17 Setembro 2019
Para especialistas e moradores locais, parece que a visita do Papa Francisco à Tailândia e ao Japão irá não só destacar os fortes laços do Vaticano com as comunidades inter-religiosas nos dois países, mas poderá também ajudar o papa a avançar em sua pauta ecológica e de paz.
A reportagem é de Elise Harris, publicada por Crux, 14-09-2019. A tradução é de Isaque Gomes Correa.
Em entrevista ao Crux, Adul Smanyaphirak, muçulmano residente de Bangcoc, disse que para o povo tailandês em geral “a visita do papa será uma grande honra”.
Embora a visita vá ser significativa especialmente para os cristãos, a maioria dos quais são católicos, “vocês vão ficar surpresos quando ver todos os tailandeses prestarem respeito a ele. Quero dizer, todas as religiões da Tailândia”, disse Smanyaphirak, acrescentando que todas as comunidades religiosas do país “vivem juntas com respeito”.
Na sexta-feira, o Vaticano anunciou que Francisco irá visitar a Tailândia e o Japão entre os dias 19 e 26 de novembro. No Japão, ele fará escala em Tókio, que se prepara para receber os Jogos Olímpicos de 2020, e então se deslocará para as duas cidades atingidas pelas bombas atômicas americanas de 1945, Hiroshima e Nagasaki. Esta última é chamada de “a Roma do Japão” devido à grande concentração de católicos.
Essa viagem será a quarta de Francisco à Ásia, após a Coreia do Sul em 2014, o Sri Lanka e as Filipinas em 2015, e Myanmar e Bangladesh em 2017.
Nenhum dos países havia recebido uma visita papal desde que São João Paulo II os visitou há quase 40 anos, quando viajou ao Japão em 1981 e à Tailândia em 1984. Ambos são países de maioria budista, em que os cristãos formam uma pequena minoria.
A visita de Francisco à Tailândia, entre os dias 20 e 23 de novembro, sob o tema “Discípulos de Cristo, discípulos missionários”, coincidirá com o 350º aniversário do estabelecimento da Missão de Siam, criada pelo Papa Clemente IX em 1669.
A sua visita ao Japão entre os dias 23 e 26 de novembro irá se centrar no tema “Proteja cada vida”, que, segundo um comunicado de 13 de setembro emitido pela Conferência dos Bispos do Japão, faz alusão tanto a questões humanas quanto a questões ambientais.
De acordo com o Pe. Bernard Cervellera, chefe da agência de notícias Asia News e especialista em assuntos asiáticos, a visita do papa destacará a colaboração inter-religiosa em um mundo dividido pelo conflito e perseguições religiosas.
“Há grandes relações inter-religiosas na Tailândia”, disse ele ao Crux. Para ilustrar, o entrevistado observou que o Vaticano havia recentemente contratado monges budistas do Templo Wat Pho para traduzir, às línguas modernas, um antigo livro sagrado budista pertencente aos museus vaticanos.
Em audiência de 16 de maio com uma delegação budista tailandesa, Francisco expressou a esperança de que budistas e católicos “intensifiquem suas relações, progridam no recíproco conhecimento e estima das respectivas tradições espirituais, e sejam no mundo testemunhas de valores de justiça, de paz e da tutela da dignidade humana”.
Cervellera disse também que as relações inter-religiosas do Vaticano, tanto na Tailândia quanto no Japão, cresceram nos últimos anos, especialmente sob a liderança de Francisco.
“Antes talvez esse assunto não recebia muito destaque, mas hoje têm muitas coisas que fazem o Vaticano ser estimado” em ambos os países, expressou Cervellera, para acrescentar que Francisco “está fazendo de tudo para encontrar nas comunidades religiosas, no diálogo inter-religioso, uma colaboração para o bem do mundo, pela paz e pela ecologia”.
“Em um mundo cada vez mais dividido por uma guerra travada em parcelas, em um mundo onde certos interesses vão contra a casa comum, ele procura colaboradores, e colaboradores também de outras religiões”, disse Cervellera, observando que no Japão em particular “o movimento pacifista é muito forte”, assim como a pressão pelas proteções ambientais devido à poluição nuclear.
Só em Hiroshima, mais de 140 mil pessoas morreram em consequência da bomba atômica, enquanto em Nagasaki o número de mortes foi de aproximadamente 74 mil.
Em janeiro de 2018, Francisco, que já se manifestou a favor do desarmamento nuclear, tive cartões impressos com uma foto de 1945 que estampava um jovem de Nagasaki carregando o cadáver de seu irmão mais novo amarrado às costas enquanto aguardava a vez para cremá-lo.
Inscritas acima de sua assinatura em italiano estavam as palavras: “O fruto da guerra”.
Em nota sobre a visita, Dom Mitsuaki Takami, arcebispo de Nagasaki e presidente da Conferência dos Bispos do Japão, disse: “Fico feliz que o Papa Francisco venha ao Japão com o seu pequeno número de cristãos em comparação a outros países”, escreveu, acrescentando: “Nós vamos trabalhar duro para fazer da visita do papa ao Japão uma visita significativa”.
A nota foi postada no sítio oficial da visita do papa, que também inclui um histórico sobre o papa e os lugares que ele irá visitar, bem como os formulários de inscrição para participar dos eventos papais.
Esta ida de Francisco ao Japão também vai realizar um desejo pessoal de longa data, visto que ele desejou ter sido enviado ao país como missionário ainda quando era um jovem jesuíta.
Primeiramente levado ao Japão por missionários portugueses em 1549, o cristianismo foi proibido em 1614, e um período de perseguição sangrenta se seguiu, com muitos cristãos japoneses forçados a viver na clandestinidade, o que levou ao desenvolvimento da “Kakure Kirishitan”, ou comunidade dos “Cristãos Ocultos”, os quais mantiveram viva a religião em áreas rurais do Japão durante a supressão do cristianismo que durou 250 anos.
Em 2016, Francisco recebeu no Vaticano o celebrado diretor de cinema Martin Scorsese para a apresentação do filme “Silêncio”, que conta a história de dois padres jesuítas que viajam de Portugal para o Japão em busca de um mentor que desapareceu enquanto era missionário.
Durante os dias em que estiver no Japão, Francisco deverá promover a pauta do desarmamento nuclear e da paz, ao mesmo tempo também que deverá promover ações de proteção ao meio ambiente. Ele deve ainda se reunir com o imperador Naruhito e com o primeiro-ministro Shinzo Abe, bem como com representantes da Igreja Católica no Japão.
Na Tailândia, Francisco irá se reunir com a sua prima segunda, a Irmã Ana Rosa Sivori, de 77 anos, que administra uma escola católica de meninas no país. Em entrevista à agência de notícias AFP, Sivori falou que estaria com o papa durante a sua visita, o que mostra o desejo do pontífice de “trazer uma mensagem de paz”.
Dom Paul Tschang In-Nam, embaixador papal na Tailândia, e o Cardeal Francis-Xavier Kriengsak Kovithavanij, presidente da Conferência dos Bispos, anunciaram a visita no dia 13 de setembro, dizendo que a programação será fornecida posteriormente.
Um sítio eletrônico já foi criado e contém informações completas do histórico da Missão de Siam, além de uma breve biografia de Francisco e uma contagem regressiva para a sua visita.
Em comentários à Asia News, o Pe. Marco Ribolini, membro do Pontifício Instituto das Missões Estrangeiras – PIME e pároco na missão Mae Suay, na Tailândia, disse que existem pelo menos dois eventos já planejados: um para os católicos em geral no dia 21 de novembro, e um evento em separado para os jovens no dia seguinte.
Observando que a Tailândia atualmente “atravessa uma fase delicada de transição política”, quando o país se ajusta tanto a um novo rei quanto a um novo governo, os tailandeses, segundo Ribolini, “se encontram construindo o futuro do país com pontos de referência muito diferentes”.
A visita de Francisco, de acordo com o entrevistado, “pode pôr um pouco mais no centro a contribuição que nós católicos podemos dar ao país” e pode ajudar a solidificar a identidade católica em comparação com outras comunidades cristãs.
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Papa Francisco viaja para Ásia em busca de diálogo, paz e solidariedade ecológica - Instituto Humanitas Unisinos - IHU