23 Setembro 2022
“Como ensina o Catecismo da Igreja Católica, a dignidade humana está enraizada na 'criação do homem à imagem e semelhança de Deus', e é inalienável e intrínseca – ou seja, não se baseia em nenhuma qualidade ou ação da pessoa individual. Portanto, não é difícil determinar que usar pessoas – especialmente pessoas em vulnerabilidade – como objetos para um fim político não é consistente com o ensino católico sobre a dignidade inerente ao ser humano”, afirma o editorial do jornal estadunidense National Catholic Reporter, 20-09-2022. A tradução é de Wagner Fernandes de Azevedo.
Eis o editorial.
A dignidade da pessoa humana é o fundamento de toda a doutrina moral católica. Como cristãos, acreditamos que a vida humana é sagrada, que as pessoas são mais importantes que as coisas e que a sociedade deve proteger a dignidade humana. Como ensina o Catecismo da Igreja Católica, essa dignidade está enraizada na “criação do homem à imagem e semelhança de Deus”, e é inalienável e intrínseca – ou seja, não se baseia em nenhuma qualidade ou ação da pessoa individual.
Portanto, não é difícil determinar que usar pessoas – especialmente pessoas em vulnerabilidade – como objetos para um fim político não é consistente com o ensino católico sobre a dignidade inerente ao ser humano.
Estamos falando com vocês, governadores Greg Abbott, do Texas, e Ron DeSantis, da Flórida. Esses dois políticos Republicanos decidiram que seria inteligente protestar contra as políticas de imigração do presidente Joe Biden enviando homens, mulheres e crianças migrantes para cidades de estados governados por Democratas, incluindo Chicago, Nova York e Martha's Vineyard, até mesmo deixando alguns, literalmente, à porta da residência da vice-presidente Kamala Harris em Washington, D.C. Milhares de imigrantes foram de ônibus ou voaram para o norte nos últimos meses.
Abbott e DeSantis são ambos católicos. Mas mesmo que não fossem, a decência comum deveria impedi-los de inventar um golpe que usa seres humanos vulneráveis – pessoas que fugiram de terras violentas, muitas vezes arriscando suas vidas e caminhando por semanas ou meses para chegar às nossas fronteiras e pedir asilo – para envergonhar seus inimigos políticos e marcar pontos com sua base de combate aos imigrantes.
Que Abbott e DeSantis afirmem acreditar que essas pessoas são feitas à imagem e semelhança de Deus torna suas ações ainda mais chocantes e repugnantes.
Alguns chamaram o movimento de pessoas vulneráveis de “tráfico”, enquanto outros o compararam aos “Reverse Freedom Rides” da década de 1960, uma tática segregacionista usada por alguns governadores do sul dos EUA para enganar os negros a irem para o norte com falsas promessas de empregos bem remunerados e moradia gratuita.
Blase Cupich, cardeal de Chicago, disse que “tratar os filhos de Deus como peões políticos” era “impróprio para qualquer autoridade eleita”, observando que “acolher o estrangeiro, incluindo o imigrante, é um imperativo moral fundamental do cristianismo”.
Uma declaração da Arquidiocese de Miami chamou de “desconcertante”. “Qualquer ação para transportar pessoas sob falsos pretextos e deixá-las presas sem assistência seria diminuir sua dignidade humana e objetificá-las”, afirmou.
Não incluímos nenhuma citação de alguma declaração da Conferência dos Bispos dos EUA porque, até o momento da publicação – cinco dias depois que o voo de Martha's Vineyard trouxe atenção renovada para as excursões que estão acontecendo há meses – a organização dos bispos ainda estava em silêncio sobre o problema.
Tanto Cupich quanto a Arquidiocese de Miami observaram a dignidade humana inerente aos refugiados. “Nós, cristãos, somos chamados a acolher o estrangeiro, o migrante, o refugiado, porque eles também são filhos de Deus, todos nós membros da mesma família, a família humana”, escreveu Cupich. A declaração de Miami lembrou ao governador que “os imigrantes não são números sem rosto – mas pessoas humanas. Eles são nossos irmãos e irmãs”.
Felizmente, esses irmãos e irmãs foram acolhidos como tal nas cidades do norte dos EUA, muitas vezes por grupos da Igreja. Em Chicago, Nova York e Massachusetts, a Catholic Charities (organização da Cáritas nos EUA) estava entre as organizações que acolheram os migrantes e forneceram assistência material.
No próximo domingo (25 de setembro) é o Dia Mundial do Migrante e do Refugiado. Em uma declaração para o dia, que tem o tema “Construindo o futuro com migrantes e refugiados”, o Vaticano disse que o plano de Deus envolve “não deixar ninguém para trás”.
Aparentemente Abbott e DeSantis não entenderam a mensagem. Seu comportamento é desprezível e deve ser condenado por todos os católicos.
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Usar migrantes como peões políticos ignora a dignidade humana dada por Deus. Editorial do National Catholic Reporter - Instituto Humanitas Unisinos - IHU