06 Setembro 2018
A proposta é exigir o cumprimento do direito originário de pertencimento das terras às margens dos rios Iguaçu e Paraná.
Foto: Osmarina Oliveira/Cimi Sul
A reportagem é de Michelle Calazans, publicada por Conselho Indigenista Missionário - Cimi, 05-09-2018.
Cerca de 70 jovens das comunidades de Itamarã e Tekoha Ocoy participaram, de 17 a 20 de agosto, do Encontro de Jovens Guarani (Aty Mirim), no município de São Miguel do Iguaçu, Paraná. O encontro, conduzido por líderes religiosos (Oreramói e Orejary), aprofundou o conhecimento dos “novos guerreiros” acerca da ameaça de reintegração de posse da Itaipu Binacional e alinhou o entendimento sobre a história e a cultura dos povos indígenas, que tradicionalmente habitam na região.
A proposta é exigir o cumprimento do direito originário de pertencimento das terras às margens dos rios Iguaçu e Paraná. A Constituição Federal de 1988 reconhece, nos artigos 231 e 232, os povos indígenas e seus direitos territoriais. Direitos esses reforçados também na Convenção n°169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
O esclarecimento aos jovens indígenas foi voltado para o risco ilegal de desalojamento das comunidades indígenas no oeste do Paraná. Nesse contexto, o Juiz Federal Sérgio Luis Ruivo Marques, da 1ª Vara Federal de Foz do Iguaçu, proferiu, no dia 13 de agosto, a decisão em favor do pedido de reintegração de posse da Itaipu Binacional. Hoje, cerca de 40 famílias Guarani, com crianças e idosos, podem ficar desalojadas.
Apesar de a cidade de Santa Helena, Paraná, ser reconhecidamente território Ava Guarani e aguardar a regularização fundiária juntamente com outras terras Guarani na região, a decisão de reintegração de posse trata esse povo como “invasor”. O despacho alega também que a área é de preservação ambiental, no entanto, não há qualquer indício de degradação da reserva por parte dos povos indígenas.
O reconhecimento do território indígena Ava Guarani está contemplado na decisão judicial de novembro de 2017, em ação civil pública nº 5006284-37.2017.4.04.7002, proferida pelo Juiz Rony Ferreira, da 2ª Vara Federal de Foz do Iguaçu. Em decisão anterior, o juiz Rony já havia destacado a urgência da finalização no processo de demarcação das terras e a necessidade da área ser ampliada.
Por fim, foi produzido um Manifesto com as reivindicações dos povos indígenas para envio ao Ministério Público Federal (MPF) e à Defensoria Pública da União (DPU).
Confira abaixo o manifesto produzido no Encontro de Jovens Indígenas:
À Sociedade Paranaense
Aos Órgãos Públicos
Nos lideranças Guarani da comunidade Indígena Tekoha Ocoy, situada no município de São Miguel do Iguaçu, estado do Paraná, reunidos com os nossos líderes, nossos Oreramói e Orejary, nossos jovens do Aty Mirim, expressamos, através deste documento, nosso sentimento do momento atual, do que estamos passando e levamos ao conhecimento de todos, algumas considerações e propostas.
Nós somos naturais desta região, somos originários das margens dos rios Iguaçu e Paraná, inclusive os recentes estudos arqueológicos comprovam o que sempre afirmamos. Porém, nos últimas décadas fomos expulsos desse território, primeiro pelo processo de colonização da região e depois pela construção da hidrelétrica de Itaipu Binacional.
Em ambos os casos nós nunca recebemos nenhuma indenização pela perda do nosso território. Por isso tivemos que lutar, primeiro para conseguir um pedacinho de terra que é o Tekoha Ocoy, e posteriormente o Tekoha Itamarã e Anhetete, mas esses locais não são suficientes. Por isso nossos parentes retomaram outros locais, de parte do que eram nossos antigos Tekoha, em Itaipulândia e Santa Helena.
Diante disso queremos reforçar uma vez mais o pedido para a devolução de nossas terras. Até agora não temos uma reposta concreta da Itaipu e do governo brasileiro. Estamos cientes de nossos direitos, sejam aqueles direitos de nossos costumes tradicionais, sejam aqueles garantidos na Constituição Federal de 1988, nos Artigos 231 e 232 e na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho.
Esse não atendimento do governo brasileiro e a violação de nossos direitos têm provocado consequências negativas para nós Ava-Guarani, gerando desastres irreversíveis. Ficamos sem território, sem matas, sem natureza, praticamente sem vida, porque para nós a terra é a nossa vida. Esse processo deixa nosso povo quase sem esperança, porque ficamos sem terra, sem indenizações e sequer somos contemplados com Royalties da Itaipu.
Queremos reconstruir nosso futuro onde nossos filhos e netos tenham uma vida digna, sem perder a sua cultura, língua e tradição, que os nossos ancestrais nos deixaram. O mais importante para nós é o nosso território, precisamos ter nossa terra com os recursos naturais onde possamos construir o nosso habitat natural de sobrevivência Guarani. As terras a serem devolvidas devem ser nessa região porque é aqui que nascemos e é aqui que queremos continuar vivendo. Pedimos a todas as autoridades, de todos os órgãos competentes que o nosso pedido seja respeitado e levado adiante para que tenhamos o mais rapidamente possível uma solução favorável para nossa população.
Pedimos também que todos os projetos de assistência existentes nas comunidades tenham continuidade independentemente das ações que estão sendo encaminhadas para devolução do território e pagamento dos Royalties.
Queremos o apoio de toda sociedade, precisamos contar com apoio de todos. Nossa reivindicação de terras e Royalties é com o governo brasileiro e Itaipu, porque foram eles que nos deixaram sem terra, e são eles que devem resolver o problema que eles causaram.
Nos colocamos a disposição da sociedade e do governo para contribuir e dialogar com o objetivo de chegar a uma solução o mais rapidamente possível.
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Jovens Guarani no Paraná reivindicam devolução de terras e reparação de direitos violados por Itaipu Binacional - Instituto Humanitas Unisinos - IHU