04 Abril 2017
“Franciscanear”: diz-se daqueles que “fazem como se” estivessem identificados e em sintonia com o atual Papa Francisco. De fachada e imagem pública vão de “franciscanos”, mas, na realidade, vivem com desagrado e em desacordo interior e prático com os gestos, a orientação pastoral e o modelo de Igreja do atual Bispo de Roma. Eles esperam o fim do tempo do Papa Francisco para voltar à situação eclesial anterior. Francisco, para alguns, particularmente bispos, é um pesadelo, um parêntese do qual esperam se livrar o mais rápido possível.
A reportagem é de Xabier Larramendi e publicada por Noticias de Gipúzkoa, 01-04-2017. A tradução é de André Langer.
A renovação da Igreja que o Papa Francisco quer está amortecida, silenciada, boicotada em muitos níveis. As dioceses bascas caminham sem alento renovador, “castradas” por bispos que se aferram ao passado, a um passado nada sinodal, corresponsável, como proclama e deseja o papa. E não podem dar aquilo que não têm. Para ilustrar essa situação, segue um exemplo acontecido entre nós e que é uma clara demonstração do que digo.
A Faculdade de Teologia de Vitoria celebra este ano o 50º aniversário de sua criação, ocorrida em 1967. Por este motivo, o Conselho da Faculdade veio se reunindo em diversos momentos para decidir a programação comemorativa que deverá acontecer ao longo deste ano. Já há alguns meses, este conselho, presidido pelo bispo da diocese de Vitoria, Juan Carlos Elizalde, tratou da possível concessão do título de Doctor Honoris Causa da Faculdade. Após considerar diversos nomes, a maioria se inclinou, por diversas razões, a favor de José Antonio Pagola, proposta que pareceu não agradar em absoluto o bispo Elizalde. Por isso, considerou-se oportuno amadurecer mais a decisão e tratá-la na reunião seguinte.
Esta reunião aconteceu no dia 06 de março. Desde o começo, sem esperar nenhuma outra consideração, o bispo manifestou sua decisão. Após consultar, segundo ele, os bispos de San Sebastián e de Bilbao e algum outro membro da hierarquia, expôs que a nomeação do teólogo Pagola para Doctor Honoris Causa provocaria graves tensões que não estava disposto a assumir. Por isso, descartado Pagola, propôs o nome do também padre Saturnino Gamarra, professor emérito da Faculdade, na qual foi professor desde o seu início e diretor da revista sacerdotal Surge durante muitos anos.
O debate que se seguiu foi muito intenso e prolongou-se além do esperado. Que tensões a proposição do nome de José Antonio poderia provocar? Por parte de quem? A Congregação romana da Doutrina da Fé pronunciou-se afirmando que a obra de Pagola não contém nenhuma doutrina herética contrária à fé. O que poderia incomodar agora? A decisão da Faculdade de Vitoria ou a sentença de Roma? O que se esconde por atrás dessa objeção ao teólogo guipuzcoano?
Voltaram a ser apresentadas as motivações para a proposta do nome de José Antonio Pagola: seus longos anos de professor de Cristologia na Faculdade, seus incontáveis cursos e disciplinas opcionais sobre Jesus, suas intervenções abertas a todo o público da cidade de Vitoria-Gasteiz sempre que foi chamado... Assinalou-se também sua projeção internacional por causa do seu livro Jesus: aproximação histórica, traduzido para mais de 10 idiomas (por exemplo, para o inglês, o japonês, o chinês e o russo) e recordou-se também os maus tratos sofridos em importantes setores da Igreja espanhola. Tudo indica que o debate foi muito intenso e chegou-se a falar da falta de audácia para defender a proposta do teólogo donostiarra [de San Sebastián]. Por fim, decidiu-se não conceder a ninguém o título de Doctor Honoris Causa.
Foi o que aconteceu. Estou convencido de que estes bispos, se pudessem ou se tivessem coragem, corrigiriam o próprio Papa Francisco, pois, efetivamente, escutando-o com assiduidade e atenção, dá a impressão de que se inspirou em alguma obra de José Antonio Pagola ou que, pelo menos, apresenta em suas mensagens muitas semelhanças com sua obra sobre Jesus.
Sinceramente, se reconhecer os indiscutíveis méritos de José Antonio Pagola em nossas Igrejas pode ser, segundo estes bispos, motivo de tensão, seria necessário exigir, a quem se sentir incomodado por isso, que o diga abertamente. Por outro lado, se a obra de Pagola, ainda hoje, é indigesta aos bispos de San Sebastián, Bilbao e Vitoria, isso demonstra o quanto estão distantes do Papa Francisco e o quanto estão longe do Povo de Deus a eles encomendado. E nesse afastamento do hierarca que não sintoniza com o seu povo, quanto sofrimento, abandono e perda de tempo originam em nossas igrejas. É uma pena, além de ser escandaloso. Parece-me que mais do que um problema de fé ou eclesial nos encontramos diante de uma falta de qualidade humana. Que grandeza humana demonstram ter aqueles que não são capazes de agradecer o ingente trabalho teológico e pastoral que José Antonio Pagola desenvolveu durante o seu ministério?
Certamente, todos podem “franciscanear”. Mas o dos bispos é muito mais grave. Se um bispo não sintoniza nem com seu povo nem com quem neste momento preside a Igreja Universal, o que acontece? Que credibilidade pode ter perante a sua diocese?
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Espanha. Bispo veta a indicação de Pagola para receber o Doctor Honoris Causa de Faculdade de Teologia - Instituto Humanitas Unisinos - IHU