26 Fevereiro 2022
Basta um gesto, um olhar para ter esperança e não se deixar envenenar pelo ódio e invocar a paz para todos e em todos os lugares. Principalmente hoje, com as armas sofisticadas, inteligentes, vendidas e compradas, que poderiam matar até mesmo os seus criadores.
A opinião é de Edith Bruck, poeta húngaro-italiana que sobreviveu aos campos de concentração e recentemente recebeu a visita do Papa Francisco. O artigo foi publicado em La Stampa, 25-02-2022. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eu, que escrevo e falo há mais de meio século com milhares de jovens sobre a Shoá, agora online, acompanho com a respiração suspensa aquilo que está acontecendo na Ucrânia e em outros lugares.
Hoje, não há distância, e tudo o que ocorre nos diz respeito. Reflete-se nos nossos países, mesmo para além da Europa. Assistir à desenvolta invasão russa é uma tragédia inesperada, como se não fossem vidas humanas que estivessem em jogo, mas sim a vingança, o ressentimento, o despeito, o comércio e o jogo de força. É possível que o homem não aprenda nada com os seus próprios erros?
É realmente desolador o espetáculo do desfile de armas em um mundo onde se morre de vírus e de fome. Por que a grande Rússia quer “comer” o pedaço da menor Ucrânia, por quais e por quantas razões quer provocar uma terceira guerra mundial, para empobrecer ainda mais o seu próprio povo e arrastar consigo a Europa para a armadilha da morte e da miséria interior?
As feridas do nazifascismo ainda ardem para quem as viveu e a elas sobreviveu. Os milhões de vítimas inocentes ainda pesam sobre a consciência europeia, e o Gulag russo também está bem vivo na memória.
Não há vencedores, mas sim o fracasso do homem doente, inimigo de si mesmo, que, pela fúria de matar, morre um pouco com as suas vítimas. Que pena! Que desolação!
Ao ser humano foi doada a palavra, mesmo que ele a use apenas para esconder a verdade. Dizer e contradizer é algo cotidiano, mas somos tentados a acreditar, precisamos acreditar, para vislumbrar uma luz também na escuridão mais profunda.
Há quem mate em nome de Deus, há quem mate em nome da pátria, há quem mate gritando “Alá”, e há quem mate por uma faixa de terra alheia. Nem quando criança eu acreditava em guerras justas, em um mundo justo, mas em um mundo melhor, sim, em algum canto de paz.
A história está semeada de vítimas, racismos, preconceitos e desumanidade. Eu entendi a preciosidade da vida correndo o risco de perdê-la a cada minuto durante um ano inteiro nos campos de concentração nazistas. Infelizmente, ali também se entendia do que um homem é capaz. Que abismo o habita! E o que se sente quando um menino loiro e belo cospe em você.
Mas, paradoxalmente, com o mal absoluto também se aprende o bem. Basta um gesto, um olhar para ter esperança e não se deixar envenenar pelo ódio e invocar a paz para todos e em todos os lugares. Principalmente hoje, com as armas sofisticadas, inteligentes, vendidas e compradas, que poderiam matar até mesmo os seus criadores.
Confesso a minha obtusidade,
não entendo o que significa
primeiro os italianos
primeiro os americanos
e assim por diante... cada nação
pode usar o mesmo slogan.
Mas primeiro em relação a quem?
Um americano vale mais
do que um sueco ou francês?
Quem é que decide?
Por amor às pátrias
os cemitérios estão cheios.
Uma vida vale tanto quanto a outra
e é cara também para aqueles
que importa menos
do que as nações privilegiadas
mais armadas
mais progredidas
mas não aprendem nada
com seus próprios erros.
Ficaram no ABC.
(do livro “Tempi”)
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O homem contra o homem: não aprendemos a lição da história. Artigo de Edith Bruck - Instituto Humanitas Unisinos - IHU