01 Junho 2021
Um mosteiro de 1.300, em uma montanha nas redondezas de Roma, o apoio de alguns dos mais altos hierarcas do Vaticano e 5.000 estudantes dispostos a ter aulas sobre “como salvar a civilização judaico-cristã”. Steve Bannon, o polêmico assessor do ex-presidente Donald Trump, não poderia desejar mais para o seu Instituto Dignitatis Humanae (DHI), onde quer formar os “novos Trumps do mundo”. O ministério da Cultura italiano, dono do imóvel, acaba de ganhar uma ação para recuperar o histórico edifício de pedra de Trisulti e Bannon, apesar de ter afirmado que recorrerá mais uma vez, vê desmoronar o seu grande projeto político.
A reportagem é de Gustavo Sierra, publicada por Infobae, 29-05-2021. A tradução é do Cepat.
Este ano, Bannon estava trabalhando no plano de estudos para os cursos de liderança dirigidos aos ativistas católicos de extrema direita, que conformaria a Academia para o Ocidente Judaico-Cristão. Já tinha sido o autor dos outros cursos que são instruídos no instituto. Enquanto esteve próximo da Casa Branca, Bannon contou com o apoio de todo o leque de políticos populistas de direita da Itália, como o ex-ministro do Interior Matteo Salvini.
Até mesmo o cardeal conservador estadunidense Raymond Burke apoiou firmemente o projeto e foi presidente honorário do instituto. Mas o purpurado acabou retirando o seu apoio quando Bannon disse que desejava fazer um filme baseado em um livro que denunciava a homossexualidade no Vaticano.
Nessa época, o estrategista político já havia caído em desgraça em Washington. Bannon foi acusado de fraude, junto com outras três pessoas, no que os promotores descreveram como um roubo de grande proporção na arrecadação de fundos dirigida aos doadores de uma campanha privada para construir um muro ao longo da fronteira entre os Estados Unidos e o México. Bannon foi acusado de embolsar mais de um milhão de dólares por sua participação em “We Build the Wall”, enquanto representava os patrocinadores da organização.
Um dia antes de Trump deixar a Casa Branca, concedeu-lhe indulto. E nesta semana, uma juíza federal descartou formalmente o caso de fraude, encerrando meses de litígios sobre como o sistema judiciário deveria lidar com os inúmeros indultos de Trump.
Bannon trabalhou durante anos no projeto da “universidade dos gladiadores”, onde desejava formar uma nova classe de “guerreiros da cultura” de direita. O objetivo, havia dito, era “gerar os próximos Tom Cottons, Mike Pompeos, Nikki Haleys: essa próxima geração que segue Trump”.
Fez contato com Benjamin Harnwell, um ultracatólico de 45 anos com o dinheiro para tornar o seu sonho realidade. Já tinham em vista o mosteiro e a abadia de Trisulti, no alto de uma montanha e decorado com afrescos renascentistas. Graças às conexões dentro do Vaticano, conseguiu um contrato de aluguel com o governo italiano, por 19 anos, em troca de apenas 100.000 euros por ano.
Várias organizações civis e ambientais da região se opuseram e iniciou uma luta judicial. Harnwell passou os dois últimos anos lutando nos tribunais para deter o despejo. Agora, tem até meados de junho para apelar, antes que os carabinieri os retirem à força. Bannon culpa a “burocracia corrupta italiana” e diz: “Este é o tipo de coisas que se esperam de países do Terceiro Mundo, não de uma nação fundadora da civilização ocidental”.
O plano de estudos da academia é dedicado aos fundamentos intelectuais do bannonismo, um coquetel de nacionalismo populista, libertarismo e catolicismo tradicional, que arremete com veemência contra a União Europeia, a China, o Islã, os direitos dos homossexuais, o Papa Francisco – considerado por ele um inimigo dentro de suas próprias fileiras -, o aborto e a esquerda.
Os títulos dos cursos são eloquentes: “Marxismo cultural, jihad radical e a guerra de informação global do Partido Comunista chinês” e “A Igreja primitiva como empresa comercial”. Entre os professores há vários ultraconservadores expulsos de outras universidades católicas. A academia também oferecerá formação em meios de comunicação, ministrada, idealmente, pelo próprio Bannon, e inspirada nas aulas que já deu na tradicional Conferência de Ação Política Conservadora.
Para este segundo semestre, o Instituto Dignitatis Humanae já selecionou 75 estudantes para ter aulas presenciais e viver nas antigas celas dos monges. Deverão levar uma vida de recolhimento, sem conexão externa. As grossas paredes do convento impedem a entrada de sinais wi-fi. Caso o plano siga adiante, será oferecida aos inscritos a formação de “gladiadores nas artes conservadoras católicas”, com créditos acadêmicos, para a obtenção de um título de Mestre, conferido por uma universidade católica dos Estados Unidos, ainda não revelada.
“Queremos formar pessoas com a sensação de que a civilização ocidental está ameaçada”, disse Harnwell em uma entrevista com New Yorker. Um dos estudantes é Alvino-Mario Fantini, de 52 anos, candidato ao doutorado em ciência política em uma universidade holandesa. “É um erro acusar alguém de racismo e xenofobia, ou de nazismo, ou de qualquer outro ismo, sem conhecer suas crenças”, disse Fantini à revista nova-iorquina.
Também lembrou com amargura que na universidade o chamavam de “fascista” por utilizar uma camiseta com a imagem de Trump. Solicitou o ingresso na academia em 2018, enviando a Harnwell algumas notas de sua autoria, nas quais arremetia contra o politicamente correto. Elas tinham sido publicadas na revista que edita: The European Conservative.
Quando conceberam pela primeira vez a ideia da academia, no apogeu da Administração Trump, Bannon e Harnwell contavam com o apoio de uma ampla coalizão de direitistas europeus, que agora está se desmoronando. O novo governo italiano guinou à esquerda e conduziu Harnwell aos tribunais, em diversas ocasiões, alegando falta de pagamento do aluguel e irregularidades em sua solicitação de locação.
Harnwell qualifica as acusações como “desinformação esquerdista”. Também perdeu o apoio de elementos revanchistas no Vaticano, e outros aliados agora estão desiludidos com as tentativas de Bannon em recriar o trumpismo na Europa. “Disseram que seria um projeto cultural, que voltariam a fazer de Trisulti um lugar de estudo e de oração”, explicou Rocco Buttiglione, um ex-ministro italiano da Democracia Cristã.
Enquanto isso, continuam os protestos dos ambientalistas que querem proteger o bosque que cerca o mosteiro e até de um grupo de monges que utilizava uma pequena parte do enorme edifício. Mas Harnwell afirma que, junto com Bannon, resistirão até as últimas consequências. “Para mim, é uma batalha existencial entre o bem e o mal”, afirma. Para eles, o bem provém do catolicismo ultramontano e o mal, agora, está encarnado nos juízes e servidores “progressistas” italianos, que querem acabar com a “universidade dos novos gladiadores”.
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“Universidade dos gladiadores”, criada por Steve Bannon, está sob ameaça de fechamento - Instituto Humanitas Unisinos - IHU