18 Janeiro 2019
Revigorado em seus 103 anos, o teólogo Joseph Moingt publica um novo livro, L'Esprit du christianisme (O Espírito do Cristianismo), pela editora Temps Présent. E espera que não seja o último, desde que tenha ainda dois anos para escrever.
A reportagem é de Jean-Pierre Denis, publicada por La Vie, 10-01-2019. A tradução é de André Langer.
Inverno engraçado! Em dezembro, o general Joffre é nomeado comandante-em-chefe dos exércitos franceses. Aristide Briand acaba de assumir a presidência do Conselho. Dois meses antes, uma força expedicionária franco-britânica desembarcou em Salônica para apoiar as tropas sérvias em dificuldade. Obviamente, ninguém percebe a importância do nascimento de Edith Piaf, de Ingrid Bergman e Frank Sinatra, Orson Welles ou Roland Barthes. Além de seus felizes pais, o sr. e a sra. Moingt, quem mais se interessa por este pequeno Joseph, que veio ao mundo em 19 de novembro de 1915 em Salbris (Loir-et-Cher), no coração das florestas de Sologne?
A Primeira Guerra Mundial terminou há 100 anos. Entre Aristide (Briand) e Édouard (Philippe), perto de 90 chefes de governo se sucederam. Edith Piaf deixou este vale de lágrimas em 1963. Roland Barthes tornou-se um mito em 1980. Quanto a Joseph Moingt, ele ainda está vivo, e eu o encontrei. Quando me recebeu, alguns dias antes do Natal, no “jesuitério” parisiense da rua de Grenelle, o arrojado, embora frágil, senhor, parecia estar bem, apesar de uma ligeira tosse. Ele caminha na minha direção com os passos firmes de quem não precisa de bengala.
Desde a primavera, ele superou dois AVC e acaba de adquirir um novo computador. Ele se bate um pouco, porque não sabe qual botão pressionar para fazer os itálicos e as maiúsculas. Mas seu gosto inquebrantável pela vida impressiona. De onde ele tira isso? “O impulso vem da minha fé, e provavelmente também do sentimento de que o cristianismo não é entendido em sua própria fonte, que é o Evangelho e a morte de Jesus”, ele me diz.
E, em todo caso, por que se cansar até a morte, no fundo, quando, aqui e agora, “a nossa vida eterna já começou”? Para Moingt, de fato, “a vida do Espírito, que é a própria vida de Deus, é dada a Jesus, e ela nos é dada hoje pelo batismo, mas acima de tudo pelo amor com que vivemos”.
Moingt é um sobrevivente, um super-resistente e um experiente. Há muito tempo atrás, digamos 70 anos, ele passou por uma primeira e dura prova. Seis anos de detenção em um stalag. Essa história antiga, além disso, nos interessaria. Mas o passado não o atrai. “O leitor entendeu que eu odeio a minha infância e tudo o que dela sobrevive”, disse Jean-Paul Sartre, que Moingt admite ter lido pouco, preferindo explorar a sociologia francesa, a de Émile Durkheim e de Marcel Mauss, ou então a filosofia de Henri Bergson e de Martin Heidegger. Não contemos, portanto, com o teólogo para desabafar.
Ele nem sequer evocará os campos da Suábia e da Polônia onde, durante a Segunda Guerra Mundial, viveu o seu cativeiro como suboficial. Da ponta dos lábios, ele consente em recordar que se preparou para “acolher as pessoas que estavam lá, nem todas intelectuais” e para “uma atitude de recusa da submissão diante da derrota e da ocupação”, que pode absorver o caráter de um futuro rebelde. Mas isso é tudo.
“Eu penso nisso o mínimo possível”, explica, antes de cortar repentinamente qualquer entusiasmo memorial. “Eu voltei do cativeiro e disse a mim mesmo que não deveríamos voltar ao passado. Uma vez livres, tivemos que enfrentar o presente. Eu risquei o passado da minha vida. Eu não penso sobre isso hoje. Eu nunca olho para trás. Devemos viver”.
A teologia de Moingt, que se tornou cada vez mais progressista ao longo dos anos, é admirada por um círculo fervoroso de cristãos de esquerda ou de pessoas “em pesquisa”, como se diz no jargão eclesial. O resto da Igreja prefere ignorá-lo. Embora o autor, durante a nossa entrevista, tenha se defendido, seu cristianismo, que vai somente às Escrituras, parece-se mais com o protestantismo liberal do que ao catolicismo, e mais à arte minimalista nascida nos Estados Unidos do que ao barroco jesuíta das igrejas da Baviera. Moingt poderia ser uma espécie de primogênito dos “desconstrutores” franceses, o pai adotivo de um Jacques Derrida ou de um Jean-Luc Nancy.
Para Moingt, nem o pecado original nem a ressurreição fazem sentido, e somente um cristianismo original, “apostólico”, seria autêntico. O que varre quase toda a tradição cristã, a começar por Santo Agostinho, e mantém apenas duas pilastras: os Evangelhos “galileus” e os dois grandes pensadores originais.
"Ele passa os dogmas a limpo”, explicou não sem irritação o jornalista Jean Mercier, que o conheceu por ocasião da publicação, pela Gallimard, de um dos dois volumes do seu monumental Croire au Dieu qui vient (Crer no Deus que vem) – conversa tempestuosa da qual o velho professor, provavelmente pouco habituado a ser contestado, ainda se lembra. Joseph Moingt, observou Jean Mercier com razão, persegue “seu Graal pessoal: a fé totalmente nua, desprovida de qualquer muleta, libertada dos mitos dos quais, segundo ele, a Igreja católica fez seus dogmas”.
Quando ele me recebeu, quatro anos depois de Jean Mercier, Moingt não teve nenhuma intenção de abrandar. Para ele, nem o pecado original nem a ressurreição da carne fazem sentido, e somente um cristianismo original, “apostólico”, seria autêntico. O que varre quase toda a tradição cristã, a começar por Santo Agostinho, e mantém apenas duas pilastras: os Evangelhos “galileus” (Mateus, Marcos e Lucas) e os dois grandes pensadores originais, João e Paulo.
“Durante muito tempo, por causa da minha condição de jesuíta, não pensei em distinguir o ensinamento de Jesus do ensinamento da Igreja, menos ainda de opor os dois. É o que estou fazendo agora. Minha fidelidade agora vai ao Evangelho. Antes de querer desenvolver um pensamento crítico, minha preocupação é a do testemunho. O que eu questiono não é a fé do meu pai, da minha mãe, dos meus primeiros educadores, mas uma certa maneira de expressá-la filosoficamente, a partir do tomismo colocado na moda novamente por Leão XIII e que se tornou a escola de pensamento da Igreja católica. De certo modo, eu quero traçar meu testemunho de Jesus, abaixo dos ensinamentos da Igreja católica e abaixo da tradição cristã”.
Esse retorno às fontes, afirma, é, portanto, guiado não pela dúvida, mas pela fé. “A fé é a inspiração que nos vem do Espírito Santo. Ela é essa participação na vida de Deus que nos une uns aos outros. É o amor com que Deus nos ama, que é o amor com que amamos nossos pais, nossos amigos e nossos inimigos também”. É ela, enfatiza, que o instiga a ter sempre “a preocupação com a verdade, que não se reduz a afirmações jurídicas e oficiais”: “Eu sou movido pelo desejo de expressar a verdadeira fé, a verdadeira tradição evangélica. Para mim, ser jesuíta é, acima de tudo, percorrer o mundo para anunciar o Evangelho. Santo Inácio nos deu a vocação de Apóstolos
Seu dossiê para a Congregação para a Doutrina da Fé foi amplamente instruído. Mas o jesuíta teria sido protegido de qualquer sanção canônica pelo apoio de sua ordem e pela vontade do cardeal Ratzinger. “O que não me surpreende”, tem a elegância de reconhecer, antes de recordar não sem malícia que os primeiros escritos do futuro Bento XVI eram considerados muito progressistas.
Como Georges Hourdin, o fundador da revista La Vie, Moingt tornou-se revolucionário na sua velhice, não na época do Concílio ou do Maio-68, mas muito mais tarde, após um curso clássico de professor em Fourvière (Lyon), depois no Instituto Católico de Paris, onde dirigiu a revista acadêmica Recherches de Science Religieuse.
Foi depois que deixou de ser professor de filosofia que ele começou outra vida, a de escritor. No seu centésimo aniversário, o jesuíta dedicou-se a escrever O Espírito do Cristianismo que acaba de ser publicado pela editora Temps Présent. Nesta idade, se poderá pensar, devemos parar de fazer especulações abstratas para começar a encarar a morte. Crer no Deus que vem parece uma adequada despedida, uma sesta para preparar o sono eterno, um adeus ao leitor e ao aqui embaixo. Mas no Pentecostes de 2016, esse homem que crê no Espírito voltou ao trabalho. As primeiras páginas do seu O Espírito do Cristianismo, que relatam esse reinício intelectual, são magníficas.
Encontramos um homem que nunca se cansa de buscar seu caminho. Uma inteligência que pensa ao caminhar, ou melhor, ao escrever. Um escritor que procura suas palavras como se abre a porta que esconde a porta, para ir em busca da vida e ouvir o mundo. Citemos, pois, um pouco longamente este incipit escrito por alguém para quem nada nunca termina, mas tudo começa, inclusive o cristianismo: “Pura alegria, por, nesta manhã fria e clara, abrir novamente o meu computador e escrever, no início de uma página em branco, o título de um novo livro, enquanto o anterior (...) terminava com um adeus ao leitor, que ressoa na minha memória como um adeus à escrita. A idade que atingi justificava amplamente o sentido que eu dava a esse adeus. Mas eu não pude deixar de viver, e como viver sem escrever?” Linhas íntimas, de candura e frescor extraordinários.
Por trás da aparente simplicidade das palavras, sente-se o trabalho de uma vontade forte, que procura manter-se de pé quando tudo balança, que se interroga quando encontra seus próprios limites e os limites impostos pela vida. “Onde encontrar a motivação e o gosto de começar cada manhã um novo dia sem ser pressionado pela pressa para retomar o trabalho inacabado ontem, e por que ocupar as vigílias noturnas ruminando os problemas um curso de tratamento? Por isso, eu não deixei de andar pelo pátio fechado por este adeus, à procura de uma razão válida para reabri-lo, e não deixarei de levantar as questões que eu não me recordo de ter abordado ou cuja solução tenha, talvez por necessidade, matizado ou resolvido, pelo contrário, com mais firmeza”.
Este tesouro existencial só pode tocar o coração de cada leitor, de cada homem, mulher, adolescente ou idoso confrontados com a dolorosa dificuldade de saber “onde encontrar a motivação e o gosto de começar cada manhã um novo dia”. Joseph Moingt mergulha sob a superfície da página em branco e dela extrai a coragem de viver apesar da vertigem do silêncio ou da intimidante evidência do já dito. Para cada um, pensa-se ao lê-lo, encontrar sua página em branco. Esta é a questão de toda a vida.
Mas, para quando é, então, o próximo livro? Moingt não acha que a minha pergunta é absurda e, afinal, reconhecemos que ele não atingiu nem a idade da falecida Jeanne Calment (122 anos, 5 meses e 14 dias, recorde estabelecido, embora contestado), nem a idade da irmã André (nome adotivo na vida religiosa de Lucille Randon, que no final do mês completará 115 anos), atualmente a pessoa mais idosa da França e também dos religiosos do mundo inteiro.
“Eu vou ver o que posso esperar de mim! Eu tenho pressa para retomar um trabalho mais ou menos sério. Se Deus me der a vida, o tempo de vida que peço é, digamos, dois anos para escrever um novo livro. Se eu puder escrever, continuarei. Eu gostaria de continuar a cavar, trazer a salvação ao amor fraterno dos homens uns pelos outros. Eu gostaria de ir ao mais universal, como Jesus foi por sua morte! Se eu ainda tiver tempo para escrever, será para mostrar que o amor e a salvação são idênticos. A salvação é o amor. O amor é a salvação”.
Mas a morte, afinal, para quando mesmo? Ele pensa nisso? Ele espera alguma coisa? “Estou esperando para ser iluminado sobre Deus. Eu espero ver Deus, estar em Deus. Tornar-me eu mesmo Espírito, Espírito de Deus e Espírito de Jesus que faz o seu caminho pelo amor que Ele nos inspira”. Sente-se que, quando o dia chegar, o professor Moingt não ficará descontente em interrogar o aluno Deus. Quem dos dois terá que se explicar? Não prejulguemos.
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Joseph Moingt, o jesuíta que não pode deixar de viver - Instituto Humanitas Unisinos - IHU