09 Março 2018
Sem alteração na política econômica, o Brasil estará condenado à estagnação da renda per capita.
O artigo é de Laura Carvalho, professora do Departamento de Economia da FEA-USP, publicado por Folha de S. Paulo, 08-03-2018.
Os números do PIB de 2017 divulgados na quinta-feira (1º), mostraram que a economia brasileira cresceu 1% no ano passado, o que é uma boa notícia se levarmos em conta as duas quedas consecutivas de 3,5% em 2015 e 2016.
Mas o resultado tampouco parece ter sido motivo para grandes comemorações: “Brasil vai de zumbi econômico a morto-vivo”, resumiu, por exemplo, o jornal Financial Times, em artigo traduzido pela Folha na segunda-feira (5).
No texto, o correspondente-chefe do Financial Times no Brasil, Joe Leahy, destacou diversos pontos do relatório especial da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) divulgado na quarta-feira (28) em Brasília. Segundo o autor, entre os maiores entraves para o crescimento brasileiro estão o excesso de tarifas de importação e normas de conteúdo local e as injustiças do sistema de aposentadorias.
O relatório da OCDE recomenda, além de abrir mais a economia para a concorrência estrangeira e reformar a Previdência, tornar o Banco Central independente, pôr fim à política industrial, desvincular os benefícios sociais do salário mínimo e reduzir o papel do BNDES, entre outras medidas. O conjunto de reformas estruturais propostas, acredita, seria capaz de elevar o crescimento do PIB brasileiro em 1,4 ponto percentual ao longo dos próximos 15 anos.
O relatório parece saído diretamente do túnel do tempo, de quando ainda havia consenso entre os organismos multilaterais de que o caminho mais eficaz para que países pobres se tornassem ricos era abrir suas economias o máximo possível para a entrada de empresas estrangeiras mais eficientes, desenvolver o setor financeiro privado e reduzir o grau de intervenção do Estado nos mercados.
Algumas décadas depois, o regime do radicalismo de mercado com alto grau de globalização comercial e financeira vem sendo questionado em todo o mundo por ter levado a um crescimento muito abaixo do esperado, bem como a uma maior instabilidade financeira e a níveis mais elevados de desemprego. Resultados de pesquisa do próprio FMI vêm questionando a adoção do modelo.
Em particular, as evidências são que o nível de desigualdade dentro de cada país e aquele entre os países ricos e pobres também aumentou de modo geral. A exceção são os países que conseguiram acelerar muito suas taxas de crescimento por não terem cumprido a cartilha, entre os quais a China é o maior exemplo.
Os investimentos públicos em infraestrutura e a política fiscal redistributiva por meio da taxação progressiva, das transferências sociais e dos serviços públicos de qualidade têm assumido um papel cada vez mais central nas agendas de crescimento econômico defendidas por pesquisadores da área, bem como em plataformas políticas progressistas. Do contrário, a crise do regime é tamanha que continuará levando ao crescimento de movimentos de extrema direita anti-imigração ao redor do mundo.
É verdade, portanto, que, sem uma alteração nos rumos da política econômica e sem a adoção de mudanças institucionais profundas, o Brasil estará condenado à estagnação da renda per capita na próxima década. É verdade também que houve erros de política econômica no passado, tais como as desonerações a grandes empresas e um modelo ultrapassado de política industrial.
Mas o caminho do radicalismo de mercado e da eliminação dos investimentos em infraestrutura física e social não é o que vai nos levar para a terra dos vivos. Quanto aos vampiros, o Brasil já está pronto para exportar.
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Radicalismo de mercado não levará economia à terra dos vivos - Instituto Humanitas Unisinos - IHU