01 Dezembro 2017
O Papa Francisco vai visitar o Bangladesh, o quarto país muçulmano mais populoso do mundo, de 30 de novembro a 2 de dezembro. "Todo mundo é a favor de receber o Papa, todo mundo está ansioso por sua visita", disse o Cardeal Patrick D'Rozario à America antes da chegada do Papa.
Papa Francisco chegou a Bangladesh nesta quinta, 30-11
A reportagem é de Gerard O’Connell, publicada por America, 29-11-2017. A tradução é de Luísa Flores Somavilla.
Segundo ele, o presidente e a primeira-ministra do país, bem como líderes muçulmanos, bispos e a população em geral, estão felizes que o Papa esteja honrando o país ao visitá-lo, assim como fez João Paulo II em 1986. O mote da visita de Francisco é "paz e harmonia".
"O Papa Francisco é aceito por todas as pessoas como líder religioso; é considerado um líder moral, e as pessoas estão esperando por ele", acrescentou o Cardeal D'Rozario.
Os bispos identificaram três objetivos para a visita do Papa, relatou: "Ele virá como um peregrino para a alma do povo de Bangladesh; sua visita será uma opção pelos pobres e um reconhecimento da harmonia religiosa neste país; e para a comunidade cristã [será] a confirmação de sua fé".
A visita será uma opção pelos pobres, pelo povo de Bangladesh que luta com as realidades da vida e tem sua própria identidade, cultura, patrimônio e harmonia religiosa", explicou o cardeal. "Os pobres nesta terra podem ser entendidos de forma evangélica. Eles têm simplicidade; são um povo temente a Deus, que se satisfaz com coisas pequenas", mas, acrescentou, "também são pessoas que estão vulneráveis por causa das mudanças climáticas".
Observou, ainda, que entre os pobres estão "os trabalhadores da indústria têxtil, os rohingyas e outras vítimas de calamidades naturais e provocadas pelo homem". A visita do papa "será uma mensagem de esperança para eles".
Existem 4 milhões de trabalhadores têxteis, e a maioria enfrenta más condições de trabalho e baixos salários. Quando 1.100 pessoas morreram em um incêndio no edifício Rana Plaza em 24 de abril de 2013, Francisco rezou pelas vítimas e expressou proximidade a suas famílias. Suas palavras tiveram grande impacto sobre o país.
O Papa Francisco sabe sobre a situação difícil dos rohingya aqui e em Mianmar. Mais de 300.000 pessoas desse grupo de muçulmanos, majoritariamente apátrido, morava em Bangladesh antes mesmo da repressão do último mês de agosto em Mianmar, que causou cerca de outras 620.000 pessoas a buscar refúgio no país, que tem um terço da extensão de Mianmar, mas cuja população é três vezes maior.
O cardeal D'Rozario visitou os refugiados rohingya de 25 a 26 de setembro.
"A Igreja Católica em Bangladesh está contente porque a Caritas Bangladesh está trabalhando para 40.000 famílias rohingya — cerca de 300.000 pessoas em campos de refugiados", comentou. É ótimo haver a presença de uma pequena igreja demonstrando amor e misericórdia em resposta aos "gritos dos rohingyas, gritos de humanidade".
Na véspera da visita do Papa a Mianmar e ao Bangladesh, lançou-se um lampejo de esperança sobre esta trágica situação. Em 23 de novembro, o Ministério das Relações Exteriores de Bangladesh anunciou que, após diálogos entre o líder civil do Mianmar, Aung San Suu Kyi, e o ministro das Relações Exteriores de Daca, A. H. Mahmood Ali, os dois países tinham entrado em acordo sobre o repatriação de centenas de milhares de refugiados ao Mianmar e que o processo começaria em dois meses. Os detalhes do processo, no entanto, ainda não foram divulgados.
Apesar dos vários problemas, o cardeal D'Rozario disse que o Bangladesh tornou-se um modelo para o desenvolvimento do terceiro mundo.
"Há dez anos, 59% das pessoas estavam abaixo da linha da pobreza", disse. "Agora, são apenas 29%. É uma grande mudança, e o objetivo é tornar-se [um país de] renda média até 2021".
O cardeal também afirmou que o governo está trabalhando para avançar na harmonia religiosa no país, que tem 160 milhões de habitantes e maioria muçulmana (87%). Dez por cento da população é Hindu, e os cristãos são uma pequena minoria de 600.000 fiéis. Ele espera que a visita do Papa "mostre ao mundo todo que pessoas de outras religiões também podem viver em harmonia em um país muçulmano".
O cardeal D'Rozario enfatizou que "a harmonia religiosa é a marca registrada do país, que surgiu em 1971 após a separação do Paquistão, que se seguiu a uma guerra de nove meses". Ele lembrou que "quando o Paquistão foi criado, na partição em Índia e Paquistão em 1947, a harmonia foi esquecida de alguma forma. Mas com a criação do Bangladesh em 1971, essa harmonia, uma característica da cultura do nacionalismo Bengali, foi um dos principais critérios para sua independência. A fundação do país era realmente fundamentada em quatro princípios: secularismo, nacionalismo, socialismo e democracia".
Enquanto Estado, segundo o cardeal, o Bangladesh "é secular, mas num sentido muito positivo - não ao rejeitar a religião, porque é uma sociedade muito religiosa. Secular para nós significa que todas as religiões têm liberdade de prática e pregação. Essa foi a mentalidade do pai da nação".
A Santa Sé foi um dos primeiros Estados no mundo a reconhecer o Bangladesh, ainda recém-independente, recordou o cardeal. Ele foi o primeiro sacerdote a ser ordenado após a criação do novo Estado e tornou-se seu primeiro cardeal em 2016. É Arcebispo de Daca, a capital, cuja população é superior a 18 milhões de habitantes, e presidente da Conferência Episcopal.
A comunidade católica é "um pequeno rebanho" de 375.000 fiéis, disse ele. "Eu gostaria que o Papa Francisco confirmasse a fé deste pequeno rebanho e impulsionasse o nosso testemunho da fé em meio a esta sociedade plural com todos os seus desafios".
Embora muito pequena, ele relatou que a Igreja tem "uma grande contribuição para o país" no campo da Educação, com 64 escolas de ensino médio e mais de 1.100 escolas de ensino infantil e fundamental, onde 80 a 95% dos alunos são de outras religiões. A primeira universidade católica do país, Notre Dame, foi criada há três anos. Ela tem três faculdades — de ciências, artes, comércio — e 2.000 alunos, dos quais 95% são muçulmanos.
A igreja, acrescentou, é "fortemente envolvida com o desenvolvimento e o trabalho beneficente em todo o país. A Caritas está presente em toda parte, e cerca de 75% das pessoas que trabalham nela são muçulmanos, hindus e budistas. Todos os valores humanos são valores cristãos: eles compartilham dos mesmos valores. Nosso diálogo também é um diálogo de ação.
"Por ser pequena, a Igreja Católica, em seus ministérios, considera pessoas de outras religiões como parceiros ativos, colaboradores e colegas que também partilham da mesma visão universal e estão comprometidos com o desenvolvimento entre os valores humanos, culturais e morais", disse o cardeal. "Em média, cerca de 60 a 70% de nossos colegas trabalhadores em nossas instituições e serviços educacionais, sociais, de cuidados em saúde, de caridade e de desenvolvimento pertencem a povos de outras religiões. Esta é uma excelente forma de evangelização. As pessoas apreciam muito o trabalho que fazemos em todo o país", acrescentou.
Ele disse que a igreja tem se envolvido no diálogo inter-religioso há mais de 30 anos, e "agora estamos felizes que a comunidade maior, a comunidade mais ampla, os muçulmanos também estão tomando iniciativas, também, nesta área. O estado está muito envolvido em promover a harmonia religiosa, também."
Nos últimos três anos, disse, "temos o apostolado de oração: muitos cristãos estão dando uma grande contribuição orando por toda a nação, rezando pela harmonia, rezando pela unidade, rezando na igreja. Na maioria das vezes, os ministros, primeiro-ministro, presidente pedem: 'Por favor, orem por mim, rezem por mim'".
Ele espera que o Papa Francisco fale sobre Laudato Si' e o meio ambiente, "porque a Igreja de Bangladesh tem que priorizar as mudanças climáticas" e "o governo tem feito muito por conta própria". Porém, também espera que a visita do Papa "dê destaque ao exemplo do Bangladesh, de como o país está enfrentando esse problema por conta própria, com suas lutas e seus agricultores, que têm a sabedoria de adaptar-se a ele". Recentemente, as Nações Unidas deram ao primeiro-ministro o prêmio de "Champion of the Earth", acrescentou.
O Papa Francisco chegará ao Aeroporto Internacional de Daca, partindo de Mianmar, às 15h (hora local), no dia 30 de novembro. Sua primeira tarde consistirá de visitas cívicas: ao Memorial dos Mártires, dedicado a todos aqueles que morreram na Guerra da Libertação em 1971; ao monumento ao pai da nação, Sheikh Mujibur Rahman, assassinado em 1975; e ao palácio presidencial, onde será recebido pelo presidente Abdul Hamid e fará um discurso às autoridades políticas e civis e ao corpo diplomático do país.
Em seguida, no dia 1º de dezembro, vai celebrar uma missa ao ar livre para cerca de 80.000 pessoas e ordenar 16 sacerdotes. Nesta tarde, ele encontrará o primeiro-ministro e os bispos católicos e participará de um encontro ecumênico e inter-religioso.
"O Papa Francisco não poderá circular muito pela cidade por causa do trânsito de Daca, que é horrível", disse o cardeal. No entanto, em seu último dia, vai visitar a Casa Madre Teresa, na Paróquia de Tejgaon na cidade, que cuida dos necessitados e de pessoas com deficiência física e mental. Depois, encontrará sacerdotes, religiosos, teólogos e seminaristas na Igreja de Santo Rosário e, antes de partir para Roma, receberá jovens que representam diferentes religiões no campus da Universidade de Notre Dame.
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Em Bangladesh, Papa Francisco encontra ‘desastres naturais e desastres provocados pelo homem’ - Instituto Humanitas Unisinos - IHU