28 Setembro 2018
João disse a Jesus: “Mestre, vimos um homem que expulsa demônios em teu nome. Mas nós lhe proibimos, porque ele não nos segue”.
Jesus disse: “Não lhe proíbam, pois ninguém faz um milagre em meu nome e depois pode falar mal de mim”. “Quem não está contra nós, está a nosso favor. Eu garanto a vocês: quem der para vocês um copo de água porque vocês são de Cristo, não ficará sem receber sua recompensa. E se alguém escandalizar um destes pequeninos que acreditam, seria melhor que ele fosse jogado no mar com uma pedra de moinho amarrada no pescoço. Se a sua mão é ocasião de escândalo para você, corte-a. É melhor você entrar para a vida sem uma das mãos, do que ter as duas mãos e ir para o inferno, onde o fogo nunca se apaga. Se o seu pé é ocasião de escândalo para você, corte-o. É melhor você entrar para a vida sem um dos pés, do que ter os dois pés e ser jogado no inferno. Se o seu olho é ocasião de escândalo para você, arranque-o. É melhor você entrar no Reino de Deus com um olho só, do que ter os dois olhos e ser jogado no inferno“.
Leitura do Evangelho de Marcos 9, 38-48. (Correspondente ao 26º domingo comum, do ciclo B do Ano Litúrgico).
O comentário é de Ana María Casarotti, Missionária de Cristo Ressuscitado.
No texto de hoje, o discípulo João inicia o diálogo. Dirige-se a Jesus narrando uma boa atitude que ele junto com algum dos discípulos teve. “Mestre, vimos um homem que expulsa demônios em teu nome. Mas nós lhe proibimos, porque ele não nos segue”.
O texto evangélico continua a perspectiva de Jesus de formar os discípulos nos critérios do Reino. Lembremos que o texto foi escrito como ensinamento para os que desejavam seguir Jesus e mostra com muita clareza as dificuldades que se apresentam no seguimento de Jesus. “Quem der para vocês um copo de água...” . Jesus continua a instruí-los e instruí-las no novo estilo de vida que traz seu seguimento.
Pelas suas palavras percebe-se que João está incomodado porque há uma pessoa que expulsa demônios “usando o nome de Jesus”, mas não está o dia todo junto com Jesus. Para João essa pessoa não é dos “nossos”. Ela se coloca dentro dos “escolhidos” como se fosse uma pessoa especial. Ainda não compreende o que significa ser escolhido por Jesus para segui-lo. Na sua frase “ser dos nossos” ecoa diferente do que se fosse dita por Jesus. É uma expressão que manifesta um ar de superioridade, de ter recebido um dom especial, que os coloca numa posição de preponderância em relação ao resto.
O teólogo José Maria Castillo Sanchez disse que “teríamos de recuperar o que há de mais original (e desconcertante) que encontramos no conjunto dos relatos dos evangelhos: o ponto central do Evangelho não é a Fé, mas o Seguimento de Jesus”. E continua: “Jesus tolerou as dúvidas, medos e obscuridades dos discípulos no que se refere à fé. Portanto, Jesus repreendeu os discípulos por sua pouca fé, seus medos e sua descrença.” [...] “Jesus foi mais exigente no que se refere ao ‘Seguimento’. Esses chamados ao "seguimento" envolviam um mistério: Jesus não dá explicações, não diz os motivos pelos quais fazia as convocações, não propõe um projeto ou estabelece condições. Ele apenas convoca. (Disponível em O humanismo de Francisco revela a essência do ser cristão. Entrevista especial com José María Castillo)
O primeiro ensinamento no texto de hoje está nas palavras de Jesus dirigidas a João: “Não lhe proíbam, pois ninguém faz um milagre em meu nome e depois pode falar mal de mim”.
João não está pensando na pessoa que é libertada da sua dor, nem no amor que eles recebem de Deus através da sua confiança no seu Amor. João pensa nele mesmo, nas suas possibilidades e nos benefícios dos quais se considera quase proprietário por ser parte do grupo dos que seguem Jesus. Suas palavras são expressão da mentalidade de cristãs e cristãos que se consideram os possuidores de Jesus e seu reino. E por isso sua atitude de proibir e colocar limites para os e as outras que fazem o bem. Ele e alguns dos discípulos apoderam-se da exclusividade na construção do Reino.
Na sua resposta Jesus convida João a dar uma olhada no bem realizado: dar de beber um copo de água!! Fazer o bem não tem limite por mais simples que se apresente. Uma boa ação não pode ser categorizada nem nivelada.
A recompensa prometida por Jesus na construção do Reino pertence a todos e todas. O melhor exemplo disto são as crianças, as pessoas fracas, simples. O Reino é construído no cotidiano, nos pequenos gestos, nos copos de água para uma pessoa necessitada, nos gestos de paciência para quem está desesperançado.
Disse Francisco que “precisamos do silêncio da escuta para reconhecer a voz dos pobres. Se falarmos demasiado, não conseguiremos escutá-los. Muitas vezes, tenho receio que tantas iniciativas, apesar de meritórias e necessárias, estejam mais orientadas para nos satisfazer a nós mesmos do que para acolher realmente o grito do pobre. Nesse caso, no momento em que os pobres fazem ouvir o seu grito, a reação não é coerente, não é capaz de entrar em sintonia com a condição deles. Está-se tão presos na armadilha de uma cultura que obriga a olhar-se ao espelho e a acudir de sobremaneira a si mesmos, que se considera que um gesto de altruísmo pode ser suficiente para deixar satisfeitos, sem se deixar comprometer diretamente.” II Jornada mundial dos pobres. "Este pobre grita e o Senhor o escuta"
Quais são os pequenos gestos que realizamos no cotidiano, sem fazer nenhuma difusão, no silêncio, na vida diária?
Na minha vida, no nosso grupo de amigos e amigas, no grupo familiar, na comunidade, temos capacidade de escutar ou ver as necessidades que sofrem os que não são “dos nossos”, os que estão além das fronteiras de nossos espaços diários?
Peçamos ao Senhor ter ouvidos atentos para saber escutar no momento preciso, olhos para ver as necessidades que se apresentam continuamente ao nosso redor e são o convite que Jesus nos faz para colaborar na construção do Reino.
“O que mais necessitamos no mundo de hoje são homens e mulheres livres, focados em reproduzir o projeto de vida de Jesus. O segredo da ‘sedução’ do papa Francisco é que ele é um crente que segue Jesus. Por isso ele exerce a sedução que Jesus exercia”. Entrevista especial com José María Castillo
Neste mês de setembro dedicado especialmente às missões e à leitura e partilha da Palavra de Deus, peçamos ao Senhor ter a capacidade de ouvir sua Voz presente nos pobres e vulneráveis que estão ao nosso redor.
Ambiguidade
Do fundo do mistério
brota a ambiguidade
trançando a espessura do corpo
e a sutileza do espírito
caminha disfarçada
com ideias bem articuladas
sentimentos luminosos
e fomes naturais.
Corre maquiada de evangelho,
instala-se astuta
em minhas rotinas seguras
na pressa de minhas urgências
e no sonho de minhas serenidades.
Mas minha ambiguidade
começa a revelar-se
por uma mão alheia
fugidia no encontro,
por um leve desajuste
que aparece em um olhar,
por um pequeno sabor amargo
em meio ao aplauso,
por um desconforto íntimo
como resíduo de fadigas cotidianas.
Ao surpreendê-la em suas armadilhas
encolhe-se novamente
em meu fundo mais escuro,
onde a treva e a luz
ainda não foram separadas.
Ferida pela claridade
deixa um rastro de engano
esvaindo-se em sangue na fuga.
E mergulha, inacessível
aonde não chegam
nem meu olhar nem minha análise.
Senhor de minhas profundidades
abismais e ignoradas!
Como no primeiro dia da criação,
busca-me e liberta-me.
onde sou treva e engano.
Ordena-me com teu Espírito
onde sou caos originário!
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“Quem der para vocês um copo de água...” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU