, três bispos suíços (de Chur, St. Gallen e Basel) escreveram uma carta para pedir aos padres e agentes pastorais o atendimento às normas litúrgicas e, em particular, salvaguardar o papel do padre ordenado na celebração da Eucaristia, na confissão e na unção dos enfermos.
A carta do Mons. Joseph Bonnemain, Markus Büchel, Felix Gmür responde a dois casos recentes: a "concelebração" eucarística de Monika Schmid por ocasião da conclusão de seu serviço pastoral em Effretikon (agosto de 2022) e o testemunho da teóloga Charlotte Küng-Bless de ter administrado a unção dos enfermos segundo um rito muito próximo do sacramento.
A intenção e o tom da carta não são formais ou agressivos. Há um esforço para combinar a norma com a compreensão. Falando aos padres e aos agentes pastorais, ressaltaram o difícil equilíbrio entre a fé pessoal e as fragilidades e escândalos da Igreja, assim como entre a cultura do ambiente secular com a pertença confessional.
Também estimulados pelo processo sinodal, pela necessidade de caminhar juntos, os párocos frisam a necessidade de formas e regras comuns. “Os fiéis têm direito a uma celebração que segue as normas e as formas da Igreja. A liturgia renovada, uniforme em seus elementos básicos, é um tesouro de nossa Igreja”.
“Vocês sabem que só o sacerdote preside validamente a Eucaristia, administra a reconciliação sacramental e a unção dos enfermos. Por isso mesmo é consagrado. Esta regra de fé católica romana também deve ser totalmente respeitada em nossas dioceses". Não se trata de obediência cega ou clericalismo patriarcal, mas da convergência de toda a tradição eclesial sobre o fato de que o celebrante deve ser ordenado.
“Também os textos litúrgicos não são arbitrários, porque não são nossa propriedade, mas pertencem a toda a comunidade dos crentes”. A liturgia permite muitos âmbitos de participação direta (cantos, reflexões, sermões, meditação, silêncio, etc.) e não deveria ser transformada em "um campo experimental de projetos pessoais".
O liturgista vienense Hans-Jürgen Feulner havia denunciado a gravidade dos gestos realizados, invocando uma intervenção canônica dos bispos. Mais numerosas, pelo menos no debate público, são as vozes críticas à carta dos bispos. A presidente do conselho sinodal de Zurique disse: "Eu nem sei quem pode levar a sério a repreensão dos bispos", assumindo que o texto é uma resposta mais para Roma do que para as comunidades locais.
Também a protestante Rita Famos retomou a necessidade de ordenação do celebrante, porém ressaltando que as Igrejas Reformadas e veterocatólicas ordenam as mulheres. As interessadas não desmentem as escolhas feitas, mas apresentam os fatos de forma diferente. A unção foi realizada segundo o rito católico, mas justificada pela impossibilidade de recorrer ao pároco.
Por seu lado, Monika Schmid não negou “celebrar a comunhão no sentido bíblico. Mas se tivessem me perguntado ‘você celebra uma Eucaristia Católica Romana?’, eu teria dito não. Nunca foi minha preocupação provocar com uma liturgia eclesial. A celebração é terra sagrada. A minha preocupação era e é celebrar o mistério profundo de Cristo junto com as pessoas: tornar-se um só com Cristo no amor”.
Palavras que recordam as de Ludmila Javorovà, ordenada durante o regime comunista da Checoslováquia a 28 de dezembro de 1970: “Se pensar agora, sei que dentro de mim sentia uma segurança que era e é tão profunda que se a tivesse rejeitada, algo de meu próprio ser se teria perdido” (SettimanaNews).
Muito mais descontraída e afiada a carta aberta de 19 mulheres (bispas, sacerdotisas e diaconisas) que apareceu em 9 de janeiro na revista canadense LeSoleil. Na carta se critica abertamente a posição negativa sobre a ordenação sacerdotal feminina do Papa Francisco repetida na entrevista publicada na revista América.
Censura-se a teologia arcaica e patriarcal que, a seu ver, sustenta a posição papal, o inaceitável arquétipo da Igreja-esposa e padre-esposo e a contradição com relação à vontade conciliar de remover toda discriminação face os direitos fundamentais de igualdade. Faltaria a Francisco a vontade de ler os sinais dos tempos. Afirmam ter sido validamente ordenadas na sucessão apostólica e vivenciar uma experiência viva e vivificante nas comunidades a que pertencem. Das signatárias, 12 são estadunidenses, 2 canadenses, 2 alemãs e uma da África do Sul.
Três dela pertencem às sete mulheres ordenadas em um barco no Danúbio em junho de 2002 (ver SettimanaNews) por um bispo argentino muito controverso e de validade duvidosa, Romulo Braschi. Estima-se que existam cerca de 300 mulheres padre no mundo. Elas estão além dos limites assinalados pela declaração Inter insigniores (1976) e pela carta apostólica Ordinatio sacerdotalis (1994).
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Eucaristia e mulheres: experiências e tensões. Artigo de Lorenzo Prezzi - Instituto Humanitas Unisinos - IHU