11º Domingo do Tempo Comum – Ano A – Subsídio exegético

Arte: Cerezo Barreto

16 Junho 2023

Subsídio elaborado pelo grupo de biblistas da Escola Superior de Teologia e Espiritualidade Franciscana - ESTEF: Dr. Bruno Glaab, Me. Carlos Rodrigo Dutra, Dr. Humberto Maiztegui e Me. Rita de Cácia Ló. Edição: Dr. Vanildo Luiz Zugno.

Leituras do dia

1ª Leitura: Ex 19,2-6a
Salmo: Sl 99/100
2ª Leitura: Rm 5,6-11
Evangelho: Mt 9,36-10,8

O Evangelho

O texto é estratégico, como um elo de ligação entre Mt 8-9 que mostram os sinais do Reino (milagres) e Mt 10 que trata da missão.

A compaixão que Jesus (Mt 9,36) já se constata nas curas (Mt 8-9) e traduz a compaixão de Deus pelo povo (Sl 145,9; Is 63,9). Mas agora ela é expressa em palavras diante da omissão dos líderes de seu tempo, como também já é atestado no AT, quando muitos líderes não cuidavam do povo, preocupados, apenas com seus interesses (Ez 34; Zc 10,2). Jesus assume esta perspectiva da compaixão de Deus. A compaixão/missão de Jesus pelo povo sofrido, continua na ação de seus seguidores. Aos Doze, pastores do novo povo de Deus, ele confere os mesmos poderes de realizar as suas obras: curas, exorcismos, ressuscitar mortos. Tudo isto, com a cosmovisão de então, significa lutar contra o mal, contra as situações de morte. A palavra vem acompanhada da ação. Jesus instaura o Reino pela sua ação e pregação. Agora cabe aos discípulos continuar esta missão, que brota da compaixão para com os sofredores: leprosos, paralíticos, possessos, etc. que são as situações concretas vividas pelo povo, e esta compaixão/missão de Jesus seus seguidores devem continuar. A compaixão de Deus, se realiza em Jesus e agora se expressa na missão dos discípulos, que assumem o lugar dos guias que falharam. Assim na pessoa de Jesus e dos seus seguidores, realiza-se o verdadeiro projeto de Deus revelado ainda no AT.

Ao Doze são número simbólico, lembram as doze tribos de Israel, portanto, são o novo povo de Deus (cf. Mt 19,28) e por isto mesmo, assim como as doze tribos eram todo Israel, aqui também, os “Doze” não se refere apenas a um pequeno grupo, mas a todos os membros do novo povo de Deus. Nem tampouco se quer dizer que os Doze receberam poderes extraordinários de cura, simplesmente que eles, isto é, todos os membros do novo povo de Deus, devem lutar contra as situações de morte e sofrimento que afligem o povo, como vem sonhado para os tempos messiânicos (Is 42,18). Como “Doze” é totalidade, significa que todo discípulo e discípula têm esta missão. Entre eles há pescadores, cobrador de imposto, zelote e até um traidor. No novo povo tudo isto é possível. Doze quer dizer todos, bons e maus. O novo povo de Deus é formado por imperfeitos que buscam continuar a compaixão/missão de Jesus.

Pedir ao Senhor da Messe o envio de operários não é sinônimo de despertar vocações sacerdotais ou religiosas. Nem é convencer Deus da necessidade de mandar operários. Mas é convencer todas as pessoas a assumirem a compaixão/missão de Jesus. Para isto, sim, precisa de oração.

Tem algo estranho no texto: a proibição de ir aos pagãos e à Samaria. Seria isto um sinal de racismo? Não. Trata-se de ir aos pobres, abandonados e sem pastor, conforme se lê em Nm 27,17 e Ez 34. Por isto, a missão começa pelos últimos, onde mais precisa. Reflete também a comunidade de Mateus, que inicialmente só evangelizava judeus (10,5s; 15,23s), mas que depois se abre a todos os povos (Mt 28,19). Quem se sentiu agraciado e despertou para a missão, de graça se põe a caminho.

Resumindo

Mt 9,36-38: tudo brota da compaixão de Deus pelo povo (Ex 3,7; Ez 34; Zc 10,2). Portanto, Jesus é a encarnação plena da compaixão/missão de Deus que se manifestou no AT.

Mt 10,1-8a: chama os Doze e lhes dá poder sobre o mal. A comunidade cristã recebe o poder de dar continuidade à obra de Jesus. Assim, a Igreja prolonga na história a compaixão/missão de Jesus, que por sua vez encarna a compaixão de Deus pelo seu povo desde os tempos de Moisés e dos profetas.

Mt 10,2-6: todos, bons e maus são destinados ao povo sem pastor, devido aos maus líderes de Israel. Disto resulta que a Igreja, que prolonga a ação de Jesus, deve estar aberta indistintamente para todos.

Mt 10,7-8b: o anúncio e a ação acompanhados de sinais são gratuitos. A Igreja, na esteira de Jesus, é depositária da graça de Deus e esta deve ser levada ao povo, sempre de graça.

Relacionando com as outras leituras

Ex 19,2-6a: O Deus libertador agora propõe aliança com os escravos libertos. Pela sua compaixão, ouviu o clamor do povo no Egito (Ex 3,7). Já livre, preparando-se para a Terra Prometida, Deus o consagra como um reino de sacerdotes e nação santa (v.6). Está aqui um compromisso de Israel ser o mediador da aliança entre Deus e os demais povos, o que mais tarde Jesus recomenda aos Doze, isto é, para continuar a compaixão/missão de Deus na história de todos os povos.

Rm 5,6-11: Paulo lembra aos cristãos que a salvação não é uma conquista humana, mas é um dom de Deus que, em sua compaixão, através da morte de seu Filho trouxe a salvação para quem não merecia: “mas nisto Deus provou o seu amor para conosco. Cristo morreu por nós quando ainda éramos pecadores” (Rm 5,8b). Ou seja, este infinito amor/compaixão de Deus chega a nós por Jesus Cristo. E o Evangelho nos lembra que é função da Igreja encarnar na história este mesmo infinito amor/compaixão através da missão dos Doze gratuitamente.

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