19 Setembro 2022
A ecologia política ou ecopolítica se desenvolveu a partir da década de 1980. Essa perspectiva modifica a abordagem feita pela antiga ecologia cultural ao introduzir as dimensões políticas na análise.
A reportagem é de José María Manzano Callejo, publicada por Nueva Tribuna, 12-09-2022. A tradução é do Cepat.
As diferenças sociais no acesso aos recursos, o papel dos fatores políticos no uso e gestão desses recursos, as dinâmicas do desenvolvimento e seus efeitos sobre o meio ambiente, bem como a articulação entre os contextos locais e a globalidade, passam a ser os principais temas de interesse.
A ecologia política não tem um "corpus" homogêneo e nela podemos encontrar refletidas diferentes abordagens teóricas: o neoliberalismo insiste nos limites do crescimento, no esgotamento dos recursos e nos efeitos negativos do crescimento populacional, revivendo a perspectiva do malthusianismo. O culturalismo enfatiza as dimensões simbólicas e cognitivas nas relações entre os seres humanos e seu ambiente natural. O ecossocialismo coloca o acento nas causas sociais e políticas que levam à degradação ambiental no contexto do sistema econômico global.
Este é o eterno debate e o dilema dos planejadores do desenvolvimento, que claramente tem a tendência a promover o controle da natalidade e frear o crescimento populacional. E enfrentam uma aparente contradição: nascem mais pessoas onde há mais pobreza, o que acaba provocando cada vez mais pobreza.
Um grande teórico desta disciplina, Partha S. Dasgupta, rejeita como unilaterais tanto as opiniões que atribuem as causas da pobreza e da degradação ambiental ao crescimento populacional, quanto aquelas que consideram que a pobreza não é a consequência, mas a causa do aumento do número de habitantes e propõe considerar a interligação entre pobreza, crescimento populacional e meio ambiente local.
Ao fazer esta proposta, que é muito atraente para os promotores do desenvolvimento, adota uma visão sincrônica que foca a análise na inter-relação entre essas três dimensões, mas não investiga suas causas e isso leva de fato a uma perspectiva neomalthusiana: toma-se a pobreza como algo dado e insiste-se em compreender quais são as decisões que levam uma família a ter muitos filhos, contra seus próprios interesses e apesar do alto custo pessoal que isso acarreta especificamente para as mulheres.
Assim, as razões estruturais para a existência da elevada fecundidade são, segundo Dasgupta, as seguintes: 1) as normas culturais e religiosas que consideram os filhos como valor e finalidade; 2) as incertezas em relação ao futuro, que fazem com que os filhos pareçam uma espécie de seguro contra a velhice, e 3) a necessidade de trabalho abundante, que, nas economias de subsistência, é um imperativo que deriva da quantidade e diversidade de tarefas que devem ser realizadas. O neomalthusianismo e o neoliberalismo consideram que a elevada fecundidade é o fator causal de dois tipos principais de situações negativas. A primeira é que causa uma pressão crescente sobre os recursos e leva à degradação ambiental. A segunda é que isso enfraquece os mecanismos de controle sobre os bens comunitários, pois se o acesso aos recursos é aberto, as pessoas veem neles uma solução para sua situação, procriam abundantemente como mecanismo de defesa e há uma superexploração dos recursos.
Finalmente, algumas palavras sobre o ecossocialismo. A abordagem ecossocialista analisa o contexto social e político em que se enquadram tanto a pobreza quanto a degradação ambiental. Para isso, considera que devem ser levados em conta os processos mais globais de acumulação de capital, que influenciam a ação dos Estados, multinacionais e empresas financeiras, que penetram em diferentes áreas e substituem os sistemas originários de produção por outros orientados para o mercado e a exportação.
Esses mesmos processos estão ligados à desigualdade e à pobreza que, por sua vez, causam degradação ambiental, porque os camponeses pobres não têm condições econômicas ou meios técnicos para evitar o esgotamento das terras que cultivam, por exemplo, e precisam se expandir para novos territórios para sobreviver.
As duas dimensões devem estar inter-relacionadas, porque a elevada demografia e a pobreza não causam, por si só, pressão sobre os recursos: as demandas externas ou as desigualdades internas aumentam e até exacerbam essa pressão, porque são, em última análise, as causas estruturais que estão na base desse processo. Chegar a esse tipo de interpretação significa buscar explicações globais e não apenas parciais da relação entre pobreza e meio ambiente e analisar, por outro lado, as variações locais desses processos. A estrutura agrária, o acesso ao capital e ao trabalho, o mercado, a tecnologia, o conhecimento produtivo e outras variáveis afetam as decisões sobre o uso da terra e a gestão de recursos dos pequenos produtores.
O processo de desmatamento da Amazônia, por exemplo, está diretamente relacionado às políticas de colonização que há anos consideram a floresta como um espaço a ser explorado, sem o acompanhamento de medidas de fixação da população e prevenção da degradação ambiental.
A perda da fertilidade do solo transformou antigas terras agrícolas em pastagens e terrenos baldios e obrigou os camponeses a desmatar novas terras, competindo com os indígenas na luta por espaço e com as madeireiras, as mais ativas no desmatamento.
A ecologia política ou ecopolítica conseguiu conjugar a antropologia econômica e a antropologia ecológica em um mesmo campo e eixos de interesse, e isso especialmente a partir da abordagem do socialismo ecológico ou ecossocialismo, que incorpora as dimensões da globalidade e considera que o impacto ambiental das populações humanas é mediado por forças econômicas e políticas, bem como por dimensões culturais.
Por fim, compartilho esta reflexão da filósofa alemã Hannah Arendt: “As questões políticas são sérias demais para serem deixadas nas mãos dos políticos”.
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A ecopolítica - Instituto Humanitas Unisinos - IHU