14 Mai 2019
"Nesse contexto de destruição de direitos, é necessário que a resistência dos que são mais afetados seja fortalecida e reinventada, pois os arroubos contra os trabalhadores e os mais vulneráveis têm sido frequentes e ocorrem em ritmo quase frenético", escreve Clemente Ganz Lúcio, Sociólogo e diretor técnico do DIEESE.
O Brasil vive um período de aumento do desemprego e da informalidade, problemas que afetam, de maneira adversa, os trabalhadores e os mais pobres. Muito dessa conjuntura repleta de incertezas e dificuldades resulta das escolhas que o governo vem fazendo nos últimos anos: reforma trabalhista, lei da terceirização, PEC dos gastos e outras medidas que diminuem a responsabilidade do Estado sobre a sociedade e desestimulam a retomada da economia. Mas, apesar do papel exercido pelos governantes brasileiros no desenho desse cenário, nem tudo é resultante somente de “produção nacional”. Parte das mudanças que atingem os trabalhadores é consequência também de transformações mais gerais no mundo do trabalho, que têm ocorrido em todos os países e afetam a organização das empresas e as formas de produção. É possível afirmar que um universo em mutação, que nada oferece de admirável, começa a ser vislumbrado, com predomínio de formas de contratação flexíveis, ajustes nas jornadas de trabalho, novas tecnologias, revisões na proteção laboral, salários variáveis e, muitas vezes, arrochados, entre outras condições desfavoráveis aos trabalhadores. Todas essas medidas têm a finalidade de assegurar às empresas maior liberdade de ação e ampliação dos lucros, enquanto os trabalhadores vivenciam perda de direitos, aumento da insegurança e da precariedade.
Nesse contexto de destruição de direitos, é necessário que a resistência dos que são mais afetados seja fortalecida e reinventada, pois os arroubos contra os trabalhadores e os mais vulneráveis têm sido frequentes e ocorrem em ritmo quase frenético. O enfrentamento a todo esse ataque precisa ser bem calculado e dependerá do desenvolvimento de novas capacidades de luta, que permitam não apenas a reação, mas uma virada de mesa. É da maior importância reverter o processo em curso, mas também avançar para conquistar qualidade de vida, bem-estar coletivo e boas condições de trabalho para todos. O presente insiste em indicar que essa missão é quase impossível, mas a história mostra que os trabalhadores sempre enfrentaram situações extremamente complicadas e, com criatividade e força, mudaram o rumo dos acontecimentos. É por isso que, diante de todas as dificuldades atuais, é preciso continuar a batalha, criar táticas diferentes, intensificar o debate e inovar nas ações.
Com o intuito de contribuir para a resistência, fortalecer o debate e municiar a luta dos trabalhadores, o DIEESE acaba de lançar um instrumento para avaliar a qualidade das condições do trabalho no Brasil. Trata-se do Índice da Condição do Trabalho (ICT-DIEESE), uma espécie de “termômetro” que busca medir a “temperatura” das condições de trabalho, ou seja, mostrar se a qualidade das condições do trabalho está melhorando ou piorando.
O ICT é um indicador sintético, composto, de maneira ponderada, por três dimensões: ICT-Inserção Ocupacional, ICT-Desocupação e ICT-Rendimento. Varia entre 0 e 1. Mais próximo de 1, indica melhores condições de trabalho ou que as condições estão melhorando. De outro modo, se os resultados tenderem para 0, indicam situação pior ou tendência de piora da qualidade das condições do trabalho. Quando comparado a indicadores econômicos - essenciais para explicar a situação do mercado de trabalho -, o ICT mostra-se em consonância com o movimento da economia.
O PIB (Produto Interno Bruto) passou por um período de relativa estabilidade até o primeiro semestre de 2014 e, no terceiro trimestre do ano, iniciou uma queda acelerada. Daquele momento até 2018, o resultado do nível de atividade econômica foi pífio. O auge da recessão ocorreu no segundo trimestre de 2016. A partir de então, embora a redução do nível de atividade tenha sido menos intensa, variações positivas foram registradas apenas em meados de 2017. O discreto desempenho da economia no período não possibilitou sequer a recuperação das perdas anteriores.
O ICT revelou os efeitos do comportamento do PIB no período sobre o mercado de trabalho. Entre 2012 e o primeiro trimestre de 2014, o indicador elevou-se de forma intensa e passou de 0,48 para 0,70. Nos trimestres seguintes de 2014, o ICT quase não variou e, a partir de 2015, já sob os efeitos da crise econômica, passou a diminuir de forma contínua até o início de 2018. Desde então, pouco mudou. No último trimestre de 2018, correspondeu a 0,36.
A trajetória do ICT é traçada pela interação entre as três dimensões (inserção ocupacional, rendimento e desocupação) e refletiu o movimento de deterioração das condições do trabalho entre 2015 e 2017, puxado pela elevação do desemprego e da informalidade e pelo arrocho dos rendimentos. Em 2018, o desemprego parou de crescer, estacionando, porém, em altos patamares; e a informalidade e as ocupações desprotegidas predominaram. No final do ano, houve “um soluço” de melhora, devido à injeção do 13º salário na economia, imediatamente revertido no começo de 2019. Dessa forma, as oscilações das condições do trabalho observadas decorreram da sazonalidade do final do ano, em um contexto que não evidencia nenhum sinal de alento. A situação é crítica e deve permanecer assim em 2019, conforme indica a dinâmica da atividade econômica do país. Infelizmente.
Novas pesquisas, estudos e indicadores sobre as condições do trabalho serão produzidos pelo DIEESE. Com o ICT, a entidade dá início à produção técnica para analisar esse mundo do trabalho em mudança e produzir conhecimento que municie a atuação dos trabalhadores e o fortalecimento da intervenção do movimento sindical.
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Novo índice do DIEESE mede condição do trabalho - Instituto Humanitas Unisinos - IHU