11 Abril 2020
São poucos os elementos narrados nos relatos evangélicos daquela parte da história que lembramos durante o Sábado Santo, algo que possa nos ajudar a entrar nos sentimentos daqueles mais próximos de Jesus, que jazia em um sepulcro frio. Deve ter um tempo de sentimentos confusos, provavelmente dominados por um clima de fracasso, de não tem mais jeito, de pensar em que será de nós, que tudo o que foi construído até aquele momento entrou em colapso, como resultado de uma situação que ninguém ainda entende.
O comentário é de Luis Miguel Modino.
São sentimentos que também devem estar presentes em muitas famílias, em muitas pessoas, nestes últimos dias e semanas. Tem ido embora para sempre, rápida e inexplicavelmente, um marido, uma esposa, um pai, uma mãe, um filho, uma filha, alguém que até recentemente alegrou e deu sentido à vida de sua família, de seus amigos. Eles morreram sozinhos e, mesmo sem serem velados, foram enterrados quase clandestinamente. A frieza do túmulo os domina e isso é algo que não sai da cabeça. As histórias que a gente lê são cruéis, narrando como essas pessoas viveram esses momentos, sempre difíceis, mas que agora provocam uma sensação ainda maior de dor.
Pensar nisso é algo que assusta e nos leva a pensar. Recentemente, conversando com minha avó, que aos 91 anos já viveu muitas coisas e que hoje sofre estoicamente e sozinha, o confinamento forçado a que o coronavírus nos submeteu, disse que ela não quer morrer, mas principalmente agora, porque você vai ser enterrado como um cachorro. Suas palavras, certamente duras e difíceis de assumir, remetem-nos a situações presentes na vida de muitas pessoas, dominadas por um sentimento que sempre nos ultrapassa.
O Cântico de Isaías, que acompanha a Oração das Laudes do Sábado Santo, mostra esses sentimentos muito humanos, que nos levam a pensar que somos privados do resto de nossos anos, que cortam a trama com a qual cada um está tecendo sua vida. Diante deles, em quem confia em Deus, surge um pedido para que o Senhor seja seu garante, para libertá-lo do frio e vazio túmulo, sempre movido pela confiança.
Nessa situação, somos chamados a aprender a ver o futuro com esperança, a mesma que a gente imagina nas mulheres que acompanharam Jesus mais de perto, as únicas que, no momento de sua morte, permaneceram aos pés da cruz. Penso especialmente em Maria, sua mãe, o melhor exemplo de confiança em Deus, que desde o início havia dito que podia contar com ela. Nessa mãe, para quem o filho tinha significado tanto, deviam estar acontecendo sentimento enfrentados. Por um lado, a dúvida, a desconfiança, sempre presente em todo ser humano, por outro, a fé daqueles que se abandonam em Deus e confiam nEle acima de toda aparência e circunstância.
Essa esperança, esse compromisso com a vida, tão presente em quem se considera pequeno e carente, também tem sido revelado em pessoas que hoje em dia estão vivenciando tudo o que envolve a morte de alguém próximo. Seu testemunho de confiança, de fé, baseia-se em sentir-se próximo de Deus que nunca falha. A partir daí, entende-se que você pode apostar na vida, que sempre continua, mesmo diante da morte que nos desafia e constantemente nos questiona, às vezes nos atormentando.
Não se desespere, confie que Deus ainda está do seu lado, embora às vezes isso nos pareça implausível. Esse é o caminho que nos permitirá descobrir que a Vida está de volta, que ela tem a última palavra. Há momentos em que podemos apenas esperar e confiar, não porque isso toca e sim porque sabemos que há Alguém que nunca falha, que sempre foi fiel à sua promessa e que será novamente. O quando e o como é algo que nos escapa, mas não podemos duvidar, mesmo diante do sepulcro frio que nos desafia.
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Sábado Santo: um sepulcro frio que nos desafia - Instituto Humanitas Unisinos - IHU