10 Novembro 2022
A confissão do cardeal Jean-Pierre Ricard, que reconheceu ter agredido uma adolescente trinta e cinco anos atrás, chocou os bispos reunidos em assembleia geral em Lourdes.
Abalados pelo caso Santier, tomaram medidas para melhorar o monitoramento dos padres e bispos envolvidos.
A reportagem é de Christophe Henning, publicada por La Croix, 09-11-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
“A nossa geração recebeu a cruz de viver este tempo”, observou Mons. Eric de Moulins-Beaufort no discurso de encerramento da Assembleia Geral. Reunidos em Lourdes na quinta-feira, 3 de novembro, os bispos tinham previsto trabalhar na reforma estrutural da Conferência Episcopal Francesa (CEF). A revelação da condenação de um deles, Mons. Michel Santier, por "abusos espirituais para fins sexuais", sanção que permaneceu secreta por muito tempo, veio para desestruturar o programa.
"Reunimo-nos com sentimentos em que se juntam a raiva, a vergonha, a impotência, a incapacidade de compreender, e talvez até a desconfiança entre nós, e sentindo a raiva, a vergonha, o desânimo e o cansaço dos fiéis", reconheceu o presidente da CEF abrindo a sessão. Sem imaginar por um momento que outro escândalo viria à tona bem no meio da semana de trabalho.
Em uma mensagem enviada na noite de sábado, 5 de novembro, o cardeal Jean-Pierre Ricard admitiu ter feito "gestos repreensíveis" em relação a uma adolescente de 14 anos, quando era padre em Marselha, há trinta e cinco anos. Uma carta de Mons. de Moulins-Beaufort o comunicou à Assembleia dos Bispos no domingo, 6 de novembro, antes de revelá-lo à imprensa no dia seguinte. Enfrentava-se esse novo escândalo para realizar uma "operação verdade": oito bispos estiveram envolvidos nos últimos anos em questões de agressões sexuais e três por não denunciar abusos sexuais.
Se cinco dos bispos envolvidos por agressões são identificados, os outros três são conhecidos apenas por alguns. E os bispos não foram ulteriormente informados, já que o presidente da CEF apelou ao respeito do segredo de investigação. Tendo dedicado a maior parte de seus trabalhos a fazer um balanço do caso Santier, depois reagindo à confissão do cardeal Ricard, os bispos estão preocupados com outros casos que ainda poderiam aparecer. “É uma tortura chinesa. Gota a gota, ficamos sabendo algo mais mês após mês...”, suspira, desnorteado, um deles. “Saímos de Lourdes mais determinados do que nunca”, insistiu Mons. de Moulins-Beaufort diante da imprensa.
Desde então, os problemas continuam a surgir. Em uma carta enviada aos fiéis, os bispos dizem que estão "chocados e resolutos". Para combater esses escândalos, a Assembleia Geral decidiu, em particular, criar um "conselho processual", composto por juristas, psicólogos, leigos, para acompanhar os bispos que devessem se encontrar na situação de denunciar um coirmão.
Para evitar essas disfunções caracterizadas pelos dois casos citados, o conselho processual permitirá que “todo arcebispo ou bispo que tenha que tratar com o caso de outro bispo por abusos ou agressões sexuais seja acompanhado em todas as etapas do procedimento. Atuaremos também junto aos dicastérios romanos competentes para esclarecer os procedimentos, estabelecer os critérios mais precisos quanto à publicação dos fatos e das sanções”, afirmou Mons. de Moulins-Beaufort.
Além disso, ele insistiu na "maturidade" do povo de Deus na França, que não tolera que um padre abusador possa celebrar a Eucaristia: "O povo de Deus é capaz de suportar, por mais doloroso que seja, a descoberta das culpas dos seus pastores, e para as pessoas é pior ficar na ignorância com uma mentira”.
Um departamento de notificações - que o Papa Francisco exige em todos os países a partir de seu motu proprio Vos estis lux mundi (2019) - será instituído em nível nacional. O tribunal penal eclesiástico com competência nacional, decidido após a publicação do relatório Sauvé e cujo estatuto foi aprovado esta semana, poderia entrar em funcionamento em dezembro e tratar de atos cometidos por padres.
“Também precisamos ser mais precisos em nossas trocas com a Santa Sé”, sublinhou o presidente da CEF, lembrando, entre outras coisas, que nem mesmo ele tem autoridade sobre os bispos. Convidou a ter um olhar diferente sobre os bispos: "Todos devemos admitir que nem a ordenação nem as honras nos preservam de cometer culpas, algumas das quais podem ser graves mesmo aos olhos da justiça do Estado, e que todo ser humano pode ser habitada por forças inquietadoras que nem sempre consegue dominar”.
Durante a conferência de imprensa, Mons. Matthieu Rougé, bispo de Nanterre, também falou, apresentando a carta pastoral emitida pelos bispos sobre o debate sobre o fim da vida, Ô Mort, où est ta victoire?. Mons. Nicolas Brouwet, bispo de Nîmes, apresentou sucintamente as propostas de reforma da CEF e a reflexão realizada sobre o motu proprio Traditionis custodes, sobre a aplicação da missa tradicional segundo o missal de 1962.
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Os bispos da França “chocados e resolutos” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU