Por: Rafael Francisco Hiller | 01 Mai 2018
Giorgio Agamben utiliza o método genealógico para realizar sua pesquisa. Tal método surge tradicionalmente em Nietzsche, sendo que para este, o método leva à relativização dos conceitos, algo de que Agamben não compartilha. Para Agamben, é possível chegar a conclusões não relativistas, utilizando o método genealógico.
Giorgio Agamben, em sua genealogia, com base teológica, ainda tem o estado como pilar na concentração de poder. O governo exerce poder sobre a economia, e esta exerce poder sobre a população. É a economia que rege os processos midiáticos em seu favor e em favor do estado e das diversas instituições.
Podemos estabelecer de forma clara o vínculo existente entre mídia e economia, uma mídia que trabalha em favor dessa economia neoliberal. Tal economia que massifica em favor de uma governabilidade facilitadora, que transforma o ser humano em um objeto padronizado, que trabalha e consome em prol da economia e do estado. Um ser humano massificado, que perde a potência de negação, e acata tudo aquilo que lhe é dito, vendido ou mostrado. O ser humano torna-se massificado, irreflexivo, uma mera peça, um escravo de um soberano. A cegueira que o assola não permite que ele perceba a sua condição de escravo. Ele acata sem ao menos questionar o seu soberano. A mídia o cativa, o comove, o cega, o manipula como um boneco de cordas. A opinião pública cumpre nesse contexto uma função discursiva precisa: encarnação reconhecida do destinador social, ela representa uma das principais figuras, em referência às quais se define e, por assim dizer, se mede a legitimidade do Poder.
No processo de massificação midiático, a televisão ganha um papel fundamental, pois ela tem a capacidade de atingir um maior público de uma forma padronizada. As peculiaridades e a subjetividade do sujeito são gradualmente trocadas através de uma informação unificadora, que visa formar sujeitos padronizados, que cumpram seu papel como peças de um sistema engenhosamente criado.
Atualmente a internet, mais especificamente as redes digitais, devem ser caracterizadas enquanto um novo “canal” de dominação de um capitalismo informacional cognitivo, ou seja, enquanto um novo dispositivo aclamatório das massas. Assim, podemos afirmar que, quando algum indivíduo comenta um blog, o mesmo está produzindo conteúdo, mas ao mesmo tempo traços são deixados, portanto, tal indivíduo também é um fornecedor de dados. O Facebook é um bom exemplo disto, ele capta todas as contribuições que se encontram na base dos valores econômicos da rede. Estamos diante de uma nova problemática, da produção do valor econômico que se origina nestes rastros deixados. Um capitalismo denominado informacional que transforma dados sociais em moeda.
É fato que, junto com o avanço deste novo tipo de capitalismo, surgem crises multidimensionais, isto é, crise ecológica, econômica, política. Estamos envoltos em um grande sistema de exclusão radical em volta do valor do dinheiro. As iniquidades estão ocorrendo em uma taxa de crescimento exponencial. Vivemos diante de uma assimetria nas relações de poderes, estamos diante de uma sociedade de dominação, empresas acumulam conhecimento sobre nossos comportamentos em todas as nossas relações de comunicação.
Frequentemente tendemos a assumir uma postura utópica e ingênua a respeito das redes digitais, isto é, esperamos que tais dispositivos nos trouxessem soluções em nível de re (valoração) dos valores vigentes e manutenção dos mesmos, soluções a nível político, a democratização participativa, enquanto modelo político em vias de sustentação por redes sociais. O fato é que as lógicas que regem tais redes servem ao sistema econômico global capitalista. Tal sistema estende seus “tentáculos” sobre o dispositivo citado acima (redes sociais), inventado, implantado e programado para realizar as mesmas apropriações de antes, mas agora se apropriando de novas habilidades e produções dos sujeitos, a fim de gerar uma nova moeda troca.
A tão sonhada liberdade prometida pela web nada mais é do que literalmente apenas um sonho de liberdade, eis a nova invenção do capitalismo, um capitalismo que aos poucos deixou de se interessar pela força do corpo, passou a se apropriar do conhecimento humano, agora passa ao nível mais profundo do humano, o discurso. Tal capitalismo se apropria do que podemos chamar de forças intrafísicas dos homens, isto é, sua vontade, paixões, aspirações, crenças. O sistema finalmente chega ao ápice de seu processo exploratório, ele se apropria finalmente da “alma” humana que se materializa nos discursos. A razão humana só reconhecida enquanto discursos, eis a nova moeda de troca deste novo capitalismo, os discursos, ou seja, as “almas” humanas.
Um governo aliado a grandes instituições, um sistema de mercado que possui a mídia ao seu favor e uma mídia dependente das lógicas do sistema de mercado é o cenário perfeito para o processo de massificação. O povo massificado não reflete acerca dos problemas e, consequentemente, é facilmente subjugado. O homem acaba sendo inibido de pensar sobre, esse pensar que é um processo natural de nossa espécie. A razão e o sentimento humano são subjugados, tornando tal espécie uma mera peça de um processo fabril. A peça é facilmente substituída. Somente o sujeito subjetivo é capaz de utilizar a razão e os sentimentos tornando-o único, e uma perigosa ameaça a um sistema que massifica. O estado ainda exerce um grande poder sobre o povo, um estado aliado a um sistema econômico onde o lucro se sobrepõe a quase tudo. Agamben traz a reflexão acerca da genealogia teológica e auxilia na compreensão do surgimento desse sistema que procura agradar os seus “fiéis” enquanto os “escraviza”.
Joel Francisco Decothé Junior, no Cadernos de Teologia Pública número 130, "busca realizar uma breve análise exegética da proposta de Giorgio Agamben sobre os fundamentos dos deslocamentos genealógicos da economia teológica no Ocidente. Empreendemos a abordagem da noção de economia teológica em seu entrelaçamento com a operatividade da máquina de governo e providência na gestão da vida e das coisas em sua função econômica".
1. O modelo da economia teológica como governamentalidade
secular
2. Sobre o sentido político da genealogia da economia
teológica
3. A economia teológica e a máquina de governo
providencialista
Joel Francisco Decothé Junior, doutorando em Filosofia no Programa de Pós-Graduação em Filosofia pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos. Possui graduação em Teologia pela Faculdade EST (2014), graduação em Filosofia pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (2014) e mestrado em Filosofia pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (2016). Tem experiência na área de Filosofia, com ênfase em Filosofia Social e Política, Ética, Filosofia do Brasil, Filosofia da Religião e Teologia a partir da América Latina.
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Poder e economia teológica segundo Agamben - Instituto Humanitas Unisinos - IHU