31 Outubro 2022
Para a socióloga do trabalho Danièle Linhart, os empregados, especialmente os mais jovens, não aspiram mais a “fazer carreira”: a utilidade social e a realização pessoal são suas novas bússolas.
A entrevista é publicada por L’Humanité, 27-10-2022. A tradução é do Cepat.
Os picos de demissão de trabalhadores são característicos de períodos posteriores a crises econômicas?
A crise financeira global de 2008, depois a pandemia da Covid, evidenciaram a grande fragilidade do sistema econômico, bem como a grande vulnerabilidade da própria humanidade. Com o confinamento, as condições de vida foram profundamente afetadas pela crise sanitária. Por esse prisma, as pessoas, principalmente os jovens, têm sido levados a repensar sua relação com a vida, com a sociedade e com o trabalho. Com os desastres ecológicos, há também esse desejo de se centrar sobre aquilo que é importante, vital, tanto para si quanto para a humanidade, para o planeta.
Quais são os perfis dos trabalhadores que se demitiram?
Os mais jovens não pretendem mais ingressar em uma empresa para fazer carreira ali sem considerar o conteúdo do trabalho. Refere-se à tomada de consciência do papel que se pode desempenhar em relação ao desafio ecológico, mas também em relação à própria vida. Fazer carreira, é realmente isso que lhe dá o sentimento de ter conquistado algo em sua vida? Não mais: é mais uma questão de utilidade social, de respeito pelo que é importante. Ninguém pensava assim durante o boom dos Trinta Gloriosos, quando as ideias de crescimento e de sucesso profissional eram evidentes e ninguém questionava. Isso estava ligado à ideia de progresso. Agora, o que pode ser considerado como progresso econômico, social, pessoal se redefine nas convulsões dessas crises estruturais.
A fator busca de sentido pesa mais que a remuneração?
Quando se tem poucas opções, oportunidades, a remuneração continua sendo um fator muito importante. Isso explica em parte as dificuldades de recrutamento no setor hoteleiro e dos restaurantes, onde as cargas de trabalho são pesadas, os horários atípicos são muito perturbadores para a vida pessoal, tendo em vista os salários insatisfatórios. Em tal situação, “por que perder a vida para ganhá-la”. Este slogan é um pouco antigo, mas a ideia é esta. Nos sentimos um pouco como um ressurgimento do Maio de 68, que levantou a questão do que importa na vida: realizar seus sonhos, fazer coisas que façam sentido, ser reconhecido em seu trabalho. Isso marcou o fim de um modelo. Nestes tempos de questionamentos, insegurança ecológica, social, sanitária e financeira, o salário continua a ser uma preocupação importante, mas não é suficiente para decidir sobre as orientações que conduzem às carreiras ao longo da vida.
Os jovens empregados não integraram plenamente as injunções neoliberais de “flexibilidade”, de mobilidade, de assunção de riscos, que acabam por se voltar contra os empregadores?
Não tenho certeza. O que mais tentou os empregadores é essa ideologia da felicidade no trabalho, com todo esse narcisismo em torno da modernização gerencial. Dizem aos empregados: “Mostre-nos que você é o melhor, que estamos certos em confiar em você, e prepararemos uma boa carreira para você conosco, você será feliz, poderá praticar esportes, participar de festas, usufruir de um weekend festivo”. Esses discursos gerenciais de felicidade semearam sobretudo decepção, desilusão. Os trabalhadores contornam rapidamente essas distrações, que são pagas com um trabalho pesado, sem autonomia e, muitas vezes, com a saúde degradada.
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“Os discursos gerenciais de felicidade no trabalho semearam a desilusão”. Entrevista com Danièle Linhart - Instituto Humanitas Unisinos - IHU