25 Janeiro 2021
"Como pode estar tudo bem, se o capital se sobrepõe à vida?", pergunta Pedro Gilberto Gomes, S. J., professor e pesquisador do PPG em Comunicação e vice-reitor da Unisinos.
Fala-se hoje em complexidade, que vivemos tempos em que os avanços da tecnociência e o desenvolvimento humano nos põem diante do complexo. Vejam que até há menção a um mundo pós-humano. Mas não desejo aqui falar disso, abordarei o seu exato contrário: o simples.
Ao encontrarmos alguém conhecido, ou iniciarmos uma comunicação telefônica, automaticamente vem o lugar-comum “Tudo bem?”. A resposta será maquinal e fugidia: “Tudo bem!”. Mas, estará mesmo tudo bem?
Como pode estar tudo bem, se padecemos com a pandemia que já infectou mais de seis milhões de brasileiros e levou à morte mais de 172 mil indivíduos? Ainda assim, há os que a negam e os que se expõem ao vírus desnecessariamente, como se imperasse a normalidade sanitária.
Como estará tudo bem, se cenas de violência racista são vistas pelo mundo, como aqui perto de nós, no episódio homicida do hipermercado da capital gaúcha? Ao mesmo tempo, constata-se a prática impune de um racismo ecológico ou ambiental, ao se deslocar populações em vulnerabilidade social, negras ou indígenas, para os lugares insalubres e desassistidos?
Como pode estar tudo bem, quando, aqui, nos recentes debates político-eleiçoeiros, viu-se que nos chamados programas de governo, apenas eram tangenciadas soluções, algumas utópicas, para graves problemas de saneamento e educação, o que nos condena a permanecermos nas mesmas condições?
Como pode estar tudo bem, se a corrupção e o clientelismo são uma realidade no Brasil? São necessários propinas e anos e mais anos para construção ou duplicação duma rodovia ou construir uma ponte, restando o bem-estar de população em último lugar.
Como pode estar tudo bem, se o capital se sobrepõe à vida? Portanto, em razão de tal interesse, não podemos minorar a atividade econômica visando a vencer a pandemia.
Não! Não está tudo bem! Somente o estará quando ao menos passarmos a desenvolver no País um processo de justiça socioambiental que proporcione a todos condições de vida digna. E, então, quando eu responder “Tudo bem!”, a resposta será verdadeira.
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Tudo bem? Artigo de Pedro Gilberto Gomes - Instituto Humanitas Unisinos - IHU