19 Dezembro 2019
“Finalmente uma boa notícia! Terminou o carnaval da escuridão em que abusadores e acobertadores se refugiaram durante anos.” As palavras de Juan Carlos Cruz são quase um suspiro, mas revelam a satisfação com a medida do papa de abolir o sigilo pontifício sobre os casos de abuso de clérigos contra menores.
Cruz é um nome conhecido nos Sagrados Palácios por ter sido uma das vítimas que descobriu a caixa de Pandora sobre os crimes de Fernando Karadima, poderoso sacerdote amigo das elites chilenas, abusador em série de jovens e seminaristas, expulso do sacerdócio por Francisco em 2017.
Na sua casa nos Estados Unidos, onde mora desde que deixou o Chile que lhe recorda os horrores sofridos, Juan Carlos foi tirado da cama às 5h da manhã. Eram as vítimas de todo o mundo com quem ele está constantemente em contato que, através de mensagens de texto e nas mídias sociais, queriam compartilhar a alegria por esse “passo do papa”, que derruba um muro de omissão que durou tempo demais na Igreja.
A reportagem é de Salvatore Cernuzio, publicada por La Stampa, 18-12-2019. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Como sobreviventes, o que vocês acharam do gesto de Francisco no dia dos seus 83 anos?
O aniversário era dele, mas ele deu o presente às vítimas. Há muito tempo, pedíamos que ele tomasse uma decisão desse tipo, e ele o fez, com coragem, indo contra a corrente, às custas de ser impopular.
Por que contra a corrente?
Porque muitos bispos e cardeais da Cúria e do mundo se opuseram a esse procedimento. Posso afirmar isso com certeza e eu vivi isso na minha pele. Muitos temem que aquilo que esconderam até agora possa vir à tona, têm medo das indenizações ou de perder o cargo. Penso particularmente no episcopado do meu país, o Chile, que, com grande arrogância, se sente acima de tudo. De fato, existe o medo de que, agora, as indicações do papa não encontrem uma implementação prática.
Ao envolver leigos no papel de advogados e promotores e ao colaborar com os juízes civis, torna-se difícil “escapar” de tais normas...
De fato, agora eles terão que acertar as contas com a justiça. Tinha que ser assim há muito tempo. Durante anos, muitos bispos viram as vítimas sofrendo e permaneceram imóveis ou, melhor, chegaram até a culpabilizá-las. E, quando encobriram, ficaram impunes. É hora de dizer chega, de deixar a verdade vir à tona.
Qual deveria ser o próximo passo, na sua opinião?
Acima de tudo, a obrigação da denúncia às autoridades civis. Depois, sanções fortes para quem violar as leis estabelecidas pelo papa: bispos, padres, cardeais. Quem não colaborar, deveria ser demitido do estado clerical ou ir para a prisão, imediatamente.
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X Colóquio Internacional IHU. Abuso sexual: Vítimas, Contextos, Interfaces, Enfrentamentos
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“Francisco é corajoso e vai contra a corrente. Para nós, vítimas, cai um muro de omissão” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU