02 Dezembro 2022
O Vaticano sofreu maciças "tentativas anômalas de acesso" ao seu site 24 horas após um confronto verbal sem precedentes com a Rússia. Os problemas com a rede informática começaram no final da manhã de ontem, intensificaram-se à tarde, quando muitos dos sites do Estado Pontifício saíram do ar, desde os dicastérios aos Museus do Vaticano, e à noite o portal oficial ainda estava inacessível. A ideia de que o problema fosse uma "atividade de manutenção da rede" rapidamente deu lugar a um entendimento mais realista: "Estão em curso verificações técnicas - anunciou a sala de imprensa ao final da tarde - devido a tentativas anormais de acesso ao site".
A reportagem é de Iacopo Scaramuzzi, publicada por La Repubblica, 01-12-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
As tentativas de derrubar um sistema bem protegido devem ter sido robustas. Desde as primeiras reconstruções, as invasões teriam ocorrido de vários países e a hipótese de que um único ator esteja por trás disso, escondido no emaranhado do ciberespaço, deve ser verificada com investigações tecnicamente complexas que levarão tempo. A menos que em algum momento chegue uma reivindicação.
No Vaticano, atém-se aos fatos: evitam falar de um "ataque hacker", especialmente porque houve um período semelhante no verão passado. E não apontam o dedo contra ninguém: não se quer alimentar um incidente diplomático começando a partir de ilações. Mas o motivo político não pode ser excluído (e o embaixador ucraniano na Santa Sé, Andriy Yurash, aponta o dedo para a Rússia). Em 2020 - informa a empresa estadunidense Recorded Future - alguns hackers chineses invadiram o sistema informático do Vaticano com um malware. O objetivo teria sido buscar informações na Secretaria de Estado enquanto estavam em andamento os contatos entre Roma e Pequim para a renovação do acordo sobre a nomeação dos bispos. Acusações que um porta-voz do governo chinês rejeitou posteriormente.
Agora, o bloqueio cibernético ocorre imediatamente após uma escalada verbal da Rússia.
Em declarações à revista jesuíta estadunidense America, Jorge Mario Bergoglio voltou a falar da guerra na Ucrânia três dias atrás. Há meses, diante da surdez do Kremlin e dos massacres nas cidades ucranianas, Francisco deu uma curvatura mais severa às suas palavras. Agora ele foi particularmente claro: "O invasor é o estado russo, isso está muito claro." E se nos últimos meses, numa tentativa de não culpar o povo russo, apontou o dedo contra os "mercenários", dessa vez detalhou: "Os mais cruéis talvez sejam os russos, mas não de tradição russa, como chechenos e buriates e assim por diante”. Uma ressalva rejeitada por um coro de críticas da Rússia.
"Expressei indignação com tais insinuações e enfatizei que nada pode minar a coesão e a unidade do povo multinacional russo", disse o embaixador junto à Santa Sé, Alexander Avdeev. "Isso não é mais russofobia, mas uma perversão", comentou a porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, Maria Zakharova. E também o líder checheno Ramzan Kadyrov atacou as palavras do Papa: “É vergonhoso que uma personalidade religiosa famosa em todo o mundo não conheça a atitude dos muçulmanos em relação ao inimigo”.
E pensar que na véspera o porta-voz do Kremlin tinha relançado a ideia de uma mediação vaticana, acusando a Ucrânia de não querer a paz. Não um empenho claro e formal para a negociação, mas uma declaração extemporânea. Um jogo de espelhos diplomático que há tempos não convence a diplomacia vaticana. O Papa Francisco quer a paz, mas não à custa de silenciar a denúncia de uma guerra "repugnante, sacrílega e desumana". Ciente de que alguém pode ficar nervoso.
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Ciberataque contra Francisco e os russos endurecem contra o Vaticano - Instituto Humanitas Unisinos - IHU