06 Outubro 2016
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Justin Welby e Papa Francisco (Foto: Periodista Digital)
O Papa Francisco e o Arcebispo de Canterbury rezarão nesta quarta-feira à noite, 05-10-2016, em Roma, na igreja de onde Santo Agostinho foi enviado para evangelizar os ingleses. A busca anglicano-católica pela unidade está indo de um diálogo teológico para uma missão conjunta.
A reportagem é de Austen Ivereigh, publicada por Crux, 05-10-2016. A tradução é de Isaque Gomes Correa.
Na história deste pontificado, o mês de outubro de 2016 poderá vir a ser considerado como o ponto focal das iniciativas para a unidade cristã – começando com os ortodoxos e terminando com os protestantes, tendo os anglicanos (de modo apropriado) exprimidos entre os dois.
Francisco abriu o mês com uma visita histórica à Geórgia – onde está a igreja ortodoxa mais conservadora e desconfiada para com Roma – pouco tempo depois da notícia de que se havia alcançado a um acordo católico-ortodoxo em um documento sobre temas polêmicos como “sinodalidade e primazia” durante o primeiro milênio.
Visto que as diferenças em torno da estrutura sinodal da Igreja e a primazia do papa são dois dos maiores obstáculos à unidade entre católicos e ortodoxos, o documento – não publicado ainda – irá ajudar no aprofundamento dos laços que Francisco criou com o Patriarca Kirill, de Moscou, em Cuba no mês de fevereiro e com o Patriarca Ilia II, da Geórgia.
No fim do mês, entretanto, todos as atenções estarão voltadas para a visita do papa a Suécia na Comemoração Católico-Luterana em torno do aniversário de 500 anos das 95 Teses de Martinho Lutero, teses pregadas na porta da igreja em Wittenberg, na Alemanha. (Tecnicamente, o aniversário é em outubro do próximo ano, mas a comemoração, que durará um ano, se inicia este mês.)
De novo, o encontro vai adicionar um calor humano pessoal e simbólico à reaproximação teológica precedente, demostrada recentemente pela declaração luterana americana de que não existem mais “questões divisoras” com a Igreja Católica a respeito de temas como igreja, ministério e Eucaristia.
Mas este período do mês tem a ver é com os anglicanos, centenas dos quais estão se reunindo em Roma para uma série de eventos destinados a marcar os 50 anos da busca anglicano-católica por unidade.
Na noite desta quarta-feira, o Papa Francisco estará rezando com o líder da Comunhão Anglicana, Justin Welby, no 50º aniversário do primeiro encontro entre um papa e um arcebispo de Canterbury desde a Reforma.
A igreja onde vão acontecer as Vésperas (o coro da Capela Sistina estará unindo forças com o coro da Catedral de Canterbury para prover a polifonia) é significativa: em 597, o prior da igreja do mosteiro de San Gregório al Celio era ninguém menos do que Santo Agostinho de Canterbury, o qual o Papa Gregório enviou naquele ano para evangelizar a Inglaterra – “essa bárbara, feroz e incrédula nação”, conforme a descreveu.
Entre esse evento e o encontro histórico de Michael Ramsey e o Beato Paulo VI está uma longa e complexa história na qual a Reforma é somente parte da história. Enquanto uma parte da Igreja da Inglaterra é, praticamente, idêntica ao protestantismo, uma outra parte pode às vezes parecer mais católica do que os próprios católicos.
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(Foto: Periodista Digital)
Nesse espaço encontra-se o anglicano convencional, que, pelo menos na Inglaterra, se considera não exatamente um produto da Reforma, mas mais uma versão reformada do catolicismo histórico.
O encontro de 1966 levou à criação do Centro Anglicano – conhecido como a “embaixada anglicana para Roma” – e ajudou a aprofundar a compreensão entre as duas igrejas. Ele também desencadeou uma série de encontros bilaterais e documentos acordados sob os auspícios da Comissão Internacional Anglicana/Católico-Romana – ARCIC.
O arcebispo da Nova Zelândia, David Moxon, que coordena o Centro, disse que os diálogos oficiais produziram “cerca de 85% do acordo em torno da doutrina central básica”, o que inclui o batismo e a Eucaristia, missiologia e o emprego da Bíblia.
No entanto, mesmo que vá haver mais deste diálogo esta semana – incluindo um colóquio na Universidade Gregoriana –, a ênfase agora está na ação conjunta e no testemunho comum, especialmente aquilo que Moxon descreve como “uma parceria prática em missão”.
Juntando-se ao Papa Francisco e ao Arcebispo de Canterbury Justin Welby nas Vésperas conjuntas na igreja de San Gregório hoje à noite estarão 36 bispos anglicanos e católicos de 19 países unidos pelo outro organismo de diálogo, a Comissão Anglicana-Católica Romana para a Unidade e a Missão – IARCCUM. Os bispos serão simbolicamente enviados em missão juntos por Francisco e Welby.
Em artigo publicado na revista católica inglesa The Tablet, Moxon afirma que as duas igrejas “têm condições de concordar formalmente em muitas outras áreas, como a bioética, eutanásia, escravidão moderna, mudanças climáticas, e em tantas outras questões envolvendo justiça e paz”. Uma tal missão conjunta, diz ele, “testemunha a presença de Deus de um modo tão potente quanto uma grande oração ou uma liturgia edificante”.
Este vai ser um tema-chave de discussão quando, em 6 de outubro, pela parte da manhã, Welby se encontrar com Francisco na companhia de cerca de 20 anglicanos – cerca da metade dos presidentes das 38 províncias da Comunhão, cujas as mais populosas estão no sul global.
O fato de que nem todos estejam vindo é um sinal das fraturas profundas existentes na Comunhão Anglicana, uma federação flexível de igrejas nacionais em vez de um organismo unitário.
Moxon enche de elogios para falar daquilo que chama de o “ecumenismo extrovertido” do Papa Francisco, e está convencido de que a missão conjunta vai ser o principal motor para a unidade entre as igrejas. Se a missão começar a dirigir o ecumenismo, diz Moxon, ambos os lados vão “encontrar Deus reunindo-nos”.
Isso, evidentemente, está em sintonia com os repetidos chamados de Francisco para que os cristãos estejam e ajam juntos a serviço do Reino, ao invés de perder tempo em diálogos intelectuais introvertidos, que correm o risco de se fechar à ação do Espírito Santo.
No pano de fundo desta semana, portanto, encontra-se um reconhecimento de longa data segundo o qual – dadas as diferenças em torno da autoridade, da Eucaristia e do sacerdócio – a unidade institucional é um objetivo muito distante para desejar, e que é melhor focar nas ações conjuntas concretas aqui e agora.
Um efeito colateral desse “ecumenismo extrovertido” pode muito bem ser o de ajudar a resolver a crise de identidade da própria Igreja Anglicana.
No ano passado, a igreja de San Gregório enviou a sua valiosa relíquia – a extremidade curva do báculo de São Gregório Magno – para o Encontro dos Primazes anglicanos, que serviu como uma tentativa de resolver a longa disputa dentro da Comunhão sobre a homossexualidade.
Não está claro se a sua presença no encontro ajudou em algo, mas ele foi um sinal de que o Sucessor de São Pedro preocupa-se não só com a unidade da Igreja Católica, mas com a unidade de toda a cristandade.
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Quando Canterbury e Roma se reúnem em uma missão comum - Instituto Humanitas Unisinos - IHU