19 Março 2018
Vereadora deixa a viúva e uma filha de 19 anos. Dar visibilidade às lésbicas era uma de suas bandeiras: “Esse tema não será colocado para debaixo do tapete”, dizia.
Na última quinta-feira, 15, embaixo do vão do MASP, enquanto milhares de pessoas começavam a se reunir para uma manifestação em repúdio ao assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL-RJ), um microfone era revezado entre lideranças e militantes femininas. As falas emocionadas exigiam uma explicação do Governo, criticavam a intervenção militar no Rio de Janeiro, mas, principalmente, lembravam o legado de Marielle. Entre tudo o que foi dito, ficaram ecoando ao longo dos dias algumas palavras: mulher, negra, pobre e lésbica.
A reportagem é de André de Oliveira, publicada por El País, 18-03-2018.
A sexualidade da vereadora, ressaltada na manifestação, não era apenas parte importante e indissociável de sua história pessoal.
Marielle costumava publicar fotos ao lado da mulher Monica Benício. Eram declarações de amor, como de qualquer outro casal, mas sempre acompanhadas de uma mensagem clara: dar visibilidade às mulheres lésbicas. Não à toa, vez ou outra, publicava fotos acompanhadas da hashtag #nossasfamiliasexistem, que, como lembrou a revista Claudia, era uma referência ao Estatuto da Família, que define o núcleo familiar como formado apenas pela união entre homens e mulheres.
Em 2017, a então vereadora levou a questão para a Câmara dos Vereadores do Rio de Janeiro. Em agosto do ano passado, apresentou um projeto de lei que incluía o Dia da Visibilidade Lésbica no calendário oficial da capital carioca. A iniciativa foi rejeitada por 19 a 17 votos, apesar da intensa mobilização promovida por coletivos LGBT.
À época da rejeição do projeto, Marielle comentou que o esforço tinha valido à pena, pois era uma forma de tirar a Câmara da zona de conforto. “Não é à toa que buscamos representatividades das mulheres, mulheres negras, mulheres lésbicas, mulheres das favelas. Vai ter muita luta e mulher lésbica na Câmara. “Esse tema não será colocado para debaixo do tapete. Sim. Nossas vidas importam”, disse após o resultado.
Em sua coluna no jornal O Globo, a jornalista Dorrit Harazim lembra que a vereadora, um exemplo nos cargos legislativos, tocou a vida privada e o mandato político com absoluta coerência. “Em 13 meses, apresentou 16 projetos de lei. Com foco em políticas públicas para mulheres, negros e a defesa da comunidade LGBT”, escreve Harazim. O amor de Marielle, como tudo ao seu redor, era também político.
Leia mais
- O segundo assassinato de Marielle Franco
- O assassinato de Marielle Franco e a opressão estruturante no Rio de Janeiro
- Marielle bate impeachment no twitter
- A rotina de violência policial em Acari, denunciada por Marielle
- A segunda morte de Marielle
- Memento para Marielle, assassinada pela repressão
- 'Caso simbólico, Marielle pode servir de inspiração', diz especialista
- Direção dos tiros contra Marielle reforça hipótese de ataque premeditado
- Batalhão alvo de denúncias de Marielle Franco é o que mais mata
- 'Tudo aponta para possível envolvimento de policiais', afirma coordenador criminal do MPF no Rio sobre Marielle
- Assassinato de Marielle Franco põe Planalto contra a parede
- Assassinato político de Marielle Franco reativa as ruas e desafia intervenção no Rio
- “Democracia está ameaçada”, disse Marielle Franco em entrevista inédita
- 'Ela incomodava pequenas e grandes máfias', diz colega de partido de Marielle Franco, vereadora morta no Rio
- Mulher, negra, favelada, Marielle Franco foi de 'cria da Maré' a símbolo de novas lutas políticas no Rio
- Marielle presente!
- Marielle Franco, vereadora do PSOL, é assassinada no centro do Rio na saída de evento que reunia ativistas negras
- Abusos e truculência marcam um mês de intervenção no RJ
- A intervenção federal no Rio e a ameaça aos direitos democráticos
- Anistia diz que intervenção no Rio é medida extrema, imprecisa e põe vidas em risco
- Intervenção federal gera temor em moradores de favelas do Rio
- Intervenção federal no Rio desperta fantasmas sobre o papel do Exército
- Intervenção com militares no Rio é “licença para matar”, diz Conselho Nacional dos Direitos Humanos
FECHAR
Comunicar erro.
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Marielle e Monica, por todas as famílias - Instituto Humanitas Unisinos - IHU