12 Junho 2017
“Se o século XX foi o mais secularizado de toda a história, o nosso está cheio de "efervescência religiosa", muitas vezes fundamentalista e fanática: trata-se de comunicar os valores do Evangelho de uma forma hiper-religiosa, especialmente na África, nas Américas e na Ásia. É neste ponto que se situa a mensagem do papa, que é uma mensagem firme e enraizada na realidade, dentro de uma linha que começa distante e que nele encontra um intérprete muito corajoso”, analisa Andrea Riccardi, intelectual italiano especialista em história e fundador da Comunidade de Santo Egidio, em entrevista publicada por Vatican Insider, 09-06-2017.
A entrevista é de Domenico Agasso Jr. e traduzida por Henrique Denis Lucas.
Professor Andrea Riccardi, Francisco é um Papa "revolucionário"?
Seu pontificado tem um impacto, então pode parecer revolucionário desde o ponto de vista de seu carisma pessoal. Em vez disso, está em continuidade principalmente com o Concílio Vaticano e com Paulo VI. Esta herança também se mistura com a criatividade de Bergoglio: estamos diante de ensinamentos que mesclam gênio e história pessoal.
Francisco é considerado "próximo do povo", um papa que "derruba muros e reduz distâncias". Mas, ele não corre o risco de fazer que o seu magistério esteja muito relacionado a conversações, gestos e emoções? Ele é muito raso?
É uma das acusações que fazem a ele: ter pouca profundidade teológica. Também acusam-no de suprir essa pouca profundidade com a proximidade. Este papa não é um teólogo, não tem a estrutura acadêmica de Joseph Ratzinger, como tampouco a tinham Paulo VI e João XXIII, mas tem uma característica particular, que vem de sua história como jesuíta, bispo e latino-americano: ele é, como dizia Montini, um perito em humanidade.
Mas como um especialista em humanidade deposita sua fé?
Ele a conjuga. Isto é demonstrado por uma comunicação profunda: Francisco diz coisas que tocam na alma e na vida das pessoas. O papa conhece as dores de pessoas e aborda de maneira concreta temas como o peso da vida, o sentido do pecado. De fato ele insiste muito na conversão e na penitência: ele também é um papa confessor.
Assim, chegamos à outra definição que o acompanha: o "Papa da misericórdia". Mas a sua insistência sobre o perdão de Deus, que supera qualquer coisa em relação ao pecado original, não é demasiada?
A misericórdia é um grande conceito teológico, não um atalho. No cristianismo nunca é desproporcional nem inapropriada a insistência no perdão de Deus. Aliás, talvez a misericórdia tenha estado em baixa. O papa desempenha suas ações em um grande equilíbrio, mas a misericórdia de Francisco não é o perdão a preço com desconto. Atrás dele há uma tradição grande, completa e severa, como a dos jesuítas. Não se trata de algo para cobrir um pensamento fraco: o pensamento forte de um papa não é apenas acadêmico.
Este pontificado pode ser uma "ponte" entre a doutrina cristã e a sociedade contemporânea?
Se o século XX foi o mais secularizado de toda a história, o nosso está cheio de "efervescência religiosa", muitas vezes fundamentalista e fanática: trata-se de comunicar os valores do Evangelho de uma forma hiper-religiosa, especialmente na África, nas Américas e na Ásia. É neste ponto que se situa a mensagem do papa, que é uma mensagem firme e enraizada na realidade, dentro de uma linha que começa distante e que nele encontra um intérprete muito corajoso.
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"Este é um papado de impacto, de um especialista em humanidade" - Instituto Humanitas Unisinos - IHU