A leitura que a Igreja propõe neste domingo é o Evangelho de Jesus Cristo segundo Marcos 1,1-18, que corresponde ao 2º Domingo do Tempo de Advento, ciclo B do Ano Litúrgico. O comentário é elaborado por Ana Maria Casarotti, Missionária de Cristo Ressuscitado.
Começo da Boa Notícia de Jesus, o Messias, o Filho de Deus. Está escrito no livro do profeta Isaías: "Eis que eu envio o meu mensageiro na tua frente, para preparar o teu caminho. Esta é a voz daquele que grita no deserto: Preparem o caminho do Senhor, endireitem suas estradas!." E foi assim que João Batista apareceu no deserto, pregando um batismo de conversão para o perdão dos pecados. Toda a região da Judéia e todos os moradores de Jerusalém iam ao encontro de João. Confessavam os seus pecados, e João os batizava no rio Jordão. João se vestia com uma pele de camelo, usava um cinto de couro e comia gafanhotos e mel silvestre. E pregava: "Depois de mim, vai chegar alguém mais forte do que eu. E eu não sou digno sequer de me abaixar para desamarrar as suas sandálias. Eu batizei vocês com água, mas ele batizará vocês com o Espírito Santo".
O texto de Marcos que lemos neste segundo domingo do Advento apresenta o início das Boas Novas de Jesus, o Messias, o Filho de Deus. A palavra evangelho significa boa notícia e, no Império Romano, era uma palavra usada especialmente na esfera política para alguma comunicação importante do Império.
Esse evangelho foi escrito para os cristãos da segunda geração, quando o cristianismo já havia atravessado as fronteiras religiosas do mundo judaico, chegando a diferentes lugares, até mesmo a Roma, e os cristãos se perguntavam quem é Jesus, o que ele fez, por que ele atrai tanto e ao mesmo tempo gera tanta rejeição. Lembremos que o cristianismo em seus primórdios foi duramente perseguido pelo Império Romano porque sua vida, suas crenças não se encaixavam no que o império propunha. Marcos se dirige especialmente a essas comunidades perseguidas que precisavam dar uma razão para sua fé e sua identidade, queriam saber mais sobre Jesus, sua vida, sua pessoa. Quem é o Jesus morto e ressuscitado? Como era sua vida? E tantas outras perguntas motivam esse texto que começa com esta expressão tão forte quanto simples: "Início da Boa Nova" ou poderíamos dizer também: início do Evangelho de Jesus.
Marcos, assim, enquadra seu texto em uma única boa notícia, que será a de Jesus, o Messias e o Filho de Deus. E essa Boa Nova tem um começo. Não se trata de algo inesperado, ou algo que surgiu do nada. O início é o começo, a origem ou o começo de algo. É a porta que se abre para o novo, para "aquilo" que gerou uma nova realidade.
Em diferentes situações da vida, recomenda-se voltar ao início, voltar ao começo, voltar à origem, lembrar o primeiro motivo que levou a uma determinada ação. Voltar a esse início é uma forma de reordenar nosso olhar em direção ao horizonte do início. É retornar à fonte de onde surgiu a primeira inspiração. É relembrar a situação original da terra em que a primeira semente brotou.
Em primeiro lugar, o texto nos convida a voltar ao início de nossa fé, à origem de nosso compromisso cristão, ao nosso primeiro amor e, a partir daí, reorientar nossa vida e a vida de nossas comunidades.
Como podemos fazer isso? Lemos o seguinte:
"Eis que eu envio o meu mensageiro na tua frente, para preparar o teu caminho. Esta é a voz do que clama no deserto: Preparai o caminho do Senhor, endireitai as vossas estradas!"
Há alguém que nos precede no caminho, está à nossa frente, mas ao mesmo tempo é uma fonte de sabedoria e uma bússola que marca o caminho. Vozes proféticas que continuam a falar e a ressoar na memória das pessoas e se tornam uma fonte de vida que sacia nossa sede e guia nossa jornada. É um caminho repleto de pessoas de diferentes culturas e lugares que nos precederam e enriqueceram com sua fé, em muitos casos até o martírio, o Caminho que somos convidados a percorrer hoje.
Suas palavras são claras: "Preparem o caminho do Senhor, endireitem suas estradas!"
Neste tempo, somos convidados a retornar a esse início e a canalizar nossa vida para a fonte inicial. Para isso, será necessário retirar aquilo que empobrece a caminhada, aquilo que a torna mais lenta, aquilo que distrai a atenção. Devemos "Endeiretem suas estradas" para tornar nossa caminhada mais suave e suportável, para que não percamos nosso tempo com aquilo que nos distrai e nos deslumbra, levando-nos a encruzilhadas que nos confundem e desorientam.
O Advento é um período maravilhoso que nos convida a preparar nossos corações e nossas comunidades para reconhecer a presença de Jesus em nosso meio. Voltar ao início e preparar o caminho para que possamos desfrutar, com nossos sentidos, da limpeza de sua vinda, do amor do Pai/Mãe que já está em nosso meio e talvez não o reconheçamos.
Às vezes, na Igreja, esses momentos de preparação eram entendidos como algo puramente pessoal e enfatizavam a conversão interior. Embora isso seja importante, o Evangelho nos convida a voltar à fonte, ao amor do início da Boa Nova em nossas vidas, ouvindo o eco daqueles que nos precederam no caminho e traçaram um caminho que somos chamados a ouvir e seguir.
Lembramos de Pedro Casaldáliga: o santo bispo do Araguaia que sempre soube ser fiel ao Evangelho, à Boa Nova: Jesus presente entre os mais pobres e exilados de seu povo. Como disse Fernando Altemeyer Jr. “Nunca abandonou o breviário, as missas fidelíssimas ao ordo e à missão, sem perder de vista os pobres e as comunidades. Via tudo sob o olhar da eternidade. Ficara conhecido pelo slogan vital e radical: 'Nada possuir, nada carregar, nada pedir, nada calar, e, sobretudo, nada matar'. Viveu sempre como um pobre, em casa simples, de porta sempre aberta, usando chinelo de dedo, bicicletas, canoas, roupa simples, comida frugal, cotidiano franciscano e viagens sem luxo".
Deixamos ressoar suas palabras:
Niña precoz,
hermana primogénita
de la Liberación
que se conquista.
Niña novia del Día prometido,
bautizada en la sangre,
grávida de esperanza.
Quiero abrazarte, América,
por tu cintura ardiente,
¡Centroamérica nuestra!
Alguém (um tal Ítalo Joven), no calor dos seus vinte anos, respondeu:
Quiero abrazar contigo,
amigo obispo,
Centroamérica nuestra,
y, como soy pobre
de corazón
y de vista,
quiero también
que sea
una novia verdadera.
Casaldáliga nos indica o caminho de desejos apaixonados e muito concretos, os únicos que nos salvam.
Acabamos de começar a percorrê-los. Ninguém sabe para onde nos levarão.